terça-feira, 30 de abril de 2013

ESTRANGEIRA EM SUA CASA?


Umay (Sibel Kelilli) em "A estrangeira". Imperdível.


Uma sociedade patriarcal e assutadoramente opressora e violenta é o que mostra e vai a fundo a exposição de comportamentos e atitudes familiares do filme “A Estrangeira”(Die Fremde/Alemanha, 2010). No caso, uma família da Turquia, que repele a filha Umay (Sibel Kelilli) por ter abandonado o marido, não suportando mais a violência de que era alvo, levando consigo o filho de 5 anos para onde pensava estar segura, ou seja, o lugar onde morava. Acontece que o pai vê o comportamento de Umay como “abandono do lar” e com isso mácula à sua honra, repelindo sistematicamente a atitude da jovem que antes teria passado um tempo na Alemanha onde perseguia um emprego. A sistemática opressão da família leva a jovem e o filho a sairem de casa, passando a morar numa instituição beneficente e de ajuda a mulheres que vivem em situação de violência doméstica. Mesmo assim, Umay tenta por varias vezes retornar à casa dos pais sem que isso represente uma mudança de atitude especialmente do lado masculino da familia, o pai e os dois irmãos, embora a mãe compactue com as decisões do marido.
O filme é o primeiro escrito e dirigido pela veterana atriz austríaca (34 títulos no currículo) Fao Aladag. Numa linguagem direta, expondo um realismo que dá ao conjunto um toque documental, ela vê na questão étnica, o processo cultural castrador, com habilidade suficiente para sensibilizar os espectadores. É difícil, mormente no meio ocidental cristão, ficar indiferente ao drama de Umay e de seu pequeno Cem (Nizam Schiller). Andando com a criança no colo por diversas moradas e ruas ela reflete um quadro de intolerância que espanta ao se colocar no mundo moderno. Para os pais e irmãos é uma “prostituta”, começando por sair de casa para o estrangeiro e culminando com o “desrespeito” ao “senhor seu marido”, que deve ser obedecido mesmo que a ameace de morte.
Grande parte do impacto que o filme gera, capaz de lhe dar 30 prêmios internacionais e 9 candidaturas, cabe ao elenco primoroso. A atriz Sybell é sempre alvo de premiações. Sua protagonização como a jovem Umay é visceralmente convincente, espelhando o horror de um meio que a oprime mesmo que viva perseguindo um perdão ou um modo qualquer de ser aceita pela familia que muito ama.
“A Estrangeira” é desses filmes homogêneos que não se pode retirar uma sequencia como exemplo de excelência. Um todo extremamente funcional reproduz um drama que circula muito bem entre o social e o introspectivo. Para uma estreia na direção e no roteiro (a jovem cineasta só havia escrito antes um título para a televisão) uma autêntica surpresa. Em alguns momentos do enfoque de prepotência lembra clássicos como “Pai Patrão”, dos irmãos Paolo e Vittorio Taviani e “A Fita Branca”, de Michael Haneke, onde se vislumbrava a gênese do nazismo. Inédito nos cinemas locais é um forte candidato à relação de melhores filmes deste ano. Ponto para o Instituto Geoethe que está veiculando cópias no Brasil e deu-nos a chance de assitir a uma delas agora, no Cine Olympia.
Creio que os associados da ACCPA devem assistir a este filme, pois se trata de um exemplar que sem dúvida estará entre os melhores do ano. Às colegas que tratam da questão da violência doméstica contra a mulher também é um excelente meio comparativo com a situação ocorrente no Brasil.
REGISTRO
Na semana última faleceu em Recife o Sr. Antonio Silva, gerente da Columbia Pictures no nordeste brasileiro, um amigo que muito ajudou o cinema de arte em Belém, estando presente nas atividades do Cine Clube APCC e no I Festival do Cinema Brasileiro de Belém em 1974. Deixou grande marca na exibição local de tempos heroicos, divulgando até mesmo os seriados e os filmes B do estúdio que sempre o prestigiou.
Silva, como era conhecido, foi recrutado pelo exercito brasileiro participando da 2ª.Guerra Mundial e desde 1945 manteve-se agente da Columbia numa área do Brasil. O primeiro filme que distribuiu foi “Gilda”, clássico com Rita Hayworth. A ACCPA faré uma homenagem a ele e ao seu trabalho exibido esse filme na Sessão Cinemateca do dia 12/05, do Olympia.
Aliás, o amigo crítico Celso Marconi Lins (PE) num post no facebook confirmou a ajuda que ele e o seu colega Fernando Spencer sempre receberam de Antonio Silva para as sessões de arte que promoviam e achou justissima a nossa homenagem em Belém.

