domingo, 31 de julho de 2011
NOTA DE REPÚDIO À CENSURA - ACCPA
A VOLTA DA (PORNO)CHANCHADA
“Chanchada” foi o adjetivo pejorativo encontrado pelos críticos de cinema nos anos 50 para denominar os musicais carnavalescos produzidos pelos estúdios nacionais da época, especialmente a Atlântida de Luis Severiano Ribeiro Jr. O nome queria dizer “ingênuo, burlesco, bobo, primário”. Soa como lixo. E com essa denominação seguia a guerra dos que se diziam entendidos em cinema e do público em geral. Os filmes “chanchadas” lotavam as salas exibidoras e ninguém se atrevia a analisar que as realizações estimavam uma postura cultural, a “cara”do Brasil de um tempo, quando a televisão engatinhava e o rádio (e disco) ainda assumiam a preferência das classes sociais com seus intérpretes saudados como deuses.
A chanchada praticamente se esgota no final dos anos 50, quando a TV entrou em cena, levando para a telinha atores e roteiros caros à tela grande. Mas não foi só isto. Mudou o país. Nova postura advinda das transformações culturais e de novos ritmos da música popular mudaram o gosto da grande platéia. Chegava o rock e seus intérpretes e os brasileiros que lotaram os cinemas para ver “O Balanço das Horas”(Rock Around the Clocl/EUA,1956) queriam cópia em português. Isto chegou a ser tentado numa das melhores comédias da Atlântida: “De Vento em Popa”(1957).
Com a censura advinda com as normas do governo militar pós-abril de 1964, o cinema nacional entrou em uma de suas mais sérias crises (a maior, mesmo, só a do governo Collor, quando a produção de filmes literalmente estagnou). Problema maior é que apesar da “rolha” nas expressões e os cortes de cenas que supostamente atentavam contra “os princípios e os bons costumes” havia a obrigatoriedade de os exibidores lançarem filmes brasileiros em uma expressiva cota durante o ano. Nesse tempo florescia o movimento “cinema novo” e os filmes “se intelectualizavam”. Começamos a ser respeitados no exterior, nos festivais, mas o artesanato e os temas distanciavam-se de uma platéia intelectualmente desafinava com isso. O cinema “udigrudi” também se faz notado como represália à censura. Metáforicos e destoando do que havia sido base de um cinema nacional, este estilo marcou esta época.
Como cumprir a obrigatoriedade? Os empresários da área de cinema, em S. Paulo especialmente, descobriram um meio: o que viria a se chamar de “pornochanchadas”. Era um drible na censura utilizando a fórmula da velha comédia ingênua com o apelo ao sexo que se permitia com alta dose de erotismo (um arranjo para que os censores deixassem passar o suposto indecoroso). Realizados em períodos curtos e com material arranjado até mesmo de cenários teatrais, os exemplares da pornochanchada, especialmente os produzidos na Rua do Triunfo, SP, chamada de “Boca do Lixo”, conseguiam não só cumprir as datas obrigatórias para filmes nacionais como dar lucro. Alguns revelaram grandes cineastas e que se incluiam num nivel de filme independente e intelectual.
Foi o desabafo do público que era modulado no que podia ver e ouvir.
Mas a redemocratização deu outro rumo ao cinema brasileiro. Sem censura, os filmes importados já traziam a “liberdade” que chocava antes uma platéia ainda ingênua. E o que se via como indústria de cinema nacional voltou-se a temas ecléticos, muitos com uma densidade que mesclava bem as conquistas do “cinema novo” com uma postura artesanal de amplo desenho.
Presentemente, tudo indica que a pornochanchada está de volta. O motivo pode ser o que chega de fora, as comédias ditas românticas de Hollywood onde já se vê o nu frontal, ouvem-se os termos chulos, abordam-se temas considerados tabus no século passado.
Sucessos comerciais como “Cilada.Com”, “De Pernas pro Ar”, “Qualquer Gato Vira Lata”, “A Casa da Mãe Joana” e outros, alcançando a casa de 1 milhão de espectadores, traduzem uma preferência estimada e aproveitada pelos realizadores. Assim o gênero chega com roupa nova, sem se preocupar com os detalhes que a censura ditatorial percebia. Vê-se e fala-se de tudo. E a represenação do ridículo de uma classe ou de uma categoria social se transforma em matéria para o riso. Não o sorriso cordato, mas a gargalhada que algus emitem diante das “anedotas de quintal”.
