segunda-feira, 23 de setembro de 2013

DOSE DE HUMOR



“Dose Dupla”(2 Guns, EUA, 2013)

Com roteiro de Blake Masters (de 22 episódios da serie “Law & Order”, da TV fechada) e  baseado nos quadrinhos de Steve Grant,  “Dose Dupla”(2 Guns, EUA, 2013) tem direção do islandês Baltasar Kormákur responsável por mais quatro filmes. No filme Bobby Trench (Denzel Washington) e Michael “Stig” Stigman (Mark Wahlberg) são agentes da lei sem um conhecer o grau do outro. O primeiro é empregado no Departamento de Narcóticos e o segundo nas Forças Armadas (especificamente na Marinha). Os dois assaltam um banco na fronteira mexicana onde está depositado o dinheiro dos traficantes de drogas na região. Mas depois de constatarem que os cofres possuem mais dinheiro do que o previsto, ficam sabendo que o depósito que é feito regularmente nesse banco tem interesses de outros, inclusive de membros da CIA que no fim das contas fomenta o tráfico chegando a remeter drogas para outros estados e países em helicópteros e aviões. Na trama em que se envolvem descobrem suas qualificações policiais e tentam lutar contra seus próprios “patrões” para livrar a pele dos “figurões” dos dois lados da historia (traficantes e militares, pois, até um comandante naval é simpático ao grupo de contraventores).
Desconheço se no original a crítica aos órgãos de governo existe. Mas o que está no filme é diluído em termos de comédia. O absurdo das situações é tão grande que a plateia ri. E o diretor Kormákur tem prática no gênero policial como se viu em “A Fraude” (A Little Trip to Heaen, 2005), “Tráfico de Orgãos”(Inhale, 2010) e “Contrabando”(Contraband, 2012). O ponto diferente neste novo trabalho é o aproveitamento da inverossimilhança do enredo para diluir a ação com a comicidade. Seria grotesco ver a aventura dos dois personagens (ou vilões, dependendo de como possam ser vistos) sem a amostragem de peripécias dignas de figuras dos gibis. Isto é um adendo para que seja percebido que a trama deriva dos “comics”. E a dupla de atores cumpre a sua missão. Denzel e Mark estão excelentes como os mocinhos com a vez de bandidos, numa história em que eles passam de caçadores a caças.
“Dose Dupla” caricatura os chefões da máfia das drogas a partir do veterano Edward Everett Holmes como Papi Greco. Ele parece ser não só o mandante do tráfico como o único dono do dinheiro que está depositado no banco especifico que a dupla de agentes disfarçados vai ( e consegue ) assaltar. Logo se sabe que por trás dele estão os graúdos da agência de espionagem e das forças armadas. E a posição crítica desses galardões passa bem com o apoio do original de quadrinho onde se pode brincar com o que poderia parecer ofensivo. A brincadeira lembra, no seu aspecto crítico, os filmes onde os norte-americanos parecem se penitenciar de males diversos. E não se deve ir longe: no filme “Ataque”, de Roland Emmerich, o vilão principal trabalha para a indústria de armas e não hesita em derrubar o presidente dos EUA para que surja uma nova guerra e a referida indústria saia do vermelho (ou simplesmente aumente a sua capacidade de lucro).
Os atores principais parece se divertir tanto ou mais do que a platéia que assiste ao filme. Até mesmo durante um conflito pessoal quando um atira no outro, a razão disso ganha um tom de farsa. Não há perigo de um desses protagonistas sair de cena por morte ou invalidez. Podem até ressurgir em outro filme, a julgar pela bilheteria de “2 Guns”. É a melhor das impressões de que o filme em cartaz foge da mesmice pelo caminho da comédia.


RIVAIS NAS PISTAS


Chris Hemsworth e Daniel Bruhl como Hunt e Lauda

 Não é preciso ser um aficionado em corridas para gostar de “Rush-No Limite da Emoção”(Rush, EUA,2013) ora em cartaz nos cinemas comerciais brasileiros (e, diga-se, com um péssimo lançamento em Belém, apenas uma sala menor no centro e uma na periferia e esta, assim mesmo, dublada).
O diretor Ron Howard que já foi ator (“Loucuras de Verão“, American Graffiti, 1973) reporta uma situação: especialmente a rivalidade entre o piloto austríaco Niki Lauda e o inglês James Hunt. E passa rápido pelo tempo em que eles estreiam na profissão, pilotando carros da Formula 3, para chegar ao ano de 1976, com apenas uma breve citação de como os dois rapazes subiram de posto, Lauda pagando para correr e rompendo com o pai que não queria o filho nessa profissão e, depois, ambos conseguindo financiadores para as escuderias em que passaram a atuar.
Seguindo o roteiro de Peter Morgan, o ano focalizado, 1976, é um dos mais significativos desse esporte. Na época, a corrida de carros era considerada um perigo. A morte rondava as pistas. E se o filme mostra apenas de relance alguns acidentes, ganha corpo com imagens reais das porfias, montando muito bem os planos com os atores (a técnica é usar imagens reais de fundo com a ficção entrando na cena de modo a se pensar que tudo é parte da realidade). Disse Howard: “Às vezes usamos o truque “Forest Gump”: filmamos nossos carros com a tela verde e depois aplicamos uma imagem da época”. É assim que se vê com o máximo realismo o desastre que vitimou Niki Lauda de forma cruel. O austríaco sofreu queimaduras graves e chegou a fazer uma limpeza cirúrgica nos pulmões.Além de enxerto de pele, de suas coxas no rosto perdendo parte de uma orelha.
Bem, o filme não é só corrida, embora impressione sobremodo nas sequencias do perigoso esporte. Os atores Chris Hemsworth e Daniel Bruhl, respectivamente Hunt e Lauda, são vistos desde que se encontram pela primeira vez e conseguem, em seus bons desempenhos, passar para o público o germe da rivalidade. No filme, Lauda é um homem irritado e irritável, e Hunt é um playboy, mulherengo, brincalhão e audacioso. Na história contada no estilo de Ron Howard, ou seja, de forma direta, sem arroubos formais para dimensionar com mais profundidade as personagens, Hunt casa-se, mas a esposa acaba não suportando o seu modo de vida, saindo de casa para morar em Nova York. Depois se sabe pelos jornais que ela teve um caso com o ator Richard Burton que na época era marido de Elizabeth Taylor.
A corrida de autos tem muitos exemplares na história do cinema. Os mais notáveis são “Grand Prix” (1966), de John Frankenheimmer, “500 Milhas” (Winning, 1969) de James Goldstone, com Paul Newman que de fato era corredor, “Dias de Trovão”(Days of Thunder, 1990) de Tony Scott com Tom Cruise, e “24 Horas de Le Mans”(Le Mans, 1971) de Lee H.Katzin com Steve McQueen. Não assisti a todos, mas dos que eu vi “Rush” sai na frente. Esta pole-position, do filme de Ron Howard deve-se especialmente ao cuidado que ele teve em imprimir um ritmo compatível da ação dramática com a romântica. Mesmo quem não acompanha esse tipo de esporte deve apreciar o filme. O que não dá é colocar “Carros” (Cars), a animação de John Lesseter (produtor e, na verdade, o “piloto” do filme e sua sequencia) entre os bons exemplares do gênero. Não há espaço para carros falantes nas pistas perigosas onde o som é dos motores e do atrito em asfalto ou passagem por poças d’agua.
“Rush” é um bom programa. Procurem ver.