DVDs DO OSCAR & INÉDITOS


“Bem vindo à Vida” : novidade em DVD

Neste espaço já tratei dos filmes que concorreram ao OSCAR deste ano e estavam chegando às locadoras. O informe agora é que outros mais dessa lavra, já circulam e outros estão “quase na porta” em cópias DVD & Bluray. Este mês chegaram: “As Aventuras de Pi” e “A Hora Mais Escura”, juntando-se a “Lincoln”, ao “O Lado Bom da Vida” e “Amor”. Ressalto o Bluray 3D de “As Aventuras de Pi”. É uma forma de assistir ao filme do diretor tailandês Ang Lee, vencedor de 4 prêmios da Academia de Hollywood, e tomar conhecimento de como ele foi produzido. É um trabalho dinâmico de efeitos digitais e o “making of” que acompanha o disco ressalta isso. Não foi só um tigre moldado em computador, mas um oceano vindo de um tanque instalado no estúdio. Algo surpreendente.
Novidade, ou melhor, inédito nos cinemas, é “Bem vindo à Vida” (People Like Us, EUA, 2012) de Alex Kurtman. O teor melodramático é bem digerido graças a uma edição que restringe o enredo ao necessário. O texto trata de Sam, um jovem empresário de Nova York, que assiste seu trabalho ser minorizado pelo superior imediato e voa para Los Angeles ao saber da morte do pai. Na visita ao advogado da família, por ocasião da abertura do testamento desse ente querido, ele vem a saber que tem uma irmã adulta, filha de uma aventura paterna, e esta um filho de doze anos. O pai destinara uma soma expressiva em dinheiro, colocada dentro de uma maleta, para ser entregue à essa filha. O problema é que Sam precisava de ajuda para saldar suas dividas e procurar outro emprego. Mas o contato com a irmã até então desconhecida leva-o a seguir um preceito ético e também a ajudar a jovem que vive só com o garoto fruto de um relacionamento fracassado, e se sustenta trabalhando como garçonete num bar.
Chris Pine e Elizabeth Banks protagonizam os irmãos. A veterana Michelle Pfeiffer interpreta a mãe (que não quer saber da outra família do marido). E Olivia Wilde, a “13” da série “House”, investe no tipo da esposa de Sam. Cópias em DVD e Bluray. É assistir com os olhos na trama.
Os cinéfilos mais antigos e com acesso aos cinemas da capital assistiram, na mocidade, as comédias de Mickey Rooney contracenando com Judy Garland. O ator tinha pouco mais de 20 anos na época (hoje soma 92). Agora estão em cópias DVD no mercado brasileiro os seguintes títulos: “Louco por Saias”(Girl Crazy, 1942), “Sangue de Artista”(Babes in Arms, 1939), ”Calouros na Broadway”(Babes on Boradway, 1941) e “O Rei da Alegria”(Strike up the Band, 1940). Todos dirigidos pelo coreógrafo Busby Berkeley, um dos mais capazes da fase áurea dos filmes musicais da Metro e produzidos por Arthur Freed, que também era compositor e produziu clássicos como “Sinfonia de Paris”(Na Americanin Paris, 1951) e “Cantando na Chuva”(Singin’Rain, 1952). Rooney é sempre espalhafatoso, brigão, e Judy canta. Os filmes envelheceram muito, mas estão inscritos na historia de um gênero. Mais ainda por conterem músicas de nomes famosos como George Gershwin. Outra curiosidade é ver na ficha técnica nomes que mais tarde seriam famosos como Vicente Minnelli (o diretor de “Sinfonia deParis”) e George Pal como desenhista(o produtor de clássicos da ficçãocientifica como “A Guerra dos Mundos” e “ A Maquina do Tempo”). Na época de circulação desses filmes muitos da minha geração não tiveram acesso a eles. Hoje, ao assistí-los, sinto que são extremamente pobres, feitos para lançar no mercado um tipo de cinema tão vazio .
Outro lançamento atual é “Hitler, Os Últimos 10 Dias” (Hitler, The Last Tem Days, UK, Itália, 1973), filme baseado no depoimento de um dos oficiais sobreviventes da última fase do nazismo. O ator Alec Guiness protagoniza o ditador alemão e nomes veteranos como Simon Ward, Adolfo Celi, Diane Cilento, Eric Portman e Gabrielle Ferzetti comparecem. O diretor é Ennio de Concini (1923-2008) e o filme tem certo didatismo que o torna interessante, mas só para quem não assistiu “A Queda: As últimas Horas de Hitler (2004) ” e “O Ultimo Ato”(1955)  filmes alemães que trataram o assunto, o último dirigido pelo famoso G.W.Pabst e ainda inédito em DVD no Brasil.
E no dia 30/04, às 19h, o Cine Clube Alexandrino Moreira (IAP) exibiu o filme “Sua Única Saída” (Porsued, 1947), dirigido por Raoul Walsh, evento que homenageia Alexandrino Gonçalves Moreira, associado da ACCPA que aniversariava e tinha o filme entre os seus preferidos.

sábado, 27 de abril de 2013

O DEMÔNIO E SUA CRUZ




Cena do novo "Evil Dead", agora dirigido por Fede Alvarez

Em 1981, o diretor Sam Raimi realizou “Evil Dead”(A Morte do Demônio) que encabeçou uma trilogia continuada em 1987 com ”Uma Noite Alucinante”(Evil Dead 2) e, enfim, “Uma Noite Alucinante 3” (Evil Dead 3) em 1991. Do grupo, o melhor foi “Uma Noite Alucinante” onde era privilegiada a comédia e foram usados recursos originais como “travellings” que atravessavam a mata como se fosse filmagem aérea. Depois de ter se tornado um diretor comercial bem sucedido com os três filmes do “Homem Aranha” Raimi se interessou em patrocinar um novo “Evil Dead”, convocando o uruguaio Fede Alvarez para dirigir. Entre os aspectos de simpatia ao trabalho desse diretor, certamente Raimi se impressionou com o curta-metragem que Alvarez postou no Youtube: “Ataque de Pânico”(2009) onde as imagens traziam a figura de um robô destruindo a cidade de Montevidéu. O problema é que o roteiro do próprio diretor e de Rodo Sayagues alterou todo o humor dos filmes de Raimi pelo “gore”, ou seja, pelo horror explicito, gastando litros de tinta vermelha (ou catchup) para criar a festa de sangue que é explorada nesse filme até a consumação de todas as personagens em cena.
“A Morte do Demônio”(Evil Dead/EUA, 2013) é um exemplar de terror corriqueiro, de sustos e violência que só não chega às raias de um “Mamma”(em cartaz) por certos requintes formais como por exemplo, o enquadramento e a iluminação. No primeiro caso, há planos de um rosto no canto da tela e, com profundidade de campo, outra imagem ao longe de importância na trama. No segundo, o vermelho sai do sangue e ganha o quadro inteiro em certas ocasiões. Um tipo chega a dizer que “está chovendo sangue”. Mas nem aí é observado o senso de humor. Gritos, caras feias e ferimentos diversos fazem a festa. A “mocinha” da historia chega a deixar um exemplo: ela é viciada em drogas e por isso vai com os amigos para uma cabana no meio do nada tentar a desintoxicação. Só que ela vai ser a única a sobreviver da fúria de um demônio liberado quando um dos amigos acha um livro correspondente às magias diabólicas. Seria uma forma de dizer que as drogas “curam” os possuídos pelos espíritos demoniacos. Há momentos em que Mia (Jane Levy) essa figura central, aparece deformada de tantos acidentes e vestígios da possessão. E há uma cena em que a jovem sofre a queda de um automóvel sobre o seu braço, corta-o com uma serra elétrica como única forma de se libertar, e sai da sequencia vendo a amplitude dos estragos (a metáfora ganha figurino de explicitude). Isso tudo sem que faça a plateia ao menos sorrir. Qualquer riso é de ira pela perda de tempo em ir assistir ao filme.
Não tenho clareza (nem informação) se Sam Raimi aprovou o trabalho do colega sul-americano. Mas, a julgar que o filme figurou em primeiro lugar nas bilheterias norte-americanas em sua semana de estréia, deve representar um aval ao jovem cineasta do país nosso vizinho. O problema é se agora ele vai se voltar ao gênero sem um sentido critico. “A Morte do Demônio”(2013) não leva a nada, é apenas um replay em termos de enredo do primeiro trabalho de Raimi sem qualquer inovação que privilegie o que de melhor apresentava aquele trabalho: a expressão que recebeu da critica o nome de um subgênero: terrir. Sem isso, a esperança é que o jovem Alvarez ao menos coloque os robôs gigantes de seu curta desfilando na telona. Possivelmente no computador eles são mais simpáticos, deixando a expectativa de que há um imaginoso diretor em potencial.