Toda indústria vive de modismos. Este é o nosso novo. Que ajude o cinema brasileiro como indústria tudo bem. Os norte-americanos fazem o mesmo. O mundo inteiro copia. Resta aos cinéfilos escolherem o que vão ver. E para isso não é preciso exemplificar por gênero. O bom filme pode ser de qualquer espécie, desde que se faça com sinceridade e respeito intelectual.
sexta-feira, 29 de julho de 2011
ASSALTO AO BANCO CENTRAL
Em uma história policial o/a espectador/a acompanha com interesse duas formas de narração: como se dá o crime e como ele é investigado pelos defensores da lei. Como aficionada do gênero desde adolescente, consumindo os livros de Agatha Christie, Edgard Allan Poe, Dashiel Hammett, Raymond Chandler, Rex Stout, George Simenon, além das revistas que traziam contos de Ellery Queen (nome de guerra da dupla Frederic Dannay e Manfred B. Lee), e hoje fã das séries de TV como Law & Order, CSIs e outros, gosto das duas formas de o argumento ser exposto. Por isso não questiono a opção do roteirista Renê Belmonte, auxiliado por Lucio Manfredi e Tais Moreno em “Assalto ao Banco Central”(Brasil/2011), quando resolveram explorar os fatos alternando a dinâmica preparação do assalto com a operação da Policia Federal. Isto não tira o suspense da história: ao contrário, joga-o em mão dupla. Como é um fato real você sabe que o roubo aconteceu e talvez até saiba que nem todos os criminosos foram presos. O que a ficção endossa é o caráter de alguns dos assaltantes e como eles se posicionaram depois da tarefa que consumiu mais de 3 meses, um túnel de 84 metros e muitos sacos de areia “exportados”, para perplexidade dos vizinhos da casa que alugaram para construir o túnel que os levaria para dentro da caixa forte do banco.
O filme ora em cartaz é uma tentativa do cinema brasileiro provar que está artesanalmente apto para fazer um tipo de “thriller” mais encontrado nas produções norte-americanas ou francesas (o clássico “Rififi” de Jules Dassin). O diretor Marcos Paulo, consagrado na TV por novelas e programas diversos, estréia na tela grande com o aval de um bom elenco e boa direção de arte. Em principio pouco se tem a exigir se o objetivo rende-se ao cinema comercial. Mesmo assim é forçoso ressaltar a presença dos estereótipos do gênero, as seqüências desnecessárias (como o relacionamento sexual de um assaltante), e a falta de mais detalhes em outras (o posicionamento do chefe da quadrilha após a prisão de muitos comparsas, a justificar o seu comportamento nos planos finais, ao sorrir nas vizinhanças do delegado recém-aposentado). Os personagens, divididos entre os assaltantes e no âmbito policial apenas o delegado interpretado por Lima Duarte (um dos tipos mais interessantes do elenco) e sua assistente (Giulia Gam), são moldados por características e não por qualquer densidade psicológica. Do grupo de ladrões, o mais interessante é o que mais se apóia na caricatura: Vinicius de Oliveira como o tipo que ao confessar o crime ao pastor de sua igreja(protestante) recebe deste o “conselho”para que deposite o seu quinhão, nesta igreja. Este apelo ao humor é isolado. Pinturas exageradas como a da “femme fatale”amante do chefe da gangue, tentam jogar no conjunto elementos que no entender da produção devem melhorar a venda do produto.
Mas o que se exige de um filme comercial é primeiramente uma dinâmica que prenda o espectador na poltrona do cinema. Isto a edição (montagem) não chega a conseguir de todo. Percebe-se o esforço da trilha sonora nos hiatos fragmentados de narrativa, não deixando que o filme abandone o suspense almejado pelos espectadores, especialmente aos que apreciam o gênero. Mas faltou a ironia que normalmente eleva as histórias criminais, especialmente em filme de longa metragem. O exemplo clássico é “Rififi”onde a meticulosidade do plano de roubo a uma joalheria começa a se esfacelar quando um dos participantes não resiste em dar um presente a uma mulher. No caso do banco central de Fortaleza, um fato real que figurou como o segundo maior assalto da história desse tipo de crime no Brasil, não ficou no cinema a impressão tragicômica dos parceiros do crime diluírem seu êxito em brindes ou na rebeldia ao que planejou o idealizador do golpe. Interessante a intervenção do veterano Milton Gonçalves como o pastor esperto que se aproveita da ingenuidade do fiel de sua igreja.