CLÁSSICO INÉDITOS EM DVD

John Huston (1906-1987)
John Huston (1906-1987) foi lutador de boxe na juventude. Seria fatal ele criar um filme sobre este esporte. E criou, já em final de carreira, “Cidade das Ilusões”(Fat City, 1971), tratando da rivalidade de irmãos que se lançam a lutadores. O filme é considerado um clássico do gênero, figurando ao lado de outros, da mesma estirpe como “Punhos de Campeão”(1949, de Robert Wise), “O Touro Indomável”(1980, de Martin Scorcese), “O Invencivel” (1949, de Mark Robson), “Menina de Ouro”(2004, de Clint Eastwood) e “O Vencedor”(2011, de David O.Russell). É um lançamento em DVD que já estava sendo reclamado pelos cinéfilos. No elenco, Stacy Keach e Jeff Bridges contracenam com Susan Tyrell candidata ao Oscar de melhor coadjuvante.
Outro filme em DVD que está circulando é “Ferrugem e Osso”(De Rouille et D’os) de Jacques Audiard, com Marion Cotillard, Matthias Schoenaerts, e não foi exibido nos cinemas locais mesmo sendo vencedor do César (premio máximo francês) sendo candidato a vários prêmios em Cannes e no Globo de Ouro. A atriz de “PIaff”, Marion Cottilard, impressiona como a nadadora que perde as pernas quando trata de peixe carnívoro num aquário. Ela é a esposa de um lutador que acompanha a sua fatalidade. O diretor Jacques Audiard (de “O Profeta”, 2009) foi muito elogiado. Mas com todas as boas indicações, esse titulo só nos atinge em DVD. Aproveite.
O “rato” de lojas de DVD deve ter encontrado para assistir, também, “A Caça”(Jaden, Dinamarca, 2012). O filme focaliza um professor de escola infantil que é injustamente acusado de abusar de uma menina. A engenhosidade da garota para inventar histórias prejudica o mestre de temperamento tímido. Um bom filme que deu a Mads Mikkelsen a palma de melhor ator no Festival de Cannes. Analisa o bulling na escola e procura demonstrar as facetas que acompanham as formas de tratamento de um professor com sua pequena aluna e a amizade que tem com a família. E a reação da sociedade em fazer sua própria penalização mesmo sem provas.Direção de  Thomas Vinterberg. Também inédito nos nossos cinemas.
Circula nesta nova leva da semana cópia em DVD de “Recordações”(The Lost Moment, EUA,1947) que fez muito sucesso em Belém no passado já distante. O ator Robert Cummings (1910-1990) protagoniza um editor que procura uma raridade literária: as cartas que um poeta escreveu à sua amada e que ela, já centenária mas ainda viva, guarda na mansão onde procura preservar o cenário de seu romance, inclusive a mesa da festa de casamento. Susan Hayward atua como a parenta da estranha senhora e é educada por esta para ser um modelo que vinga os homens pelo que lhe aconteceu. Direção de Martin Gabel, com base num romance de Henry James (“Os Inocentes”).
“Liv & Ingmar” é um documentário do diretor indiano Dheeraj Akolkar sobre o relacionamento do maior cineasta sueco Ingmar Bergman (falecido em 2007 ) com sua atriz preferida Liv Ullman. São 42 anos que marcaram uma vida em comum em que houve casamento e persistiu amizade. O filme repassa esse tempo com depoimentos deles e cenas de seus filmes. Uma preciosidade para o cinéfilo.
“O Grande Gatsby”(Gatsby, 2012) foi um dos blockbuster da temporada que passou. O diretor Baz Luhrmann (de “Romeu e Julieta”,1996) fez a adaptação do romance de F. Scott Fitzgerald à sua maneira, ou seja, esmerando-se no visual em detrimento da potencialidade do drama. Leonard di Caprio vive a figura principal e muitos viram que não houve afinidade entre ele e a figura que se imprimiu no cinema. A historia foi adaptada e produzida em 1974, por Jack Clayton (de “Os Inocentes”) com Robert Redford, que também não esteve à altura do tipo imaginado pelo autor da obra literária. Um drama ambientado na América dos anos 20/30 com o foco no tipo milionário apaixonado que deseja reconquistar a namorada de ontem que ora está casada com outra pessoa. O filme esteve nos cinemas sem grande alarde.