sexta-feira, 26 de abril de 2013

GRANDES ESTRÉIAS ESPECIAIS



"A Estrangeira", em exibição no Cine Olympia. 

Esta semana há uma única estréia nos cinemas comerciais: “O Homem de Ferro 3”(Iron Man 3, EUA, 2013) de Shane Black com Robert Downey Jr. Cópias em 3D, 2D, dubladas e legendadas tomando várias salas dos dois circuitos que operam emBelém.
Na área extra há o melhor programa da temporada: “E Se Vivêssemos Todos Juntos”(Et Si On Vivent Tous Ensemble, França, 2012) e “No”(Chile, 2012), ambos em exibição no Cine Libero Luxardo, em horários específicos .
No Cine Olympia aporta um filme alemão muito elogiado, premiado e inédito: “A Estrangeira”(Die Fremde/Alemanha, 2010), de Feo Aladag. Na Sessão Cinemateca de domingo, 28, será exibido “Os Melhores Anos de Nossas Vidas”(The Best Year of Our Lives, EUA, 1946) de William Wyler, vencedor do Oscar do período.
No Cine Clube Alexandrino Moreira(IAP) será exibido nesta 2ª feira “Sua Única Saída”(Pursued, EUA, 1947), de Raoul Walsh com Robert Mithum. Esta exibição é toda especial, pois nesse dia (29/4) o patrono do cineclube estaria aniversariando. Seu filho Marco Antonio é hoje quem programa o horário. Alexandrino, que assinava neste jornal uma coluna de cinema aos domingos como AGM (GM vem de Gonçalves Moreira), era um grande cinéfilo. Amava o cinema a ponto de ter criado 3 salas exibidoras numa época em que não existia Shopping Center e a concorrência na exibição era esmagadora. Ele era um ardoroso apaixonado pelo trabalho do cineasta Raoul Walsh, e o western escolhido para marcar a data é um dos mais elogiados desse cineasta. Há, nessa exibição, uma dupla homenagem à memória do amigo AGM.
“O Homem de Ferro 2” (Iron Man 3) mostra o personagem Tony Stark, o engenheiro criador do Homem de Ferro, atormentado por pesadelos vendo-se incapaz de defender a namorada Pepper Pots (Gwynett Paltrow). O maior inimigo, no caso, era o Mandarim (Bem Kingsley) que na verdade armava um plano de conquista em que o herói teria que ser eliminado para este plano dar certo.
A franquia deste filme explorou um primeiro exemplar de bom nível, mas no segundo deu uma queda. O ator Robert Downey Jr. que protagoniza o tipo confessou em entrevista ter gostado de seu desempenho. E o lançamento internacional é prestigiado por gigantesca propaganda. Vamos ver.


“...E Se Vivêssemos Todos Juntos” (foto) evidencia a situação do idoso. Trata de um grupo de amigos que resolve morar juntos. Seria a alternativa de dividir a solidão de um  deles que está na iminência de ser colocado, pelo filho, em um asilo. Cada um dos personagens é mostrado em suas idiossincrasias com as especificidades própria da idade. Quando já estão juntos um segredo vem à tona, embora cause impacto, sem ferir a amizade. Roteiro e direção exploram muito bem as circunstâncias do dia-a-dia contando com o desempenho de grandes interpretes do passado: Claude Rich, Geraldine Chaplin, Pierre Richard, Guy Bedos, Daniel Brüho e Jane Fonda. Direção segura de Stephane Robelin. Filme importivel.
 “No”, baseado do trabalho não publicado “El Plebiscito” escrito por Antonio Skármeta,  mostrando a preparação desse processo no Chile diante de tantativa de mais um período de governo do ditador chileno Augusto Pinochet. Seria também um ardil para mostrar ao povo, em seus últimos anos de governo que ele ainda tinha representatividade para a continuidade no posto. Um publicitário (Gael Garcia Bernal) assume a campanha do “não”. Um estilo documental enaltece o filme como um documento histórico. Foi candidato ao Oscar de melhor filme estrangeiro neste ano de 2013.
“A Estrangeira”(Die Fremde) trata de Umay (Sibel Kekilli), uma alemã de origem turca que após casar-se, vive em Instambul com o marido e o filho. Infeliz no casamento, ela decide partir com a criança para a casa dos pais e irmãos, imigrantes que moram em Berlim. Desde o momento em que fere a tradição de deixar o marido e não querer mais a relação, até a busca de trabalho e de estudos para levar uma vida independente sofre as intransigências  familiares, não sendo aceita pela rigidez nos princípios muçulmanos. Umay terá então de sair de casa para viver sozinha. O filme recebeu cerca de 30 prêmios internacionais. A direção é da austríaca Feo Aladag, atriz de 34 filmes, com 18 premios no currículo. Exibição no Cine Olympia a partir desta sexta feira, 26/04. Belissimo filme.

quarta-feira, 24 de abril de 2013

OLYMPIA E A AURORA


George O'brien e Janet Gaynor em "Aurora". Exibição no Olympia , hoje, 24.