“Assalto ao Trem Pagador”, produzido há quase 50 anos, dá bem a idéia do que se fez melhor. Mas, de qualquer forma, o filme de Marcos Paulo deve contribuir nas bilheterias. Hoje o mercado é outro e a televisão é supremacia, fato que me leva a exemplificar “Assalto ao Banco Central” como um piloto de tele-série.
terça-feira, 26 de julho de 2011
JOGO POLITICO
Inegável a pressão que o DVD exerce sobre o/a espectador/a. A multiplicidade de cópias de filmes, alguns já exibidos outros inéditos, prendem certo público em casa, neste tempo de férias, e sem opções de programas no circuito de filmes. Vejam quantos exemplares tenho assistido para contemplar esta página e dar “dicas” aos leitores.
O filme “Jogo de Poder” (Fair Game/EUA,2010) explora o inicio da investida bélica norte-americana ao Iraque, sugerida pela “certeza” de que o ditador daquele país, Saddam Hussein, possuia armas de destruição em massa. O tema gerou o documentário “Fahrenheit 11/9”(Fahremheit 9/11, EUA, 2004) de Michael Moore (vencedor da Palma de Ouro no Festival de Cannes). Agora, baseado no livro de Valerie Perrine e Joseph Wilson - ela, uma agente da CIA (Naomi Watts), casada com ele, embaixador na Nigéria (Sean Penn), investiga a hipótese de que tubos de alumínio comprados por Hussein seriam para os reatores nucleares em construção. O trabalho diuturno leva a uma série de impactos na politica de defesa norte-americana devido aos achados da agente que identifica dados contrários aos que interessam os gestores no governo, sendo, por isso, desqualificada na função e afastada. Há, também, uma crise no casamento do par, e isto porque Wilson descobre também em seus contatos com a política externa e pesquisando por outras fontes, que tudo é engendrado pelo governo de George W. Bush.
A narrativa, a partir de um roteiro enxuto de Jez e Henri-George Buttherworth e da direção hábil de Dough Liman (do primeiro “Identidade Bourne”) dá o toque de crítica aos arranjos maquiavelianos do “senhor da guerra”, além de criar o suspense articulando a um filme de ficção política, embora se trate de fatos reais.
Um bom filme de produção recente que andou correndo pelos cinemas.
“A 25ª Hora”(Le Vingt-cinquième Heure/França,Itália, Ingl, 1967) tem base em um romance premiado do escritor romeno C. Virgil Gheorghin, com direção do francês Henri Verneiul (de “O Carneiro de Cinco Patas”, Fr., 1954). O veterano ator (já falecido) Anthony Quinn protagoniza um romeno que no inicio da 2ª Guerra Mundial é preso como judeu (ele é católico ortodoxo) e por pouco não é enviado ao campo de extermínio. Escapa da situação porque uma autoridade alemã o vê como um típico ariano, com a face dentro dos limites reconhecidos na raça. Tornando-se soldado nazista o tipo é preso pelos aliados e confinado num campo até um ano depois do armistício. Quando retorna para seus familiares, esposa e filhos, a realidade é assustadora. Com tudo isso, ele ainda é alvo de um fotografo que deseja de sua parte, a todo custo, um sorriso.
O filme é bem realizado e Anthony Quinn desempenha exemplarmente seu tipo e tem um de seus melhores momentos no cinema, lembrando a figura de Zampanô que ele viveu em “La Strada”(A Estrada da Vida, Italia, 1954) e “Zorba, o grego” ( greco-americano, 1964).
Um filme dinamarquês de Thomas Vinterberg, um dos diretores engajados no movimento “dogma “ criado por Lars Von Triers, chega em DVD no Brasil: “Quando um Homem Volta Para Casa” (En Mand Kommer Hjem/Dinamarca, 2007). Trata de um famoso cantor de opera que resolve voltar à sua terra natal e acaba tendo um breve romance com uma jovem modesta que pode ser sua nora. O filme foge ao melodrama sem deixar uma linguagem linear. Bons desempenhos.