PARA UMA VIDEOTECA

Yasujirô Ozu (1902-1963)

A expressão “filme de cabeceira” há algum tempo poderia representar uma licença poética de cinéfilos da chamada Sétima Arte. Hoje é uma realidade. Pode-se não só ter uma filmoteca, ou videoteca, como colocar os filmes preferidos na mesinha de cabeceira ao lado da cama (de onde vem a expressão). E os títulos que se enquadram nesse qualificativo, levando-se em conta a história da cinematografia, são cada vez mais numerosos, ou seja, alcançam cada vez mais as distribuidoras brasileiras. E estas sabem que existe um valor comercial na opção. Quem tem o seu filme predileto geralmente não se limita a alugá-lo: compra-o.
Mas não só o cinéfilo está nessa intenção. Aqueles que se interessam no estudo do cinema não podem deixar de montar sua propria coleção de cópias de filmes para analisar em melhores condições os detalhes da linguagem e/ou outro elemento importante para a complementação de conhecimentos na área visual.
Recentemente alcançaram as lojas títulos indispensáveis a uma cultura cinematográfica. E chegaram em pacotes de títulos como por exemplo, os trabalhos do japonês Yasujirô Ozu (1902-1963), os clássicos nacionais baseados em livros de Graciliano Ramos, os filmes do polaco Kieslowski (1941-1996) e os do italiano Sergio Leone (1929-1989). São obras de Ozu: “Era Uma Vez em Tóquio”(1953), “Também Fomos Felizes”(1951), “Chiri Ariki”(1942), “Tokio Noshoku”(1957), “Hitori Masuko”(1936) e o documentário “Talking With Ozu”. Os filmes apresentados em inglês não chegaram a ser exibidos nos cinemas brasileiros.
Ozu criou um tipo de filme que retratava a família e chegou a ser considerado o cronista do após-guerra, focalizando o nativo japonês simples que se dedicava a reconstrução do país. Interessante que este cineasta vivia com sua mãe, nunca se casou e morreu pouco tempo depois dela. Algumas de suas obras chegaram à Belém em sessões de cineclubes.
Irrecusável para se ter em casa e manter as duas condições que tratei acima é a trilogia com base na obra de Graciliano Ramos: “Vidas Secas” (1963), “São Bernardo” (1971) e “Memórias do Cárcere”(1984). Bem remasterizados, levam especialmente ao jovem dois títulos dirigidos por Nelson Pereira dos Santos e um por Leon Hirszman (1938-1987). Revi há pouco o filme de Leon, “S. Bernardo”, e o considero um marco do nosso cinema novo. Câmera estática e optando pelos grandes planos, usa preponderantemente a imagem para narrar o que o escritor alagoano escreveu. Obra-prima invulnerável ao tempo.
Também para uma “parada próxima” em casa é a Trilogia das Cores do polonês Krzysztof Kieslowski: “A Liberdade é Azul” (Bleu, 1993), “Igualdade é Branca”(Blanc, 1994) e “A Fraternidade é Vermelha”(Rouge, 1994). Com este trabalho, o diretor encerrou sua carreira que deixou obras de vulto em cinemas de seu país e da França. Os 3 filmes foram inspirados nas cores da bandeira francesa e, a cópia em DVD de um deles trás no bônus entrevista com o diretor que afirma não sabia falar francês usando interprete nas ordens dadas aos atores. Sendo historias independentes mesmo assim o último filme mostra as principais personagens em uma sequência. Marco histórico.
E em termos de coleções que o cinéfilo aplaude está a trilogia do diretor italiano Sergio Leone (1929-1989), criador de um tipo peculiar de western, fato que alguns críticos chamaram pejorativamente de “spaghetti”, mas hoje compreende o seu valor estético. Os filmes desse pacote também são os que promoveram o ator norte-americano, depois cineasta talentoso, Clint Eastwood. São eles: ”Por um Punhado de Dólares”(1964), “Por uns dólares a Mais”(1965) e “3 Homens em Conflito”(1966). Quem não conhece os trabalhos e está interessado em assistí-los repare nos enquadramentos, aproveitando a dimensão do quadro (scope). Cada ângulo recebe um objeto que realça no contraste com o que está atrás em profundidade de campo. Prodigio do fotografo Tonino Delli Colli (que trabalhou com Federico Fellini e Pier Paolo Pasolini), sem se esquecer de ouvir a música de Ennio Morricone.
As dicas sobre o que há de bom e novo em DVD estão ai. Quem se interessar é procurar as locadoras e/ou as lojas de venda.
 

quinta-feira, 12 de setembro de 2013

ATAQUE TRAGICÔMICO


Jamie Foxx e Channing Tatum em "O Ataque".