O cinema Olympia completa hoje 101 anos. A data é muito gratificante para os paraenses que possuem a casa de exibições cinematográfica mais antiga do país (considere-se que jamais mudou o nome e deixou o lugar onde foi construída, assim como o espaço edificado). Ano passado Pedro Veriano e eu organizamos o livro “Cinema Olympia: Cem Anos da História Social de Belém – 1912-2012” compondo-se de textos escritos por intelectuais e pesquisadores e pesquisadoras paraenses, sendo lançado naquela ocasião.
Hoje, esse livro estará à disposição dos que forem assistir ao programa especial dedicado ao aniversário, programa que vai evocar uma fase importante do cinema, a fase da chamada “scena muda” onde os filmes, antes do advento da pista sonora (movietone), eram acompanhados com música ao vivo. Para esta noite, a FUMBEL, instituição que dirige o espaço, junto com a ACCPA e a Fundação Carlos Gomes organizaram o seguinte programa: às 19,00 h: Temas de filmes - “Em Algum Lugar do Passado” e “Tempos Modernos”- executados por Robenare Marques. Às 19,15 h, Salomão Habbib escutará a suíte “Olympia”, de sua autoria. E às 19,30h a exibição do clássico “Aurora”(Sunrise, EUA, 1927) de F. W. Murnau acompanhado ao piano por Paulo José Campos de Melo.
“Aurora” está citado entre os melhores filmes de todos os tempos por diversas entidades ligadas ao estudo da história do cinema, além dos livros. O diretor F. W. Murnau foi um dos pioneiros do movimento expressionista na Alemanha - realizou “Nosferatu”(1922), “A Ultima Gargalhada”(1924)  e “Fausto”(1926) - e foi contratado pelo estúdio norte-americano Fox para fazer o filme com roteiro de seu colaborador Carl Mayer, autor do texto de “O Gabinete do Dr.Caligari” (Alemanha, 1919) . Basicamente seria uma historia de amor. Um pescador (George O’Brien) é seduzido por uma mulher da cidade(Margaret Livingstone) tenta matar afogada a sua esposa (Janet Gaynor), quando viaja de barco para a cidade próxima. Mas no meio do caminho se arrepende. E a estada do casal na metrópole é como uma nova lua de mel. Melhor dizendo: um recasamento, pois, entram numa igreja onde está acontecendo uma cerimônia de enlace matrimonial e repetem o que o par diz no altar. No retorno há uma tempestade e o barco vira. A mulher é dada como desaparecida. E ele, marido, desesperado procura por ela.
         O filme teve um custo alto, muito mais do que a empresa norte-americana previa. Um cenário gigantesco foi construído no estúdio e, com o cinema sonoro já começando a surgir, a empresa chegou a providenciar o enxerto de som (ruídos). O problema é que o lançamento se deu quando o publico procurava a novidade do som. Apesar de Janet Gaynor ter ganhado o primeiro Oscar, sua candidatura se prendeu não só a “Aurora”, mas também a “O Sétimo Céu” (1927) e “Anjo da Rua”(1928).
A linguagem expressionista está presente. E até nos intertítulos. Quando a jovem da cidade pede ao pescador que mate sua esposa as letras de “afogar” surgem e se diluem como se estivessem molhadas. Nas primeiras sequencias, especialmente, o claro e o escuro são primordiais na criação do clima. É a rara exibição de expressionismo num romance.
“Aurora” ficou famoso com o passar dos anos. No Pará, o filme tinha cinéfilos ardorosos como o maestro Izoca (Wilson) da Fonseca (Santarém) e o prof. Francisco Paulo Mendes. E foi um dos “dez mais” do século XX de nossos críticos. Delicado, dono de uma beleza plástica incomum e interpretações marcantes integrou o humor e o drama em momentos certos cativando espectadores de varias gerações. E a sua estreia local foi no próprio Olympia, no final da década de 1920.

terça-feira, 23 de abril de 2013

PROGRAMAÇÃO CINE OLYMPIA - DE 26/04 À 02/05/13



Sibel Kekilli em "A Estrangeira".
“A Estrangeira” (Die Fremde)
Direção: Feo Aladag

 Sinopse : O filme "A Estrangeira" foi indicado pelo cinema alemão como candidato ao "Oscar" 2011 e ganhou dois prêmios no Festival de Cinema de Tribeca: de melhor longa-metragem narrativo e o de melhor atriz (a alemã Sibel Kekilli). O filme conta a história de Umay, uma jovem mulher de descendência turca que luta por uma vida independente na Alemanha contra a resistência de sua família. A película aborda ligações familiares, amores profundos e duradouros, mas sobretudo, direitos humanos. A narrativa coloca frente a frente os dogmas e costumes de uma cultura tradicional, com seu inerente foco na família como meio de sobrevivência, e a cultura pós-industrial na qual os direitos humanos e a dignidade são de fundamental importância. Destaca-se um conjunto de bons atores, com atuações notáveis, ótima trilha sonora e um final que emociona e certamente leva os espectadores mais sensíveis às lágrimas.

CINE OLYMPIA
“A ESTRANGEIRA”
DE 26/04 À 02/05/13
HORÁRIO : 18:30 H
ENTRADA FRANCA
INADEQUADO PARA MENORES DE 12 ANOS
APOIO : INSTITUTO GOETHE

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Frederich March, Mirna Loy  em "Os Melhores Anos do resto de Nossas Vidas".


“OS MELHORES ANOS DO RESTO DE NOSSAS VIDAS”
Direção: William Wyler
Ano de produção : 1948
Com Frederich March, Myrna Loy

Sinopse: Ao retornar da Segunda Guerra Mundial, três militares têm a dura missão de voltar às suas vidas normais e tentar se readaptar a sociedade. Vencedor de 7 Oscar: Melhor Filme, Diretor, Ator (Fredric March), Ator Coadjuvante (Harold Russell), Edição, Música e Roteiro Original.

SESSÃO CINEMATECA – DOMINGO DIA 28/04/13
HORÁRIO : 15:30 H (horário especial devido a duração do filme)
ENTRADA FRANCA
INADEQUADO PARA MENORES DE 10 ANOS
APOIO: ACCPA

segunda-feira, 22 de abril de 2013

TUDO O QUE DESEJAMOS


"Tudo o que Desejamos", belissimo filme francês.