“A Travessia de Paris”(La Travesée de Paris/França.1956) é uma comédia dramática do famoso diretor francês Claude Autant-Lara (de “Adultera”, França, 1947) sobre dois homens que percorrem, a noite, a Paris ocupada pelos alemães levando carne de porco para quem lhes pague. Jean Gabin e Bourvil (pouco conhecidos da nova geração, hoje) protagonizam a dupla com o talento que lhes deu fama. A revisão do filme mostrou que os anos pesaram e o resultado está muito abaixo do rendimento do diretor, um dos maiores nomes da “vielle vague”.
“Em Teu Nome”(Brasil, 2009) é mais uma abordagem sobre os “anos de chumbo”. Segue jovens riograndenses que viveram num “aparelho” perseguidso pela policia da ditadura militar. Realizado em Porto Alegre por Leonardo Machado não apresenta novidades no abordar o tema. E os atores não estão bem, porejando falsidade nos papéis intensamente dramáticos.
E o melhor filme que vi esta semana em DVD chama-se “O Filho” (Le Fils/França, 2002) dos irmãos Dardenne (Jean Pierre e Luc). Comento outro dia.
DVDS MAIS LOCADOS(FOXVIDEO)
- Eu Sou o Número Quatro
- Rio
- As Mães de Chico Xavier
- Invasão do Mundo: Batalha de Los Angeles
- O Besouro Verde
- Jogo de Poder
- O Concerto
- Passe Livre
- O Retrato de Dorian Gray
- Esposa de Mentirinha
OS ÚLTIMOS DIAS DE TOLSTOI
O DVD me levou a assistir a “A Última Estação”(The Last Station/UK,2009), filme que reporta os últimos dias de Leon Tolstoi, o autor de “Guerra e Paz” e “Ana Karenina”, consagrado como um dos maiores nomes da literatura russa (e mundial). O filme dirigido por Michael Hoffman de um livro de Jay Parini conta como Tolstoi (Christopher Plummer) e sua esposa, Sofia (Helen Mirren), conviveram em seus últimos meses juntos, casados há 48 anos, discordando com veemência de certas atitudes (especialmente dele), mas conservando o amor que gerou 13 filhos. Nesse período de ocaso, surge Cherkov (Paul Giamatti), que adota as idéias do mestre no que se refere à postura religiosa, sendo contra a propriedade privada e achando que o escritor deveria legar em vida os direitos de sua obra para o povo russo. O discípulo não é nada querido de Sofia que mora numa “tacha”(chácara russa) com o marido e duas filhas. Preocupado com a influência dela nas decisões do mestre, Cherkov pede que seu aluno Valentin (James McAvoy) assessore o escritor. Adepto da teoria tolstoiana que inclusive apóia a castidade, o rapaz logo se enamora de Masha (Kerry Condon) a filha do dono da casa que resolvera morar com os pais depois de se separar do parceiro, um homem casado. As constantes brigas de Leon e Sofia fazem com que ele aceite sair de casa. Mas isso só precipita acontecimentos trágicos. Ele adoece, ela tenta o suicídio, e o discípulo veda a chance dela visitá-lo quando enfermo.
O filme tem uma prodigiosa direção de arte, recriando a Rússia imperial, e uma narrativa acadêmica bem amparada nos excelentes desempenhos e no cuidado com que o diretor utiliza os elementos de linguagem, do enquadramento em tela ampla à edição que sabe sintetizar o tempo do drama.
“A Última Estação”é desses filmes que seriam vistos com agrado por todas as platéias. Mas a distribuição não vê dessa forma. Não sei se o lançamento no sudeste aconteceu normalmente. Aqui nem se anunciou em nossas salas. Ruim para o público que suspira aliviado quando se exibe um “Uma Noite em Paris”, espasmo cultural em meio aos arranhões à sensibilidade que representam coisas como “Transformers 3”.