Roland Emmerich é um cineasta alemão radicado em Hollywood que se especializou em “disaster movie”, ou seja, filmes sobre cataclismos que impressionam pela grandiosidade aparente do processo de produção. O seu primeiro trabalho exibido em Belém, no Cine Líbero Luxardo dos primeiros anos, já se posicionava nesse gênero: “O Principio da Arca de Noé”(Das Arche Noah Pinzipe, Alemanha, 1984). Ali uma estação espacial fazia a guerra entre nações, a lembrar do que o presidente norte-americano Ronald Reagan propunha, como seja a destruição de armas inimigas através de engenhos colocados na orbita da Terra(o programa chamado na época de “guerra nas estrelas”). Logo embarcando para os EUA, Emmerich se notabilizaria por filmes como “Independence Day”(1996), “Godzilla”(1998), “O Dia Depois de Amanhã”(2004), “10.000 AC”(2008) e “2012”(2009). Só em 2011 tentaria mudar de gênero com “Anônimo”(Anonimus) a historia de um nobre da corte a rainha da Inglaterra, Elizabeth I, que teria escrito as peças assinadas por William Shakespeare. Um bom filme que por aqui só chegou em cópia DVD e nos canais de TV por assinatura.
Agora Emmerich apresenta “O Ataque” (The White House Down) onde expõe uma invasão na Casa Branca, em Washington, com o presidente dos EUA mantido refém de um de seus assessores guinado a mentor de um golpe pretensamente por vingança de ter perdido o filho em guerra no Oriente Médio. O roteiro de James Vanderbilt (o mesmo de “Zodiaco”, de David Fincher), lembra o recente “Invasão à Casa Branca”(Olympus Has Fallen, 2011) de Antoine Fuqua. A diferença, numa leitura superficial, é de que o presidente de “Ataque”, representado por Jamie Foxx, é mais valente, conseguindo derrubar alguns adversários. Mas o que ressalta o novo filme são dois fatores: primeiramente as inclusões de bom humor que não são muito comuns em histórias de catástrofes (mesmo filmadas por Emmerich). Depois, a motivação política do enredo. Não é bem o fato de o fomentador da rebelião ser um pai amargurado pela morte do filho e, além disso, ser um homem condenado por um tumor maligno no cérebro (papel ingrato para o veterano James Woods). Na verdade há uma resposta à negação de apoio à indústria bélica. É possivel pensar, então, que muitas campanhas belicosas dos EUA (e de outras nações do chamado primeiro mundo) derivam do protecionismo que o governo devota aos fabricantes de armas. Fica evidente o que alguns historiadores afirmam que um dos meios usados por Roosevelt para combater a crise econômica iniciada em 1929 foi impulsionar a indústria bélica, fato que serviria para quando os EUA resolveu entrar na 2ª Guerra Mundial.
O filme de Roland Emmerich tem essas brechas curiosas. Para o espectador é mais divertido ver as peripécias de Cale (Channing Tatum) candidato preterido a assessor do presidente, lembrando os superherois da Marvel no modo como escapa de balas e explosões, pulando de alturas enormes e ainda conseguindo subverter armadilhas inimigas para chegar perto de sua filha menor, Emily (Joey King), no fim das contas a heroína que posta no youtube cenas da invasão com as imagens dos revoltosos, como consegue evitar que aconteça uma guerra nuclear acenando uma bandeira para que os aviões, convocados por um mecanismo que só o presidente tem acesso mas, no caso, foi monitorado por outro, abortem a operação de bombardeio. Essa capa de aventura & ação pode ocultar a critica política do roteiro original, mas o contraste do que se vê no inicio como as dependências faraônicas da Casa Branca e, afinal, a vulnerabilidade que se estende ali e ao mundo resta como o tempero que torna tolerável o espetáculo.
“O Ataque” não deixa de fora a representação que se faz dos terroristas islâmicos nessa peça de aventura cinematográfica, embora o terrorismo apresentado seja dos próprios compatriotas do presidente dos EUA travestidos de seguranças particulares dele. E esse ponto no filme nem é tão evidente para o espectador que só deixa de lado as referências discriminatórias quando as imagens postadas no youtube revelam a identidade do bando. Dessa forma, o fato do ataque se tornar um evento possivel de ocorrer naquelas bandas não deixa de fora a sinalização da ku-klux-kan, seita terrorista que não vê com bons olhos a presença de um negro na cadeira política nº 1 daquele país.

Embora seja descartável, o filme de Emmerich colabora com idéias para se pensar essas situações e demonstrar a falibilidade de seguranças aos personagens da atual história política norteamericana. Informo que tive minha dose de riso desse filme. 

terça-feira, 10 de setembro de 2013

O VENTO E A AREIA

Lillian Gish em "O Vento e a Areia". Hoje, 10/09, no Olympia.
Considerado um dos últimos clássicos do cinema mudo - o outro seria “Aurora” de Murnau realizado um ano antes, 1927 – “O Vento e a Areia”(The Wind, EUA, 1928) será exibido logo mais no programa “Cinema e Música” do Cine Olympia. A produção desse filme partiu da iniciativa de Lillian Gish (a atriz preferida do pioneiro David W. Griffith), que teve a ideia de adaptar o livro de Emily Dorothy Scarborough escrito em 1925 e publicado anonimamente. A pedido da atriz veio a autorização para Irving Thalberg, um dos diretores de produção da Metro Goldwing Mayer, onde se incluía a escalação do diretor Victor Sjöstrom e do ator Lars Hanson, pois ela já havia trabalhado com ambos em “A Letra Escarlate” (The Scarlet Letter) dois anos antes (1926).
O argumento pode ser resumido pela força de vontade de Letty (a personagem de Lillian) ,que se muda do leste para o oeste norte-americano, tentando viver no interior do Texas com um primo. O problema é que a esposa deste, Cora (Dorothy Cummings) passa a ter ciúmes da recém-chegada e força não só a sua despedida como o seu casamento com o fazendeiro Lige (Lars Hanson). O lugar é permanentemente sacudido pelo vento que eleva a areia para dentro das casas. Nesse cenário nada agradável e numa relação imposta, Letty vê piorar a situação quando chega o homem que havia conhecido no trem, ao viajar para a “terra do vento”, e que intenciona forçar seu afeto. Numa luta, a jovem, que havia se separado do marido, empurra e mata o intruso. E logo percebe que o vento e a areia cobrem o corpo. A chegada de Lige leva-a a revisar seus sentimentos e aceitar viver com o marido.
O vento é uma metáfora muito clara. A mudança de cenário especifica o que acontece com a principal personagem e, pontuando melhor a influencia do vento em sua vida há a lembrança que ela tem de uma lenda regional em que o vento seria comandado por um cavalo branco, encantado, que surgia em determinados momentos marcando a natureza.
O final do filme pode parecer convencional aos olhos de hoje. Mas a narração de Victor Sjöstrom avança e sai da métrica do cinema mudo em muitos momentos, deixando apenas algumas partes em que Lillian relembra a sua postura nas antigas produções em que atuou (especalmente com seu mentor David Wark Griffith) onde a gesticulação teatral era o recurso para o entendimento do enredo com um mínimo de legendas.
Victor Sjöstrom dirigiu mais dois filmes nos EUA - “The Mask of the Devil”(1928)  e “A Lady to Love”(1930) – e depois retornou à sua terra natal, a Suécia. Foi ele quem interpretou o velho médico de “Morangos Silvestres” de Ingmar Bergman, em 1957, tendo sido essa a sua despedida do cinema (faleceu aos 80 anos, em 1960, em Estocolmo).
Interessante observar que “O Vento e a Areia” não foi sucesso nem de critica ou de publico em sua estreia. Só em 1993 ganhou um premio, mas este dedicado à restauração do original. O tempo é que promoveu o trabalho, hoje considerado um clássico da época do cinema mudo. Este exemplar teria sido o último grande filme mudo da M.G.M. Em sua fase de edição as experiências com o som já se faziam sentir e isso contribuiu, certamente, para a fuga de plateia.
Na sessão em que o filme será visto (ou revisto) hoje, no Cine Olympia, haverá o acompanhamento ao piano do virtuose paraense Paulo José Campos de Mello. Esse tipo de programa, que está sendo realizado mensalmente pela ACCPA e FUNBEL tende a recuperar a memória dos primeiros anos dessa casa centenária. Diga-se também que foi no próprio Cine Olympia o lançamento e exibição de “O Vento e a Areia”.


sexta-feira, 6 de setembro de 2013

PÉGASE




Pégase, o filme de Mahamed Mouftakir.