Penso que os cinéfilos desejam bons filmes para assistir nos cinemas e/ou em casa. Mas há um filme inédito na tela grande, em DVD: “Tudo o que Desejamos”(Toutes nos Envies, França, 2011), que assume no titulo esta expectativa. Trata-se de drama sobre uma situação vivida por uma juíza da Vara de Pequenas Causas, de Lyon (França), que se defronta com um caso sensibilizante: uma mulher tem dívidas a pagar a muitos devedores e não tem meios para isso, daí estar candidata a morar na rua. A juiza é penalizada pelo superior por considerá-la comprometida na ocorrência, haja vista que a mulher é mãe de uma colega de sua filha. Ao mesmo tempo em que julga essa causa considerando alguns pontos legais que analisa no contrato dela, a juíza descobre, por exames clínicos, um tumor maligno no cérebro. Outro juiz recebe o caso e ela acompanha com ele os pontos que foram deixados de lado pelo Tribunal e que valorizam mais o contratante. Recorrem da sentença no juizado europeu e vão somando os ganhos da causa. Paralelo, abriga a mulher em sua própria casa, moldando uma situação para quando morrer. Uma lenta análise de missão de vida, de coragem e de caridade, sem fugir às regras legais de seu cargo. O filme é dirigido por Philippe Lioret e inspirado livremente no romance de Emmanuel Carrère,“D’autres vies que le mienne”, e deu à Marie Gillain o Cesar de melhor atriz, grande premio do cinema francês, em 2012. Exemplo de um melodrama em potencial que foge das amarras do gênero para ganhar corpo numa exposição realista e terna, ao mesmo tempo. Assistam o DVD.

“À Beira do Caminho”(Brasil, 2012) foi exibido nos cinemas comerciais sem muito alarde. Dirigido pelo mesmo cineasta de “Gonzaga, de pai para filho”, Bruno Silveira, focaliza um caminhoneiro que em uma viagem pelo nordeste é abordado por um menino que se diz órfão de mãe e procura o pai de quem tem um retrato e jamais viu, pois abandonou a mulher/mãe quando grávida, vivendo então em São Paulo. Uma primeira repulsa é suplantada pela simpatia ao garoto e o fato de o caminhoneiro perceber que se abandoná-lo no caminho é entregá-lo à marginalidade. Quatro canções de Roberto Carlos pontuam a história. E saltam os desempenhos excelentes de João Miguel (o caminhoneiro João) e Duda (o estreante Vinicius Nascimento).
Um antigo sucesso comercial na área do melodrama é “O Amanhã é Eterno”(Tomorrow is Forever, EUA, 1946) de Irving Pichel, com Orson Welles, Claudette Colbert e George Brent. Welles protagoniza o marido de Claudette que vai para a guerra (a Primeira Mundial) e é dado como morto. Ela, gestante, casa com um antigo apaixonado (Brent). Mas ele não morreu embora tenha sido desfigurado por uma explosão. Depois de passar por cirurgia plástica ganha outra vida e uma filha (Natalie Wood estreando). O reencontro com a esposa que deixou passa primeiro sem que ela o reconheça, mas logo a realidade assume o quadro embora o roteiro minimize o potencial melodramático mostrando que as coisas não voltarão a ser como antes. Quem escreve o roteiro é Leonore G. Coffee sobre um romance de Gwen Bristow.
Alberto Sordi é “Um Americano em Roma”(Itália, 1952) de Steno, parceiro de Mario Monicelli em muitas comédias. O tipo vivido por Soordi é de um maníaco que participou da 2ª guerra e se torna apaixonado pelos EUA, pretendendo a todo custo viajar para lá. Chega a tentar o suicídio ameaçando se jogar do alto do Coliseu, na verdade para chamar a atenção. Por azar, o embaixador norte-americano é uma das pessoas que ele atendeu como guia turístico e provocou um acidente. Sordi está exagerado, mas o filme ainda tem momentos hilarios. Quem não conheceu esta fase do cinema italiano agora está descobrindo-a com muitos títulos da época editados em DVD e distribuídos por firmas brasileiras como a Versatil. Ao assistir a esses fílmes o cinéfilo questiona: onde anda o cinema italiano pós-Berlusconi? No cenário comemrcial há um vazio dessa que foi uma das grandes escolas do cinema mundial.