Não assisti a quando do lançamento nos cinemas “Esposa de Mentirinha”(Just Go With It/EUA,2011) comédia de Dennis Dugan própria para o desempenho de Adam Sandler (que é o produtor). Ganhei com isso. Vendo agora, em DVD, penso no que me foi poupado (tempo, viagem, paciência). No roteiro, um cirurgião plástico usa sua assistente para passar como sua ex-esposa ao abordar outras mulheres. A teoria é de que elas gostam de quem foi amado (ou ainda é). Mas na verdade a “pegadinha” revela o obvio para quem está vendo a coisa: o médico e a assistente se amam. Para os dois se cientificarem disso perdem-se muitos metros de filme e no intuito de “puxar” o riso, o elenco ainda abriga duas crianças que passam longr do desempenho de ídolos infantis do passado, especialmente Bailee Madison que já recebeu prêmios inclusive pelo episódio que fez para a série “House” na TV. Exagerada, a comédia (?) deve ter agradado a Sandler, um ator que prima pela absoluta falta de expressão.
“Tambores Distantes”(Distant Drums/EUA, 1951) é um dos últimos westerns estrelados por Gary Cooper. Bem verdade não se pode chamar de western, visto que a ação se passa na Florida na época em que por lá existiam os índios Seminole. Cooper é um ex-soldado que vive solitário perto de uma praia com o filho menor. Viúvo, ele ajuda os militares colonizadores que desejam expulsar os índios. Na época do filme ainda era “politicamente correto” as aventuras em que índios eram vilões. Muita ação e muito absurdo no roteiro como mandava o figurino desses espetáculos de vesperais. Quem dirigiu foi o veteraníssimo Raoul Walsh, ator do cinema mudo que na qualidade de diretor abraçou diversos gêneros tendo brilhado em “filme de gangster” como “Fúria Sanguinária”(White Heat/EUA,1949) com James Cagney.
Na TV de assinatura tenho assistido a bons filmes. Recomendo especialmente “Eu e Orson n Welles”, ficção com base numa versão teatral de “Julio Cesar”realizada pelo Mercury Theatre, de Welles, em 1937, e “O Vento”, drama mexicano que recebeu vários prêmios, inclusive, no Festival de Gramado(RS).
DVDS MAIS LOCADOS (FOXVIDEO)
- Esposa de Mentirinha
- O Discurso do Rei
- Cisne Negro
- O Besouro Verde
- Bravura Indômita
- Assassino a Preço Fixo
- Desconhecido
- 127 Horas
- Justin Bieber: Never Say Never
- Bruna Surfistinha
quinta-feira, 21 de julho de 2011
VERDADE OCULTA
Em “Identidade...” Moore protagoniza uma psiquiatra que repele a idéia de múltiplas personalidades, mas tende à dúvida ao se defrontar com o caso de um jovem, recomendado pelo pai (também médico e pesquisador), capaz de mudar bruscamente de atitude, dizendo-se ora uma pessoa, ora outra. Ao assumir o caso, a psiquiatra passa a observar que o rapaz tende a adquirir mais personalidades. E como o roteiro de Michael Cooney não dá muitas explicações, pode-se pensar em possessão espiritual, com o jovem assumindo almas de mortos recentes ou não. Naturalmente o que interessa ao roteirista é o que a história possa gerar em termos de terror. O final é bem característico, até no ridículo que evoca.
“Os Esquecidos”é produção anterior, mas, desta vez, trata-se do desaparecimento de uma criança, ou do seu corpo - se é que morreu em um desastre aéreo - atormentando a mãe a quem todos censuram porque “a criança nunca existiu”. O roteiro também não é pródigo em explicações. No caso, é mais confuso do que o de “Identidade Paranormal”. Pergunta-se: por que todo mundo diz que a personagem jamais foi mãe e a mesma coisa se fala do pai de uma coleguinha do garoto que só nas lembranças dos pais se faz presente.
“Identidade Paranormal” é dirigido por Mans Marlind e Bjorn Stein (dupla sueca ligada à TV). “Os Esquecidos” por Joseph Ruben. É de supor que o agente de Julianne Moore tende ao gênero ficção-cientifica & terror, e aos filmes classe B. É possivel que a atriz se interessasse para esses tipos que em nada acrescentam à sua carreira, embora não deixem de prender o espectador no cinema ou diante da TV. Os mais exigentes não devem gostar. Mas quem está em casa e quer apenas uma hora de diversão (sem culpa) talvez ache um motivo de “relax” assistindo aos dois filmes. É o mesmo prazer que muitos sentem ao ver o “trash”, aquele subgênero elaborado/criado com parcos recursos para impressionar pela superfície.