Em Ouagadougou, Burkina Faso, março de 2011, o filme "Pégase"(França, Marrocos, 2009), do marroquino Mohamed Mouftakir, conquistou o Garanhão de Ouro do Fespaco 2011, o Festival Pan-Africano de Cinema e Televisão, encontro importante do cinema africano realizado anualmente nesse país. O filme relata, no ritmo de thriller psicológico, a luta interior de uma jovem mulher da zona rural de Marrocos, contra a opressão da sociedade patriarcal marroquina evidenciando uma história de violência e incesto. Internada em estado traumático numa clínica, Rihana (Majdouline Idrissi), uma jovem de 20 anos, manipulada pelo pai insistindo que ela está grávida de um demônio fica a mercê da dúvida: estará ela efetivamente possuída pelo “Senhor dos Cavalos”, esse tal demônio, como afirmam os habitantes da sua aldeia natal? Quem trata de Rihana é a psiquiatra Zineb (Saadia Ladib ) que não reconhece nas palavras da jovem a certeza ou um imaginário fantástico, perdendo o controle da situação. Ela acaba descobrindo um segredo que se relaciona com a sua própria gênese.
O filme que abre hoje um programa selecionado pela Embaixada da França para exibição no Cine Olympia, não possui uma linguagem linear. Em meio às sequências em que se vê Zineb e Rihana passa-se para a infancia de Zayd e o papel de seu pai que lhe fala do Senhor dos Cavalos, uma lenda em que um animal é venerado como um deus e pode punir quem o desrespeite. Às vezes sente-se certa confusão na opção por deslocamentos no tempo, mas é a forma com que Mouftakir se expressa melhor, usando o folclore marroquino e o drama de suas principais personagens.
Com uma fotografia que valoriza a sombra, Pégase“(ou Pégaso se traduzido) tem por base uma lenda de origem grega que o cita como nascido do sangue da Medusa quando esta foi decapitada por Perseu. Medusa estava grávida de Poseidon e um coice de Pésago fez brotar a fonte Hipocrene um simbolo poético. A fonte grega não é mencionada restando a afirmação de que o cavalo, ou o Senhor do Cavalo, é um elemento do folcore do Marrocos, retransmitindo-se a lenda de pai para filho – a levar em conta os pais ligados ao campo (ou ao deserto).
“Pégase” revela um elenco muito bem regido em que Majdoline Drissi protagoniza Rihana e a figura do pai Zayd é vivida por Anas El Baz. A “cor local” enaltece o trabalho e isso deve ter sido a causa não só dos premios recebidos como da divulgação internacional através da filmoteca da embaixada francesa.
O filme estará em cartaz no Cine Olympia de hoje até o proximo dia 15, em sessão diária (exceto 2ª.Feira) de 18h30.
E a programação da ACCPA anuncia para o dia 9 “Os Anões Também Começam Pequenos” de Werner Herzog, no Cine Clube Alexandrino Moreira (IAP). No dia 10 , abre-se novamente uma exceção no Olympia para dar continuidade à sessão Cinema e Música com o clássico sueco “Vento e Areia”(The Wind, 1929) de Victor Sjöström com Lillian Gish. O filme trata do drama de Letty (Gish) que ao mudar-se para um rancho de um primo no oeste do Texas sente, na viagem, certo desconforto com o vento incessante que bate em seu rosto. É amedrontada por seu acompanhante que lhe diz ser essa situação motivo de enlouquecer as mulheres. Ao chegar ao rancho a esposa do primo sente-se enciumada pela jovem em companhia do marido. Esse incidente certamente levará a uma nova aventura na vida de Letty.
“Vento e Areia” que é parte dos clássicos do cinema mudo terá o acompanhamento ao piano do virtuose Paulo José Campos de Melo.