sexta-feira, 19 de abril de 2013

ALÉM DAS MONTANHAS


"Além das Montanhas" em exibição no Cine Líbero Luxardo

O conhecimento sobre o cinema romeno, entre nós, tem a marca da direção de Cristian Mungiu, um crítico feroz à ditadura de Nicolae Ceasescu que se abateu sobre o país na linha mais chegada ao que se deu na Tchecoslováquia, com o alinhamento desse lider político à ideologia da China. Deste cineasta assisti a “4 Meses, 3 Semanas e 2 Dias”(2007), filme que marca o limite para o aborto da principal personagem de um drama passado na época de Ceasescu. Agora em Belém está em exibição “Além das Montanhas”(Dupa Dealuri, 2011) filme que recebeu prêmios internacionais e que focaliza o relacionamento de duas jovens, amigas & namoradas que são separadas por diversos motivos e se reencontram quando uma delas residente há algum tempo num convento romeno recebe a visita da amiga que deixa a Alemanha, onde trabalhava, supondo afastar-se de situações vivenciadas e melhorar sua vida, ao agregar-se à amiga & amada.
Mungiu é um observador atento da era pós-Ceausescu ou pós-ditadura e demonstra isso não só no filme já citado como em Ocidente(2002) e  Contos da Era Dourada(2009), este último ciirculando por aqui em DVD. Com Além das Montanhas, citação geográfica & histórica e poética do convento onde se passa a historia, lança o olhar para a importância da religião na cultura romena, sabendo que a grande maioria cristã sofreu proibições na ditadura e no final desta era viu crescer entidades religiosas como o claustro, focalizado no romance realista “Deadly Confession”, de Tatiana Niculescu, publicado em 2006 e base do filme.
No enredo Voichita (Cosmina Stratan) e Alina (Cristina Flutur) são as personagens que se reúnem e se defrontam com um cenário agressivo a seu envolvimento afetivo. A primeira atende ao rigor do convento comandado por um frade que todos chamam de pai (Valeriu Andriuta), conhecido até como milagreiro, tanto pelas freiras como pelas pessoas da redondeza. A segunda não é uma crente efetiva nem participante dos ritos da igreja e nunca foi de se submeter à disciplina ligada a preceitos religiosos. Quando vê que seu objetivo que é levar de volta a amiga para morarem juntas na Alemanha não se confirma, decepciona-se, passa a rebelar-se também diante da rígida disciplina que lhe impõem os religiosos. Rotulada de rebelde e sendo o seu comportamento considerado “coisa do diabo” a se torna candidata passível de ser submetida a sessões de exorcismo. Gradativamente a atitude de revolta de Alina leva a formas de tortura, sendo amarrada, amordaçada e deixada sem se alimentar por vários dias.
Ao longo de toda a narrativa, com a câmera varrendo a vivência interna do claustro, observa-se a submissão das freiras ao suposto saber do “pai”. Ele dita os hábitos e é  seguido rigidamente mostrando-se um grupo que se diz cristão, mas sem nenhuma afinidade com o sentimento, o afeto, revelando-se, inclusive, a imposição de um despojamento como maneira de ser religioso. Há o confronto entre o passado e o presente entre as duas jovens com evidências de que a aproximação entre elas, naquele momento é ficção, um plano que não é mais do interesse da amada.
As sequencias de exercismo são muito crueis derivando daí a suposta inquirição ao demônio que teria assumido o corpo de Alina. Ninguém admite a crueldade física, mas atitudes de aprendizado para o espírito.
O roteiro do diretor baseado no livro que procura não se afastar de um fato real é uma séria acusação à intolerância, especialmente por conta da religião. Sabe-se que o drama da jovem rebelde acabou na alçada policial. Mas não se sabe se houve punição severa especialmente ao superior do convento, ou o pai.
As duas atrizes dividiram o premio específico no Festival de Cannes. Realmente impressionam. Mas o filme, em seu conjunto, é feliz na amostragem desejada, contrapondo a ação com elementos fotográficos que vão do branco da neve na chegada do inverno e a escuridão do claustro, sem mesmo precisar de detalhe da verdadeira crucificação da mulher rebelde. Isso e a opção por planos abertos (conjunto), por lentos movimentos de câmera, por uma cobertura musical discreta, mas atuante na ilustração do processo inquisitorial.
Além das Montanhasconsome 150 minutos que são de fato necessários na sua construção possivelmente agregada ao texto original (não conheço o romance de Nicolescu mas a origem literária é percebida. Um filme a ser conferido pelo cinéfilo autentico. Para não perder.

terça-feira, 16 de abril de 2013

O QUADRO (LE TABLEAU)




Figura Toupins de "O Quadro" em exibição no Olympia. Imperdivel! 

Um roteiro muito criativo escrito pelo diretor Jean François Laguionie e Anik Leray coloca o filme “O Quadro”(Le Tableu/Belgica, França, 2011) numa posição invejável no gênero. Seguindo o enredo, as imagens captam, em um ateliê de um pintor, um quadro com aparência de inacabado. Na interlocução entre as figuras animadas a partir da sequência seguinte vê-se uma divisão entre três tipos de personagens: os “Todopintados” (Toupins – desenhos totalmente pintados), que se consideram superiores, os “Pelametade” (os Pafinis, as figuras estão inacabadas) e os “Rabiscos” (os Reufs - esboços dos figurantes em processo de criação), estes dois últimos sendo submetidos à imposição da vontade e ao escárneo dos primeiros. Então o “Todopintado” Ramô se revolta porque sua amada Claire está sendo excluida porque é uma Pafini e, com outros personagens, sai em busca do pintor para que este reinicie seu trabalho restaurando a paz entre todos. Seguem a intrépida jovem Lola, que invade os quadros vizinhos, e o grupo passa a navegar de quadro em quadro. A “viagem” não é à toa. Alguns buscam melhor definição de cores, especialmente no que se refere ao vestuário. Outros simplesmente se acham esquecidos e querem linhas que definam melhor seus corpos. Quem pode fazer tudo isso, obviamente, é o pintor. Mas um auto-retrato deste informa-os que os Pafinis podem se pintar, basta pegarem as bisnagas de tinta ao seu lado. Começa o que se pode chamar de autopintura. Aos poucos eles percebem que essa nova atitude leva-os a se pintarem do jeito que tiverem vontade, quer dizer, podem ser quem eles quizerem ser. Mas Lola, em busca do pintor real, encontra-o em outro momento de criação, se dedicando a pintar paisagens. E está em outra realidade.
Não basta uma historia curiosa e metalinguística onde a arte da pintura é discutida a partir do ato de criação. O filme, em si, é muito bem realizado. Estruturado no processo antigo de desenho 2D sem uso das novas ferramentas digitais, usa iluminação e enquadramento de forma a sintetizar o que se passa com as pitorescas figuras, além de uma edição que incita suspense em sequências como no quadro do carnaval em Veneza onde um dos personagens passa a ser perseguido pela morte e ganha ajuda de colega (que acaba deixando a morte se transformar, depois de se limitar ao véu que a cobre, em uma peça do assoalho do lugar).
Outra sequencia ganha um tom poético. É quando o Rascunho pede ao auto-retrato do pintor ( no quadro específico) que ressuscite seu amigo, que havia sido destroçado por um dos “Todopintados”. O pintor então recoloca as linhas e o tipo ressurge para a alegria do amigo. Interessante é que Rabisco prefere que seus amigos sejam tratados em primeiro lugar do que o acabamento da sua própria pintura, demonstrando o apego aos bons sentimentos que existe mesmo numa imagem “feia”, alvo de galhofa, mas resistente a isso.
“O Quadro” aborda não só uma curiosidade em que a pintura pode ser feita por elementos de sua própria estrutura. Nesse tom, ele atende à luta de classes, dividindo as personagens em grupos antagônicos, coloca em pauta a consistência de uma obra de arte, aludindo à pressa ou incipiência do artista, e invade cenários da pintura clássica, do “nu artístico” à chamada natureza morta. No primeiro caso há uma donzela desnuda que teria sido originalmente pintada com vestido, mas logo despida pelo criador (a quem critica). Também se alude a clássicos como Van Gogh na exibição do auto-retrato sabendo-se que esse pintor desenhou a si próprio na época em que cortou a orelha em desespero (e hoje se sabe no uso da papoula, fonte do LSD). O que o cineasta produziu é um raro trabalho que exibe e discute a arte das imagens lembrando exemplares de seu próprio país como “As Bicicletas de Belleville”(Les Triplettes de Belleville/2002) e “O Mágico”(L’Ilusioniste/2010) ambos de Sylvain Chomet.
         O filme está sendo exibido no cinema Olympia até 5ª Feira às 18h30. Um dos melhores do ano. Imperdível.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