O grande problema dos dois filmes mencionados, mesmo nas condições de “thriller” sem compromisso com a cinestetica apurada, é as reticências sem conteúdo do roteiro. Um filme pode não finalizar uma história (ou não ter nenhuma). Mas o final em aberto, deixando ao espectador que o faça, pode ser base de uma obra de vulto. Ninguém sabe, por exemplo, o que aconteceu com o repórter vivido por Jack Nicholson em “O Passageiro”, de Michelangelo Antonioni. Ele pode ter morrido quando a câmera se desloca para uma janela gradeada, passa por ela e vê a rua. Mas não se diz nem mesmo o motivo dessa fuga de imagem. Nada de explicações, como o mesmo cineasta se exime de dizer que fim levou a jovem desaparecida numa praia em “A Aventura”. E se Arthur Clarke não escrevesse um livro contando em detalhes o roteiro de “2001, Uma Odisséia no Espaço” muitas pessoas sairiam do cinema (como se deu mesmo) questionando o destino do astronauta que se vê a caminho do planeta Júpiter.
Cinema não se obriga a ser um mero contador de histórias. Ele é a janela que se abre ao espectador para que este navegue pela imaginação dos autores (roteiristas e diretor). E esta navegação muitas vezes pede para que o espectador participe/ reflita. A interatividade diante de um filme é mais difícil do que a existente na literatura, quando o leitor, sozinho, imagina o que lê. E isto porque este leitor constrói a imagem do que lê: no filme a imagem é revelada e cabe a quem está assistindo idealizar ou concluir liames do enredo, ou o âmago do conteúdo, com a missão de chegar a todos, mesmo sabendo que há reações particulares.
Os exercícios paranormais das produções modestas com Julianne Moore não conseguem se comunicar para que seja elaborado um raciocínio. É uma aposta na fantasia pela fantasia, e nos dois casos rompendo com o tempo e o espaço em favor do “happ-end”.
DVDS MAIS LOCADOS (FOXVIDEO)
- Rio
- Invasão do Mundo: Batalha de Los Angeles
- O Besouro Verde
- O Discurso do Rei
- Esposa de Mentirinha
- Passe Livre
- Como Você Sabe
- Desconhecido
- Bruna Surfistinha
- A Minha Versão do Amor
quarta-feira, 20 de julho de 2011
OS PINGUINS DE JIM CARREY
Exemplo típico de comédia “all family” bem a gosto do público norte-americano é este “Os Pingüins do Papai” (Popper’s Penguins/EUA,2011) ora em cartaz só em cópias dubladas (sem opção aos que não gostam desse tipo de gravação). O argumento trata do arquiteto Popper(Jim Carrey), executivo de uma empresa especializada em derrubar prédios antigos e construir estruturas modernas. É tipo um corretor de imóveis para as grandes firmas, no caso, a que o emprega há muitos anos. Separado da esposa (Carla Gugino) e pai de um casal de filhos, ele não tira da memória o pai aventureiro, uma espécie de Indiana Jones que vive viajando, mas sem esquecer-se de se comunicar com ele pelo rádio. Certo dia, ao chegar ao seu apartamento de luxo, Popper recebe uma encomenda, uma caixa que segundo um inventariante dos bens do pai, é uma surpresa para o filho. Ao abri-la espanta-se com um pingüim devidamente acomodado em mala especial com gelo. Logo a rotina do apartamento tem de se acomodar com a ave irrequieta. E quando Popper está propenso a solucionar o “modus-vivendi” chegam mais pingüins. Os filhos, uma adolescente (Madeline Carrol, de “O Primeiro Amor”) e um garoto (Maxwell Perry Cotton), adoram os animais, mas é o pai quem se torna alvo das trapalhadas criadas por eles. O fato, que logo recebe oposição (e uma imposição para que as aves sejam endereçadas ao zoológico), acaba renovando um sentido de família que Popper havia perdido. Há um plano sugestivo dele, esposa e crianças ao lado dos pingüins numa “pose” que faz a vez de um retrato familiar.
