"Minha Mãe é Uma Peça" em exibição.
Num tempo
em que o país mostra sinais convulsivos a comédia parece ser um remédio a
lembrar como fez a sedação de males no Estado Novo e nos chamados “anos de
chumbo”. Talvez não seja correto aliar o gênero ao que acontece na realidade
nacional. Há um ditado antigo que afirma o fato de, no Brasil tudo acabar em
samba. É mais simpático do que o posterior “acabar em pizza”. Mesmo porque
traduz a índole do povo, uma alegria que se inseriu na cultura nacional a
partir de sua gênese, embora não se tenha hoje essa convicção pelo rumo da
carruagem. E se a comédia foi a arma de critica e o bálsamo para problemas
graves do passado ela agora é um meio de uma ainda incipiente indústria
cinematográfica lucrar nas bilheterias dando, a quem a produz, os beneficios que
inclusive aliviam a carga dos subsídios que hoje impulsionam nossas produções
cinematográficas. O uso de estereótipos
da televisão e atores que se combinam nas telenovelas têm sido benvindos também
nesses quadros como meios de seduzir o público.
Filmes
como “E Aí, Comeu?”(2012) e “De Pernas pro Ar”(2012) ilustram a preocupação de
divertir uma plateia que paga ingresso para isso. Mas apostam numa alternativa
cômica que surgiu nos anos 70 quando a censura do governo militar amarrava as
ideias e suplantava o pudor dos norte-americanos no chamado Codigo Hays (aquele
que Woody Allen criticou muito bem em seu “A Rosa Púrpura do Cairo”, 1985). Nos
idos desse código e nos anos 70 era proibido mostrar qualquer cena que
lembrasse sexo e tendência política cerceada pelo regime em voga. Tudo ou era
“indecente” ou “subversivo”. E o recurso dos cineastas foi arranhar esse pudor.
Veio a pornochanchada, diversificação da comédia ingênua de antes onde era possivel
criticar governos, mas com a máscara de uma brincadeira (o caso de “Nem Sansão
nem Dalila”, de Carlos Manga, 1951).
Hoje é contraproducente
a utilização de tramas apoiadas em piadas chulas e a amostragem do sexo como
aventuras de atores despidos (ou quase isso). Mas o que deu renda nos últimos
anos foi esse quadro que se chamou de “neo pornochanchada”. Agora parece que
cansou. Dois filmes em cartaz na cidade seguem um desvio: “Odeio o Dia dos
Namorados”, de Roberto Santucci e “Minha Mãe é uma Peça”, de Andre Pollenz &
Paulo Gustavo. O primeiro, já comentado aqui na coluna, inspira-se no
famoso“Conto de Natal” de Charles Dickens e apresenta uma publicitária como um
novo Sr. Scrooge, trocando a usura pelo mau humor diante de romance fracassado
e de rigor excessivo no trabalho que lhe cabe. O filme não explorou de todo o
potencial da ideia, mas deu chance à atriz Heloisa Perisée exibir seu talento.
Ela é a mola-mestra dessa comédia, deixando apenas uma pequena parte para
Marcelo Sabak, protagonisando o “espírito” do colega morto que lhe servirá de
guia pelo tempo, a fim de constatar, primeiro, suas ações malsãs no passado, depois,
que está agindo mal no presente, e em seguida insistindo no fato de que ela poderá
receber o troco dessas atitudes em um futuro nada sedutor.
A outra
comédia é baseada na peça de teatro que fez sucesso e chegou também à
televisão. O ator-roteirista Paulo Gustavo interpreta travestindo-se, o tipo de
dona Herminia, mulher aposentada e sem perspectiva de vida, que se muda de casa
para a de uma tia, passando a dividir as impressões nada saudáveis desta e de
uma vizinha.
“Minha
Mãe é uma Peça” segue o texto original ampliando a projeção do que acha ser cômico.
Mas se em “...Dia dos Namorados” a comédia se nutria de uma certa substancia, o
texto & filme de “Minha Mãe...” prefere repetir o que lhe parece cômico. E
a caricatura com isso ganha evidência dissipando qualquer substancia possível.
O que se salienta é a fuga do chulo. Mas é pouco.
Se fugir
das escaramuças é penetrar na veia cômica visual, o fato de travestir este
gênero em um falso impulso para a comédia tende a subvencionar os ingressos
adquiridos para um outro modelo de “cinema é a maior diversão” de tempos atrás.