quarta-feira, 4 de setembro de 2013

CINE HOLLIÚDY



Em 2004 o cearense Halder Gomes realizou o curta-metragem “Cine Holiúdy – o Astista Contra o Caba do Mal”, ganhando mais de 40 prêmios em mostras especificas. Ano passado obteve recursos para avançar sua idéia num longametragem de sua história. E surgiu este “Cine Holiudy”(2013) que por um verdadeiro milagre de mercado atinge o território nacional com uma simultaneidade entre blockbuster.
O filme foi realizado numa cidade do interior do Ceará, com orçamento baixo (diga-se baixíssimo) e um artesanato amadorístico. Interessava captar o regionalismo como a fórmula de comédia. E para isso foi usada a “fala nordestina”. Tanta gíria que houve necessidade de colocar legendas nas cópias nacionais.
O enredo segue o interiorano Francisglaydisson que sonha em montar um cinema mesmo com a ressalva da esposa que lembra sempre seus deveres de família (ela e um filho menor). Seguindo o sonho, ele deixa seu vilarejo e segue para um município onde (décade 70) ainda não tinha chegado televisão. E o perigo da TV já era notado na sua terra de origem onde se vê um garoto contando as peripécias que vê de um aparelho Telefunken (marca popular na época). Ao chegar à localidade onde deve se assentar, o rapaz acha um prédio abandonado e monta o seu cinema. Há muita burocracia a enfrentar e isso é motivo de critica. Mas finalmente ocorre uma sessão de estreia com a presença do prefeito, do pároco, de funcionários públicos e o mais de um microcosmo onde pontuam tipos populares exibidos com a mais rude caricatura possível para efeito cômico. O projetor 16 mm não termina o programa (queima) e quem faz a vez dos lutadores de caratê do filme em exibição é o próprio dono da casa, contentando a plateia, sob as sombras mágicas da tela do cinema. No fim de tudo, chega à praça a primeira imagem televisiva. Mas Francisglaydisson acaba fazendo parte da nova tecnologia.
Se o espectador for levar a coisa a sério, ou pensar em comédia de estilo universal, vai achar um absurdo o “cearês” aventado por Gomes. É preciso levar em conta as peculiaridades regionais que o cineasta usa como fórmula de seu trabalho. Para isso há um padre estereotipado como palhaço de circo, como há agentes de segurança que parecem lutadores de ringue, e um político (o prefeito) usando e abusando da demagogia inserida anos a fio no anedotário popular. E entre a garotada que tenta assistir ao filme da rua, forçando uma janela, há um palhaço. O roteiro poderia caber num circo mambembe desses que percorrem cidades interioranas do Brasil como Selton Mello mostrou no seu “O Palhaço”.
Influências existem. Do “Cinema Paradiso” de Giuseppe Tornatore, do “Splendor” de Ettore Scola, do “Bye Bye Brazil” de Cacá Diegues. Mas esses filmes são apenas lembranças esparças aproveitadas certamente pelo diretor cearense. “Cine Holiúdy” é um glossário de ditos folclóricos, de comicidade popular que se expressa especialmente nas falas. Termos peculiares da região saltam como meios de articular os diversos tipos, todos mostrados de relance, sem qualquer profundidade, objetivando unicamente o riso, especialmente de quem conhece o palco das palhaçadas.
Vi o filme como um raro exemplo de cinema modesto, especificamente regional, semiamadorista, e, por causa disso, dono de uma sinceridade incomum. É um diamante bruto a ser lapidado mais pela capacidade da plateia auferir como é um pedaço do Brasil. Acima de tudo, uma maneira de extrair o nosso típico modo de viver essa arte visual como a que foi implantada pelo cinema de Hollywood criando a cultura dos filmes “capa e espada” e/ ou dos karatês. Um exemplo é o momento que a “lanterna mágica” se desloca da pelicula que havia queimado na cabine e vê a ginástica de lutador do dono do cinema. Esse é um dos bons momentos do filme, pois mostra que essa arte enquanto ilusão não está derrotada porque as sombras mágicas reconstituem o desejo de ver o que todos têm na imaginação. Senti no filme uma postura responsável de quem gosta de cinema e que um dia passou por essa situação em sua cidade. Se amadoristico, garanto que representa bem o que é ser criativo. Merece meu aplauso.


terça-feira, 3 de setembro de 2013

SENHORITA JULIA


Anita Bkörk é "Senhorita Júlia", de Alf Sjöberg.

Quando August Strindberg escreveu “Senhorita Julia”, em 1888, a sociedade ocidental obedecia a postulados datados de dois séculos anteriores onde/quando as mulheres seriam escravas de um comportamento que minimizava seus instintos. E esses instintos, antes de Freud, seguiam o que no século anterior à edição da obra de Strindberg seriam modulados por uma sociedade francamente machista. George Rousseau (históriador da cultura americana), por exemplo, propôs o que chamou de “retórica dos nervos”, alertando sobre estereótipos dos gêneros acolhidos em uma literatura que se tornou admirada especialmente pela classe social mais abastada e que via nos atores uma sujeição da mulher a caprichos que no fundo inviabilizavam a sua autonomia e davam destaque à representação masculina.
O filme homônimo de Alf Sjöberg (1903-1980) que hoje será revisto em Belém (no Cine Olympia, às 18h30) baseia-se na obra de Strindberg, especialmente na versão para o teatro, mas tem o cuidado de aplicar-se à narrativa cinematográfica. Esse cuidado leva a certo desprezo para com uma interpretação psicossocial do tema. A hístoria da jovem de classe abastada que no baile da noite do solstício, se entrega ao empregado do pai sem medo de que esse relacionamento afete sua vida social (ou mesmo de forma particular, em família) é vista em uma linguagem especialmente cinematográfica, com enquadramentos que evidenciam expressões e uma edição que dinamiza a narrativa como se o filme fosse primeiramente uma parte da dança.
Sjöberg era, em 1951, quando o filme foi realizado, um ícone do cinema de sua terra (a Suécia). O espectador de hoje deve lembrar-se dele como o personagem do velho médico de “Morangos Silvestres”(1957, de Ingmar Bergman), que no caminho da universidade onde receberá um troféu evoca a memória de quadros de sua vida quando jovem e chega a se defrontar com a morte (a instigante sequência em que se vê num funeral ou quando examina um corpo que diz estar morto e isso é contestado por um examinador). Na qualidade de diretor, quando se decidiu a filmar “Senhorita Julia” sabia da capa preconceituosa que envolvia o original literário e procurou dar ao tipo interpretado por Anita Bkörk (já falecida), uma feição, sobretudo, de jovem alegre, expandindo a euforia de viver, mas sofrida quando se deixa enredar por uma relação com outra classe. E desse processo se vê envolvida pelo desdém do próprio namorado e pela família.
O filme começa com um plano de uma gaiola com um passarinho de estimação de Julie. Depois, o rosto dela aparece no canto do quadro, próximo de uma janela. A sequência posterior de Jean, o criado, comandando a carruagem atravessa estatuas de deuses gregos. Quando chega a Julie surgem estatuas de mulheres, mas sempre em segundo plano e sem a evidência das esculturas vistas anteriormente. Nada na construção das imagens é aleatório. Poucos filmes se dão a trabalho de precisar os elementos de linguagem cinematográfica. Por exemplo: quando há uma pergunta seguida de uma resposta o interesse repassa no campo-e-contra-campo ao jogo de closes. E há delírios cênicos como a cena do incêndio na casa do conde seu pai ou de um vendaval visto de uma sala.
O filme é exemplo de cinema muito bem construído. Na ânsia de fugir do teatro Sjöberg usou de todos os recursos para mostrar que também poderia ser cinema. E acabou realizando um dos mais representativos exemplos dessa arte. Tanto que algum exemplo de criatividade, com a inclusão de cenas de um tempo em outro é aquilo que se vê em “Morangos...” quando o velho médico, deitado na relva, vê-se no passado quando jovem. Sem corte. E em "Senhorita Julia" as imagens do passado sendo parte da narrativa da jovem circulam num segundo plano marcando os tempos da vivência da personagem. Ftografia magistral. Filme imperdível. 