O roteiro de Sean Anders e John Morris vem de um livro lançado em 1938 por Florence de Richard Atwater. Não sei se nele existia um vestígio de comédia social de Frank Capra, como os sócios da empresa em que Popper trabalha e uma milionária que decide o destino de um prédio (a veteraníssima Angela Lansbury , 87 anos). Mas os elementos são dosados especialmente visando os pequenos espectadores. O sentido de família que se encontra com as peripécias do pai que acima de tudo respeita a memória de seu próprio pai é edificante. E não está à toa na trama. A acolhida da esposa ao lar, já divorciada e na iminência de um novo romance, é uma conseqüência da situação criada pelo advento dos novos “hospedes” da casa. O certo é que “a família que gosta de animais é família unida”. Brigitte Bardot, emérita protetora de toda espécie de bicho, deve gostar.
Mas a questão também se incorpora em outra evidência – a relação de fidelidade dos pinguins aos que o cercam familiarmente. E isso o pai de Popper havia colocado em uma carta ao filho, daí o presente, e que só foi encontrada e lida no final do filme.
Jim Carrey interpreta um tipo ao seu caráter de ator. Podia ser um Ace Ventura, extremamente careteiro, mas, ao que parece, ele já se vacinou de uma figura constrangedora de comédia. Depois de interpretar papéis marcantes como em “Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças” ou de expor coragem desafiando preconceitos em “O Golpista do Ano”(onde protagoniza um homossexual), o ator parece um pouco contido nas suas expressões faciais. Isto ajuda na construção do tipo que interpreta. O que deixa no espectador certas indagações é com referencia ao enredo. Sofrendo com a postura dos pingüins que além de derrubarem tudo numa sala bem arrumada, de inundarem um quarto e “sujarem” até seu dono, por que não resolver logo a situação e levá-los ao zoo? Claro que se assim fosse não haveria filme nem a recomposição familiar. Mas se o livro original dispensa esse detalhe o que se quer é justamente o reencontro, a moral de fábula que se pode ler como “a família que atura pingüins unidos permance unida”. E se a coisa fosse para exibir metáfora, podia se pensar que animais de região gelada serviam para diluir “o gelo” entre seus donos.
O diretor Mark Waters, de “Meninas Malvadas”, dá o seu recado. Controla Jim Carrey, põe a garotada para um desempenho sem arroubos de genialidade e deixa com a turma dos efeitos especiais os pingüins que dançam e recusam peixe (?).
Um filme destinado a um público específico. Mas que pode ser assistido por qualquer faixa etária.
ACOSSADO
Com Godard o que o cinema norte-americano intitula de “plot”, ou “trama”, ficou supérfluo. Para o cineasta, o cinema não é escravo de uma linha narrativa. Pode divagar, não necessariamente pedindo a quem o veja que divague com ele. Daí veio o choque dos cinemas de Godard com Truufaut. O pioneiro da “nouvelle vague” e amigo de Godard desde os primeiros tempos de jornalismo, amava o cinema do jeito que aprendeu a ver cinema. Um caso de paixão, gostando de como as imagens moldadas por diretores tradicionais chegavam à sua mente. Godard repelia, clamava pela inovação, pelo novo meio de usar a câmera e a sala de edição. Brigaram quando Truffaut explicou em detalhes como via cinema em seu antológico “A Noite Americana”(Day by Night). Os estilos conflitantes levaram os dois cieneastas a polos opostos. E seus fãs os seguiram. Há quem ame os filmes de Truffaut e toda a métrica do cinema tradicional e há quem ame os de Godard com a perene rebeldia (entre os quais me associo).
“Acossado” é, portanto, um divisor de águas. O simples enrredo sobre um ladrão que ao roubar um carro mata um policial e daí em diante foge estradas afora, chegou até a gerar um filme de Hollywood dirigido por Jim McBride, em 1983, com Richard Gere e Valerie Kaprisky (por intitulado “A Força do Amor”). Ali se dizia como a indústria se ocuparia da nova onda européia. Mas ficou nesse exemplo de adaptação. Os Godard seguintes cada vez mais distaram da cinematografia industrial e alguns enveredaram conscientemente pelo chamado manifesto político quando o cineasta adotou a simpatia pela linha chinesa de Mao Tse Tung.
Ainda hoje, aos 80 anos, Godard faz cinema. Seu “Filme Socialismo”(2010) é a prova de que não envelheceu ou se arrependeu. Sempre há um sopro inovador, uma pugna pela quebra da hegemonia artesanal.