VIDEOS EM LANÇAMENTO




Kirk Douglas e Cid Charisse em "A Cidade dos Desiludidos"

No mercado de vídeo encontram-se alguns filmes de décadas passadas. A exemplo, “A Cidade dos Desiludidos”(Twon Weeks in Another Town, 1962), proposta de continuar a trama de “Assim Estava Escrito”(The Bad and the Beautiful, 1952). Vicente Minneli dirige Kirk Douglas como um ator em terapia numa casa de saúde para doenças mentais que a pedido de um diretor de cinema (Edward G. Robinson) segue para Roma para iniciar um trabalho. Os problemas de relacionamento do personagem ganham corpo quando ele substitui o cineasta amigo que adoece. Por isso é insultado. Nesse tempo, Hollywood descobriu as vantagens econômicas de filmar no exterior, especialmente num estúdio bem equipado como Cinecittá. Mas o histórico do tema se dilui numa linguagem apressada que fica à distância da expertise de Vincent Minnelli, um dos bons diretores dos anos 50/60/70. Vale apenas por curiosidade, e nisso tem Cyd Charisse em papel dramático, sem dançar, ela que era uma das maiores dessa arte (cf. “Meias de Seda”, 1957)
Roberto Rosselini está presente em “Viva a Itália”(Viva L’Italia, 1961) obra didática sobre a unificação italiana, ressaltando o desempenho de Giuseppe Garibaldi figura histórica que dedicou sua vida contra a tirania, ao participar de conflitos na Europa e na América do Sul, inclusive no Brasil. O diretor privilegiava este trabalho mas a copiagem não está boa e a densidade do roteiro, prendendo-se a uma exposição de sala de aula, tem interesse restrito.
E na área dos filmes antigos duas comédias sobre teatro mostram que eles envelhecem ruidosamente: “Somos do Amor”(it’s Love I’m After/1937) de Archie Mayo com Leslie Howard , Bette Davis e a então novata Olivia de Havilland e “Suprema Conquista”(20th Century/1934) de Howard Hawks, com John Barrymore e Carole Lombard expondo exageros de atores. Barrymore, então, está em péssimos dias para atuar.
Assisti a esses vídeos por considerar que certos títulos, hoje vistos como clássicos, trazem algumas técnicas que demonstram as inovações do momento de sua produção, mas, sinceramente, não são de minha admiração. Aliás, às vezes sinto que estou “perdendo tempo” em assisti-los. É um desabafo, mas é a minha verdade. Alguns, aliás, são tão pobres de técnica e de enredo que se tornam “bobices roliudianas”. De qualquer modo, é bom constatar isso.

Morte de Estrelas
A semana que passou colocou, exclusivamente na historia, duas interpretes de filmes e musicais: Sara Montiel e Annette Funicello. A primeira marcou época com “La Violetera” (1958) embora tenha protagonizado filmes em Hollywood, a exemplo, “Vera Cruz”(1955) de Robert Aldrich, e “Renegando o Meu Sangue”(Yellow Mocasin/1957)de Samuel Fuller, além de “Serenata”(1956) com direção de seu então marido Anthony Mann.
Sarita, como era mais conhecida, notabilizou-se nos melodramas espanhóis, notadamente os dirigidos pelo argentino Luís César Amadori. Ao se aposentar como atriz, permaneceu como cantora e, nesta condição, visitou Belém. Os fãs foram vê-la cantar a música de José Padilla que Chaplin usou em “Luzes da Cidade”(Citylights,1932).
Quanto a Annette Funicello ganhou fama nas comédias “de praia” que fez com Frank Avalon, entre outras, “Folias na Praia”(Beach Blanked Bingo, 1965) de William Asher e “A Praia dos Biquinis”(Bikini Beach,1964) também de William Asher. Eram filmes ingênuos que levavam público ao cinema. A atriz era uma “relíquia” de Walt Disney que a lançou na TV série “Annette”, em 1958. Os críticos levavam em conta a imagem de “menina comportada” a ponto de dizerem que a garota propagava o então audacioso biquíni, mas não usava a peça.
Também partiu o critico Roger Ebert, sucumbindo ao câncer com 70 anos. Era um dos mais lidos nos EUA. O presidente Obama disse em seu funeral: “...ao desgostar de um filme ele era criterioso, ao gostar era esfuziante”. Um livro com comentários de Ebert chegou a ser editado no Brasil. Ele era o titular da coluna de cinema no Chicago Sun Times. Hoje, o jornal mantém seu nome como a referencia da coluna mesmo assinada por outro jornalista. Era muito lido por Pedro Veriano que gostava das opiniões do crítico, como ele, um apaixonado pelo cinema.
Morreu também o cineasta Bigas Luna, catalão com 13 prêmios no currículo, inclusive um no Festival de Veneza de 1994 por “La Teta y la Luna”. Ele estava ativo aos 67 anos e deixou um filme marcado para estrear em 2014: ”Segon Origen”. Naslocadoras de DVD podem ser encontrados alguns trabalhos seus como “Jamón, Jamón”(1994) e “Ovos de Ouro”(Huevos del Oro”(1993).

quinta-feira, 11 de abril de 2013

MAMA



"Mama" , filme para esquecer.