segunda-feira, 2 de setembro de 2013

ALMODÓVAR EM VÔO BAIXO


 Almodóvar e seus atores em "Os Amantes Passageiros"
O filme “Os Amantes Passageiros”(Los Amantes Pasajeros, Espanha 2013), de Pedro Almodóvar que chegou a ser exibido recentemente em cinemas do sudeste e nordeste, anunciado no site da Cinépolis, não foi exibido em Belém. Mas já está disponível para download na internet e quem pode acessar supre a falta. Uma falta que, diga-se de passagem, só se constrói pelo nome do cineasta. O filme decepciona. Almodóvar quis criticar os problemas atuais de seu país (o caos econômico com as consequências sociais infalíveis) e procurou a linha de comédia que fazia no inicio de sua carreira, apelando ainda mais para o chulo, perfazendo o que entre nós ficou conhecido como pornochanchada.
Toda a ação se passa dentro de um avião que percorre a linha Madrid-México. Tripulantes e passageiros (dos poucos focalizados, pois, a maioria dorme a peso de soníferos administrados para todos nas bebidas ingeridas para não sentirem o perido iminente) são extremamente caricatos. Um grupo gay atinge comandante, copiloto e comissários. Uma passageira invade a cabine de comando e diz que planeja perder a virgindade de qualquer maneira, pois pressente desastres. Outra passageira revela um passado promiscuo embora tenha ficado milionária a partir de seus relacionamentos sexuais com milionários. Outro é um matador profissional que se diz “a serviço”. Outro é um político de renome que foge da lei quando são descobertas as suas “maracutaias”. O grupo tem vez em sequencias que tentam criar hilaridade. Mas o grosseiro do tratamento esvazia tudo. E até a exposição dos homossexuais revela um tom preconceituoso.
Custa a acreditar que o diretor de “Fale com Ela”(2002) e “A Pele que eu Habito”(2011) tenha escrito roteiro e dirigido este “Amantes Passageiros” que na verdade devia passar mais depressa ou, como aconteceu aqui, longe de nossos cinemas.
Não creio que a proposta de critica ao momento em que a Espanha vive esteja no âmago dessa aventura tragicômica. Nomes famosos e amigos do diretor como Antonio Banderas e Penelope Cruz cruzam o cenário só em um momento, logo no inicio do filme, chegando os pneus do avião. Justamente é o trem de aterrissagem que dá problemas quando em voo e o suspense pretendido é de os viajantes chegarem a uma pista que possa ser usada nessa situação. Como tudo é caricato o detalhe é colocado de forma abrupta e nem chega a sacudir a plateia sonolenta por tanta mediocridade. Vale “passar ao largo”, mas o filme deve ser visto para receber as opiniões de cada um.
Tratando ainda de cinema, a boa noticia é que o novo filme de Woody Allen, “Blue Jasmine” está sendo o novo campeão de bilheteria do grupo “indie” (independente) nos EUA. Arrecadou US$ 4,3 milhões num final de semana e já está ganhando circuito maior de exibição. Até agora o filme já tem US 14,8 milhões nas bilheterias domesticas (norte-americanas). A estreia brasileira deve acontecer neste segundo semestre do ano, mas não se sabe se Belém estará no circuito. Vamos vibrar para que isso ocorra.


MOSTRA DE CINEMA SUECO


Anita Björk protagoniza "Senhorita Júlia" 

O cinema sueco foi evidenciado pelo talento de Ingmar Bergman (1918-2007) um dos meus diretores preferidos. Entretanto, não se deve pensar que só ele fez bons filmes nos estúdios de Estocolmo. Por isso, o programa iniciado  no último dia 30/08, no nosso centenário Olympia, deve mostrar o que era produzido e realizado na Suécia antes ou em paralelo ao mestre de “Gritos e Sussurros”.
Os filmes exibidos na seguinte ordem:
1.   Sexta, 30/ 08: “Carruagem Fantasma”(Körkalen, 1921) de Victor Sjöstrom
2.   Sabado/ 31, 08: “Tormento”(Hets,  1944) de Alf Sjöberg
3.   Domingo, 01/ 09: “Juventude”(Sommarlek, 1951) de Ingmar Bergman
4.   Dia 3/ 09: “Senhorita Julia”(Fröken Julie, 1959) de Alf Sjöberg
5.   Dia 4/ 09: “Sede de Paixoes” (Tõrst, 1949) de Ingmar Bergman]
6.   Dia 5/ 09: “Minha Vida de Cachorro” (Mitt Liv Som Hund, 1985) de Lasse Hallstöm.
“A Carruagem Fantasma” foi exibido em Belém, pela ultima vez, em uma sessão do Cine Clube “Os Espectadores”, em 1955. Antes esteve no mesmo cinema que está exibindo a mostra, da fase de “cena muda”, quando muitos filmes europeus ganhavam cartaz com a orquestra acompanhando as imagens debaixo da tela. O enredo trata de uma lenda em que uma pessoa dirige a carroça da morte recolhendo as almas recém-desencarnadas até que alguém falecido à meia-noite de um 31 de dezembro venha substituí-la. Na historia do filme focaliza-se um homem violento que ao ver a desgraça de sua família e saber de sua próxima morte pede para interferir nesse destino trágico mesmo que venha a ser condutor da carroça por algum tempo.
“Tormento” ganhou no Brasil o nome de “Tortura do Desejo”. Foi o primeiro roteiro que Bergman escreveu. Na época, ele era um novato integrado ao jornalismo e desejava fazer teatro e cinema. Escreveu para Sjöberg dirigir, este já considerado um ícone da indústria cinematográfica sueca. Trata de um estudante que sofre violência de um professor e se apaixona por uma jovem a quem este professor torturava. O relacionamento é interrompido quando a moça morre durante um assédio do mestre despótico. O rapaz, imputado como o assassino, perde o lugar na escola quando já estava para se formar. Com isso, ganha desprezo do pai e sai de casa. Mas o velho professor acaba por se arrepender do que fez. Um quase melodrama que atrai o espectador ainda hoje posto que a linguagem é primorosa.
“Juventude” é outro filme de Bergman em seus primeiros anos como cineasta. Enfoca o romance de verão de uma jovem, sentimento que sofre impactos de uma série de acontecimentos se extinguindo aos poucos. Anos depois ela recebe uma carta deste antigo amor. O filme ganhou elogios da critica internacional que o considerou como “o primeiro grande trabalho de Bergman”. Mesmo com 62 anos de produção esse filme emociona.
“Senhorita Julia” foi baseado em uma peça teatral de August Strindberg, tomada , na ocasião, como preconceituosa em relação a representação feminina que enfoca. A personagem-título é de família rica e numa noite em que é festejado o solstício (época do ano em que o Sol incide com grande intensidade em um dos dois hemisférios) tem romance com um plebeu em meio à dança que se efetua no campo. O filme dividiu o a Palma de Ouro do Festival de Cannes em 1951 com “Milagre em Milão”. A narrativa de Sjöberg utiliza recursos que elimina a impressão da origem teatral. Há impressionantes enquadramentos que lembram o trabalho de direção de Dreyer, em “Jeanne D’Arc”.
“Sede de Paixões” é pouco conhecido dentre os trabalhos de Bergman. Trata de uma viuva que resiste ao assédio de um psiquiatra e de uma amiga próxima. Evidencia ainada um casal em crise de matrimonio que viaja de Estocolmo para Roma. Ingmar Bergman ensina como tratar de um potencial melodramático com densidade fugindo à pieguice.
“Minha vida de Cachorro” focaliza um garoto que ao conhecer a situação de morte da cadela Laika no satélite russo, se sensibiliza com o fato. Foi o filme que revelou o diretor Lasse Hallstrom, hoje trabalhando em Hollywood.
Essa mostra evidencia um tipo de cinema de uma das escolas mais importantes da produção mundial de filmes. O cinéfilo aprenderá que não só de filmes norte-americanos vive a cinematografia. Diferentes tons da narrativa encorajam a descobertas de saberes sobre cinema. Imperdível.


