domingo, 31 de julho de 2011

A VOLTA DA (PORNO)CHANCHADA


“Chanchada” foi o adjetivo pejorativo encontrado pelos críticos de cinema nos anos 50 para denominar os musicais carnavalescos produzidos pelos estúdios nacionais da época, especialmente a Atlântida de Luis Severiano Ribeiro Jr. O nome queria dizer “ingênuo, burlesco, bobo, primário”. Soa como lixo. E com essa denominação seguia a guerra dos que se diziam entendidos em cinema e do público em geral. Os filmes “chanchadas” lotavam as salas exibidoras e ninguém se atrevia a analisar que as realizações estimavam uma postura cultural, a “cara”do Brasil de um tempo, quando a televisão engatinhava e o rádio (e disco) ainda assumiam a preferência das classes sociais com seus intérpretes saudados como deuses.

A chanchada praticamente se esgota no final dos anos 50, quando a TV entrou em cena, levando para a telinha atores e roteiros caros à tela grande. Mas não foi só isto. Mudou o país. Nova postura advinda das transformações culturais e de novos ritmos da música popular mudaram o gosto da grande platéia. Chegava o rock e seus intérpretes e os brasileiros que lotaram os cinemas para ver “O Balanço das Horas”(Rock Around the Clocl/EUA,1956) queriam cópia em português. Isto chegou a ser tentado numa das melhores comédias da Atlântida: “De Vento em Popa”(1957).

Com a censura advinda com as normas do governo militar pós-abril de 1964, o cinema nacional entrou em uma de suas mais sérias crises (a maior, mesmo, só a do governo Collor, quando a produção de filmes literalmente estagnou). Problema maior é que apesar da “rolha” nas expressões e os cortes de cenas que supostamente atentavam contra “os princípios e os bons costumes” havia a obrigatoriedade de os exibidores lançarem filmes brasileiros em uma expressiva cota durante o ano. Nesse tempo florescia o movimento “cinema novo” e os filmes “se intelectualizavam”. Começamos a ser respeitados no exterior, nos festivais, mas o artesanato e os temas distanciavam-se de uma platéia intelectualmente desafinava com isso. O cinema “udigrudi” também se faz notado como represália à censura. Metáforicos e destoando do que havia sido base de um cinema nacional, este estilo marcou esta época.

Como cumprir a obrigatoriedade? Os empresários da área de cinema, em S. Paulo especialmente, descobriram um meio: o que viria a se chamar de “pornochanchadas”. Era um drible na censura utilizando a fórmula da velha comédia ingênua com o apelo ao sexo que se permitia com alta dose de erotismo (um arranjo para que os censores deixassem passar o suposto indecoroso). Realizados em períodos curtos e com material arranjado até mesmo de cenários teatrais, os exemplares da pornochanchada, especialmente os produzidos na Rua do Triunfo, SP, chamada de “Boca do Lixo”, conseguiam não só cumprir as datas obrigatórias para filmes nacionais como dar lucro. Alguns revelaram grandes cineastas e que se incluiam num nivel de filme independente e intelectual.

Foi o desabafo do público que era modulado no que podia ver e ouvir.

Mas a redemocratização deu outro rumo ao cinema brasileiro. Sem censura, os filmes importados já traziam a “liberdade” que chocava antes uma platéia ainda ingênua. E o que se via como indústria de cinema nacional voltou-se a temas ecléticos, muitos com uma densidade que mesclava bem as conquistas do “cinema novo” com uma postura artesanal de amplo desenho.

Presentemente, tudo indica que a pornochanchada está de volta. O motivo pode ser o que chega de fora, as comédias ditas românticas de Hollywood onde já se vê o nu frontal, ouvem-se os termos chulos, abordam-se temas considerados tabus no século passado.

Sucessos comerciais como “Cilada.Com”, “De Pernas pro Ar”, “Qualquer Gato Vira Lata”, “A Casa da Mãe Joana” e outros, alcançando a casa de 1 milhão de espectadores, traduzem uma preferência estimada e aproveitada pelos realizadores. Assim o gênero chega com roupa nova, sem se preocupar com os detalhes que a censura ditatorial percebia. Vê-se e fala-se de tudo. E a represenação do ridículo de uma classe ou de uma categoria social se transforma em matéria para o riso. Não o sorriso cordato, mas a gargalhada que algus emitem diante das “anedotas de quintal”.

Toda indústria vive de modismos. Este é o nosso novo. Que ajude o cinema brasileiro como indústria tudo bem. Os norte-americanos fazem o mesmo. O mundo inteiro copia. Resta aos cinéfilos escolherem o que vão ver. E para isso não é preciso exemplificar por gênero. O bom filme pode ser de qualquer espécie, desde que se faça com sinceridade e respeito intelectual.

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