“Acossado” está de volta a Belém fazendo sessão normal do Cine Libero Luxardo de quarta a domingo. Cortesia da Cinemateca da Embaixada da França. Programa importante para quem estuda cinema. E ama Godard.
sexta-feira, 8 de julho de 2011
TRANSFORMERS 3
DRAMA FAMILIAR
sábado, 2 de julho de 2011
EM DVD: RESCALDO DO OSCAR
OS FILMES DAS FÉRIAS I
CARRINHOS DE BRINQUEDO
Diz-se que as meninas de tenra idade gostam de brincar com bonecas. E os meninos, que nessa época ainda não descobriram o fascínio da bola de futebol, apreciam os carrinhos. Esses esreótipos são recorrentes e muito flagrantes no processo representação social de imposição de identidades de gênero. Pensando assim, o cineasta John Lasseter, atual diretor de animação dos estúdios PIXAR (que ele ajudou a criar) e Disney, faz alusão, numa entrevista, à sua própria infância concebendo este “Carros 2” (Cars 2/EUA, 2011) ora em cartaz internacional (nos EUA foi a maior bilheteria da semana passada).
Lasseter não nega que é um apaixonado por carros. O pai era funcionário da Chevrolet e ele considera os seus entes queridos como “família Chevi”. Hoje possui vários carros, evidenciando um modelo do ano em que nasceu (1957), um Corvette, e um Jaguar de 1952 que ele considera “lindo”. Este tropismo por veículos de quatro rodas levou-o a voltar ao tema do filme que produziu e-co-dirigiu em 2006. Só mesmo a paixão pelo assunto desculparia a empreitada. Isto porque o primeiro “Carros” não foi um grande sucesso da PIXAR (que hoje comemora os seus 25 anos). No currículo da firma está em sétimo lugar nas bilheterias. Mas a “voz do dono” soou mais alto. E apesar dele dizer que a continuação só foi possível com uma história nova, com nenhuma ligação com a que deu origem ao filme anterior, a verdade é que “Carros 2” é reciclagem. Lá estão os mesmos tipos, especialmente o vermelhinho Relâmpago McQueen e o companheiro “lata velha” Mate, os dois dispostos a enfrentar corridas na Itália, Inglaterra, Japão, Alemanha, França e Espanha, sem saber, de inicio, que nessas corridas estão, igualmente, carros-espiões, os supostos bandidos que fazem a vez de terroristas, clichês de filmes de ação. Na linha de humanizar os veículos, há carros com “sotaques” dos países de onde são fabricados. E cores e trejeitos que enfatizam as nacionalidades.(A filósofa Marilena Chauí já tratava da questão do fetiche e como isso se reproduz no sistema capitaista).
O filme é, obviamente, endereçado aos pequenos espectadores. O que me pareceu prejudicial para o melhor entendimento dessa turma, é o excesso de diálogos. Há muita fala, muita anedota vocal bastante adulta, e uma metragem acima da média para animação(outra vez, pois o primeiro filme levava duas horas na tela). Presenciei pequenos espectadores, acompanhados dos pais, deixando a sala de projeção muito antes do final. Me arrisco a dizer que possivelmente as meninas não devem figurar entre as fãs dos heróis motorizados. Mas não pode ser exceção. E nem adultos que não sejam “vidrados” em automóveis. Para mim, o filme de Lassiter, apesar de esmerado em técnica, foi desconfortante. E fui assisti-lo como um voto de confiança à PIXAR depois de seguidos sucessos como”Ratatouille”, “Wall E”, “UP” e “Toy Story 3”. Aqui na brincadeira com carros, não existe a poesia que pairava sobre os exemplos passados, da sapiência do ratinho cozinheiro ao robô esquecido no planeta abandonado, coroados com o simpático ancião que voava com casa e tudo para realizar o sonho de sua amada que já não estava ao seu lado e dos brinquedos que sentem a separação do dono transformado em adulto.
Mas o mês é de férias e deve-se compreender que a garotada que vive no videogame ou, mais atrás na idade correndo com o carrinho puxado por um barbante, está de férias e adora cinema na tela grande. Para ela esse cardápio que vai prosseguir esta semana com “Transformers 3” vai ser um “achado”. O critico que não conheceu Peter Pan, possivelmente, ficará assistindo aos DVDs em casa. E também prestigiando as sesões extras das salas alternativas.