SACO DE OSSOS & MY WAY : TEROR E MÚSICA


Jérémy Renier protagoniza o cantor Claude François. 
Às segundas feiras, exponho por aqui as informações sobre os vídeos que assisto em “tela pequena”. Geralmente são cópias de filmes inéditos, filmes para a televisão ou teleplays e/ou lançamentos que adqirimos em função de estudos, pois Pedro Veriano jamais deixa nas prateleiras das lojas de dvd algum filme que ainda não tenha em seu acervo e que tenha narrativa importante. Desse volume de filmes assistidos na semana extraio alguns para comentar por aqui. Alguns já se acham nas locadoras locais. Outros não, mas com possibilidade de chegarem por aqui. Vejamos os desta semana.
Uma historia de Stephen King, o conhecido autor de novelas de terror e inspirador de filmes como “O Iluminado”, ganhou uma minissérie de TV que agora chega aos consumidores de DVD no país: “Saco de Ossos”(Bag of Boones, 2011). O enredo trás o escritor Mike Noonan (Pierce Brosnan) autografando seu novo livro quando a sua esposa pede-lhe para sair do ambiente a fim de fazer um exame para ver se está gestante. No caminho ela é atropelada e morta. Desesperado, Mike viaja para a casa da família, no campo, onde ele e ela passaram bons momentos. Lá começa a ver fantasmas. E a historia chega a uma cigana que é violentada e morta por um gupo de rapazes e na ocasião lança uma maldição sobre eles e seus descendentes. A série está sendo lançada em compacto que leva mais de 3 horas em exibição. Mas o interesse pela trama não é perdido mesmo com muito “déja vu”. Direção competente de Mick Garris. No elenco, ainda, Melissa George e Annabeth Gish.
“My Way” (França, 2012) é a cinebiografia do cantor e compositor francês Claude François, tido como o Michael Jackson europeu. Dirigido por Florent-Emilio Siri com roteiro de Julien Reppeneau trata do personagem desde a infância, dos cuidados em casa com o pai imaginando a sua carreira como bancário, e da rebeldia dele que logo se tornou baterista de uma orquestra. O ápice da carreira de Claude François foi a composição “My Way” ou “Comme d’habitude”, composta em 1967 junto com Jacques Revaux e que foi gravada em francês e inglês, inclusive por Frank Sinatra e Elvis Presley. O filme vai até aos momentos finais do artista, enfatizando o seu comportamento quando ficou milionário e seu relacionamento fracassado com a jovem corista Janet (Maude Jurez ) e com outras que entraram em sua vida. Vale especialmente pelo empenho do ator Jérémy Renier, um convincente astro da música . A canção que lhe deu fama tinha o nome original até hoje é clásica e muitos desconhecem esse percurso dela.
“Uma Babá Milagrosa”(Mrs Miracle, EUA, 2009) é um teleplay (filme feito para a TV) que imita Mary Poppins e outras historias de personagens fantásticas que se tornam amas de crianças. Aqui é Mrs. Merkle (Doris Roberts) que chega à casa do viúvo Seth Webster (James Van Der Beek) depois de ele ter aceitado a dispensa de varias babás de seus dois filhos menores, extremamente traquinas. Esta senhora se diz enviada por uma agencia de empregos, mas Seth não acha o contato. Os meninos passam a gostar da ama idosa e ela os acompanha até que o pai se enamore de uma simpática funcionária de uma agencia de viagens (Erin Karpluk). Um filme modesto e repetitivo com todas as características do que o norte-americano chama de “all family show”(para toda a família), verdadeiro glossário de mesmices e melosidade.

“Resistência”(Resistance, UK 2012) trás Andrea Riseborough protagonizando Sarah, habitante da região rural da Inglaterra, em 1944, quando a operação aliada de desembarque na Normandia (o famoso Dia D) fracassa e os alemães tomam conta da Bretanha. O marido da personagem desparece e as tropas nazistas estabelecem um posto na região. O filme é baseado em um livro de Owen Shirs e tem roteiro do autor. A direção é de Amit Gupta e, afora o desempenho da atriz principal, o que se vê é o velho estereotipo do soldado alemão e de resistentes heróicos. Nada a se guardar no gênero. Filme inédito nos cinemas locais.