sexta-feira, 8 de julho de 2011

DRAMA FAMILIAR



A peça de David Lindsay-Abaire ‘Rabbit Hole’(Toca do Coelho) foi vencedora do Pulitzer Prize e Tony Award e deu base ao filme de John Cameron Mithcell “Reencontrando a Felicidade”(The Rabitt Hole/EUA,2010, 91 min.). É possivel que seja uma referência a ‘Alice no País das Maravilhas’, de Lewis Carol, como pode ser um modo de refletir sobre a fuga da realidade através de artifícios como uma espécie de buraco negro que dê acesso a um universo paralelo onde as pessoas podem se “reencontrar” numa nova dimensão.

O roteiro do próprio autor da peça narra o drama de Becca (Nicole Kidman) e Howie Corbett (Aaron Eckhart) um casal de classe média aparentemente feliz, abalado quando o único filho, de 4 anos, Danny, é atropelado e morto por um carro em frente à casa onde moravam ao correr em busca do cão de estimação que saira porta afora, estando esta aberta. Becca, então uma funcionária graduada de uma firma conceituada, deixa o emprego e assume as funções de uma dona-de-casa, tentando escapar do sofrimento de perda e procurando não tratar sobre o trágico acontecimento, se esmerando na cozinha ou dando atenção à irmã grávida. Ambos procuram a ajuda psicológica, mas, principalmente o marido, que espera a superação de seu problema mantendo a terapia através de encontro de casais onde conhece casos semelhantes ao seu. A principio ele vai com Becca, mas logo esta passa a descrer dessa forma de estratégia de tratamento quando um pai que também sofre perda de filho afiança que Deus assim desejou pois queria um novo anjo. A que Becca responde: “Sendo um inventor, Deus poderia criar o novo anjo sem ser preciso tirar uma criança do convívio dos pais”.


O drama ganha uma nova dimensão quando entra em cena Jason (Miles Teller), o rapaz que atropelara Dany. Ele é um estudante de artes gráficas e cria história em quadrinho, sendo apaixonado por ficção-cientifica. Através da sua idéia de um escape para outra dimensão é que Becca passa a enfrentar melhor o seu drama.


O filme de John Cameron Mithcell aproveita muito bem os recursos de linguagem cinematográfica para evidenciar as emoções das personagens. Cada enquadramento revela os sintomas que produzem os problemas afetivos no casal em torno do luto que vivem e que ainda não conseguiram assimilar. Reparem numa sequência em que é captado um close de Becca desesperada quando lembra/vê o atropelamento fatal do filho. A câmera desloca-se da expressão da personagem para o lado que está escuro. Também quando ela conversa com Jason num ambiente ajardinado (e a conversa não tem grande importância na trama) há um plano conjunto com câmera fixa em que se vêem as personagens caminhando de lado a lado do quadro até sair de foco. E os atores estão impecáveis, especialmente Nicole Kidman (candidata ao Oscar) que estréia como produtora, inaugurando a sua Blossom Films.


O filme aponta muitas situações exemplares em torno da perda e do luto que contagia uma relação afetiva de um casal, sendo passivel de uma separação. No grupo de terapia há um caso desses, que se torna um insight para Howitt/Eckart definir entre a separação que pretende e o vínculo com a dor de sua esposa a qual está associado. Mas não é por isso que decide se manter ao lado dela, mas pelo sentimento de amor que confessa ter por ela a uma parceira de infortúnio que consegue transitar com outra perspectiva pela dor da perda do filho e então, do marido.


O cinéfilo certamente vai achar analogia com o que Nanni Moretti realizou em “O Quarto do Filho” (La Stanza del Figlio/Itália,2002). Ali também o primogênito de um casal morre em um acidente de barco. A diferença capital é que o casal formado pelo psiquiatra Giovanni e sua mulher Paola (Laura Moranti) não encontram uma toca que os esconda. A conformação parte de um melhor entendimento com a moça que o filho amava. Mas é por aí que os enredos se tocam: o “tratamento” é sempre com o que fez a falta: o amor. Só compreendendo-o (como Becca e Howie) é que se acha o espaço para continuar vivendo.


Temas insólitos que o cinema tratou muito bem.

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