sexta-feira, 11 de dezembro de 2015

NO CORAÇÃO DO MAR



Imagem  fantástica do filme de Ron Howard: da pequenez da arma humana sob o olhar do monstro marinho 

“Moby Dick”, ícone da literatura de língua inglesa, foi escrito por Herman Meville (1819 1891) e publicado em 1851. O escritor, poeta e ensaísta norte-americano baseou-se no fato real que foi o naufrágio do navio baleeiro Essex atingido por uma baleia gigante. A história do livro gerou outro, escrito em 2000 por outro norte-americano Nathaniel Philbrick. E é este que inspirou o roteiro do filme “No Coração do Mar” (In the Heart of the Sea, EUA, 2015) com roteiro de Charles Leavitt e dirigido por Ron Howard.
O filme é narrado em flashback a partir do depoimento de um dos sobreviventes do Essex, Thomas Nickerson (Brendan Gleeson), um adolescente na época do naufrágio, ao escritor Melville (Bem Whishaw), entusiasta de histórias ambientadas no mar. O relato é feito depois de muita insistência, especialmente da esposa do personagem (já um idoso que passa por dificuldades financeiras). Embora se trate de um tipo que viveu os acontecimentos, a trama centraliza-se no experiente nauta Owen Chase (Chris Hemsworth), passando pela animosidade deste com o capitão do baleeiro George Pollard (Benjamin Walker) e detalhando a aparição da baleia branca gigante que desafia a todos afundando o barco que antes resistira à uma tempestade.
O livro de Melville evidencia a supremacia do animal frente a prepotência do ser humano. Não conheço o livro de Philbrick mas, no final do filme, o entrevistado do escritor confessa-se impressionado com a notícia de que na época em que eles estão já foi descoberto óleo vindo da terra, uma forma de substituir o que era extraído das baleias, usado para alimentar as lâmpadas até a segunda metade do século XIX. E em termos de cinema, “Moby Dick” gerou pelo menos 4 filmes, sendo o mais famoso o de 1956, dirigido por John Huston com atuação dos veteranos Gregory Peck (1916-2003) e Richard Basehart (1914-1984).
O trabalho de Ron Howard ressalta, primeiro, uma prodigiosa edição. Basta exemplificar as sequencias da tempestade e do ataque da grande baleia. A profusão de planos próximos com tempo curto de exposição gera o clima de terror que a trilha sonora endossa. O recurso, por sinal, ajuda muito na produção que se ampara nos efeitos especiais.
Tratado em linguagem linear o assunto não avança em detalhes densos como a construção psicológica dos tipos (especialmente dos principais, que se conhece apenas pelas situações dramáticas objetivas). Nesse ponto lembro de que o Capitão Ahab, vivido por Gegory Peck no filme de John Huston (Moby Dick) tem maior densidade. Mas é importante notar como Ron Howard manipulou a fórmula do blockbuster construindo um filme sempre interessante sem ser vulgar. Os seus enquadramentos da baleia que parece se vingar dos que mataram seus companheiros de espécie e impor sua supremacia são muito eficazes, conseguindo o que é a base da trama: o poderio de um ser pelo seu espaço físico.
O filme levanta a questão sobre a dimensão entre o homem e a natureza e a busca de submissão sobre a primeira que em dado momento se levanta furiosa. Há, também certo enfoque sobre as relações de poder da elite e pessoas do povo, no caso, o marinheiro Chase, que era visto como forasteiro, mas que já dera mostras de conhecimento no comando de um navio baleeiro e tinha a palavra de seu empregador de que seria o próximo comandante do Essex, sendo preterido no lugar por um jovem cuja família era notável pelos homens no comando desses navios. É sintomático que haja dissidências entre os dois e mais ainda pela falta de traquejo náutico do nobre.
Ron Howard recebeu o Oscar de melhor diretor em 2002, por “Uma Mente Brilhante”. Sua trajetória nesse metier tem altos e baixos, a exemplo, filmes bons como “Rush - No Limite da Emoção” (2013), “Frost/Nixon” (2008), e razoáveis como “O Dilema” (2011), “O código Da Vinci” (2006), “Anjos e Demônios” (2009) e “A Luta pela Esperança” (2005). Mas “No Coração...” pode-se incluir entre seus bons trabalhos, embora sem acrescentar nada mais ousado. Howard dirige filmes entre curta metragens e para a TV desde 1969.
“No Coração do Mar” está sendo projetado em 3D e isso me pareceu indiferente. Penso que a espetaculosidade do cenário sairá bem em tela menor num futuro próximo. O que fica é um artesanato correto. O bastante para um programa de exceção na mesmice do cardápio oferecido nos cinemas comerciais da cidade.


3 comentários:

  1. Também gostei do filme. A grandiosidade das cenas é de tirar o fôlego.

    ResponderExcluir
  2. Prezada Luzia,

    Gostei do filme, Ron Howard gosta de contar histórias interessantes e tem um bom trabalho na direção, mesmo experimentando pouco, o que torna seu trabalho pouco autoral.

    Entre os elementos que Howard desenvolve bem destaco: não vilanizar George, não tornar o primeiro imediato em herói e não sentimentalizar demasiadamente a situação dos náufragos (nem era necessário mesmo).

    Contudo, não passa despercebido alguns equívocos no roteiro (mostrar imagens o que o narrador não viu) e não definir o que deseja fazer de fato: confrontar Homem X Natureza ou relatar o sofrimento dos náufragos.

    Mesmo com estes problemas, No coração do Mar é um bom filme. Melhor do que muitos que ainda se encontram em cartaz.

    ResponderExcluir