A ilustre assinatura do mexicano Guillermo del Toro (“O Labirinto do Fauno”) na produção instigou meu interesse em assistir a “Mama”(EUA, 2013), do diretor e co-roteirista Andres Muschetti, amigo dele e estreante no longa-metragem (tendo filmado a mesma historia, de autoria de sua esposa Barbara, em um curta de 2008).
Pode-se contar a trama em poucas palavras: um homem atônito chega em casa, carrega as duas filhas menores e foge para a floresta, num zig-zag louco pela estrada cheia de neve, derrapa, sai do carro e acampa numa casa abandonada. O que acontece com ele não se define, mas vê-se uma decisão mortal em suas mãos: um revolver, enquanto uma sombra disforme cobre-o. Nesse momento, a câmera desloca-se para sua residência onde policiais e socorristas conversam sobre a atitude desconexa dele ao matar o melhor amigo e a mãe das crianças, sua esposa. Passam-se 5 anos e as meninas são encontradas vivas e sadias. Quem cuidou delas seria uma personagem a que chamam de mãe (mama). Um tio quer adotá-las e conta com a ajuda da esposa que faz parte de uma banda de rock. Exibindo comportamento estranho, sem chegar aos tipos criados na selva como o “Enfant Sauvage” de Truffaut e o Gaspar Hauser de Herzog, elas continuam vendo a “mama”. E as situações se precipitam ajudadas por um breve relato sobre uma mulher caída num abismo com o filho recém-nascido nos braços.
A história é inconsistente. Se a personagem fantasmagórica deseja as meninas órfãs de mãe devia tê-las levado com ela para o outro mundo imediatamente. Deixa para depois. E quais os motivos que cercam a figura maquilada como um monstro “padrão” de filme do gênero ?
Tudo poderia se encaixar até em comédia se o humor transparecesse. Mas o humor, em “Mama”, é consequência do ridículo em todas as sequencias. Além de inconsistente, o enredo é sublinhado pelos chavões de acordes musicais súbitos quando surge em cena uma personagem. Tudo gratuito, tentando assustar ou arrastar para a cena de suposto suspense, o público que pagou para isso já que o filme em si não opta por uma narrativa simples e coesa. E como se não bastasse a insistência de lugares-comuns há “furos” que denunciam um artesanato apressado sem uma consultoria de direção. Exemplo: Victoria, a menina mais velha, usa óculos. Na primeira sequencia, fugindo com o pai, quebra uma lente. Nos planos de cinco anos depois a lente aparece inteira. Como o milagre se deu? Ninguém tem ânimo de rir diante de um quadro paulatinamente pior à medida que se aproxima um final apoetótico como que coroando o ridículo permanente. A realidade (o comportamento das meninas agregadas à nova vida com os tios) e a fantasmagoria ( as figuras invisíveis a quem elas reverenciam e chamam de mama) se tornam peças de um mesmo tom e poderiam aquilatar-se ao que del Toro conseguiu em “Labirinto do Fauno”, mas aqui não funciona, pelo menos no que constatei.
Os cinemas, agora, exibem traillers compatíveis com o filme projetado. No caso de um exemplar rotulado como “terror”, projetam cenas da produção que deve chegar nos próximos dias ou meses. Dificilmente esse tipo de cinema comercial consegue atingir a ironia com que Sam Raimi tratou em “Evil Dead”(A Morte do Demônio/1981) e sua sequencia “Uma Noite Alucinante”(Evil Dead 2/1987). Raimi compreendia que o horror gótico fabricado às pressas pode gerar um efeito cômico. O seu “travelling” acelerado e amplo e os seus zumbis caricatos faziam uma festa em que o mau gosto era elemento de linguagem. Essa técnica passa ao largo dos que criam  exemplares do tipo “Eu Sei o que Vocês Fizeram no Verão Passado”. (I Know what you did Last Summer/1987) e sequência. O que importa aos comerciantes do ramo é constatar os gritos de espectadores na sala escura. Não importa se é de protesto, importa que seja visto e se pague por isso. Infelizmente uma prática que prossegue posto que o novo “A Morte do Demonio”(Evil Dead/2013) dirigido por Fede Alvarez, é a maior bilheteria da semana nos EUA , arrecadando cerca de US$ 26 milhões.
            É possivel que alguém goste de “Mama”. Eu “passo”.

INVASÃO Á CASA BRANCA



Aaron Eckhart, como o presidente dos EUA recebendo diplomatas asiáticos.

Hollywood tem história de produzir filmes sobre aventuras trágicas em seu mercado de origem. Depois de colocar toda a nação invadida por ETs em “Independence Day”(1996) e de brincar com isso em “Marte Ataca!”(1996) vem agora “Invasão à Casa Branca”(Olympus hás Fallen/EUA,2013) onde o próprio presidente é refém de terrorista, desta vez um tipo coreano (e o filme parece atual quando coloca a Coréia do Norte no rol dos possíveis vilões).
Interessa muito pouco os motivos da invasão do tradicional prédio que abriga o Chefe de Estado americano. Na sequencia inicial do filme a primeira dama morre quando se prepara para participar do Natal em casa de amigos ao lado do marido (o filho está em outro carro) e o carro derrapa na pista chuvosa. Só com o filho pequeno (Connor/Finlay Jaconson) o presidente (Aaron Eckhart) é alvo do ataque de um líder coreano insatisfeito. O terrorista quer explodir não só a Casa Branca, mas Washington por inteiro, acionando um artefato nuclear sem possibilidade de estancar a ação, mas para isso terá que conseguir o código da contra-ação norte-americana usando para isso uma sessão de tortura contra os principais assessores do presidente.
O salvador da pátria chama-se Mike Banning (Gerard Butler), um agente dispensado do posto que ocupava no momento da morte da primeira dama, e antes se queixando de estar “sem fazer nada” porque foi colocado na área administrativa do governo. Ele  tem habilidade bastante para entrar no prédio dominado pelos terroristas e enfrentar todo mundo com a cara e coragem. Ainda consegue isolar o pequeno Connor colocando-o dentro de uma das paredes que simulam tuneis.
Nada de novo se pode ver no filme dirigido por Antoine Fuqua(“Dias de Treinamento”, “Assassinos Substitutos”) com roteiro de Creighton Rothenberg e Katrin Benedict, ambos estreantes. Fica bem evidente o esforço patriótico, aquela idéia de supremacia da nação e o endeusamento do herói americano, uma espécie de super-herói que não precisa voar para dizer a que veio.
Morgan Freeman protagoniza o congressista Trumbull guinado a responder pelo governo na ausência do presidente e seu vice. Nunca o veterano ator esteve tão apático. Parece dormir na mesa quando os auxiliares do governo discutem a situação e ficam em suspense quando sabem que foi acionada a bomba que matará todos eles. Freeman é um veterano premiado por sua atuação em “Menina de Ouro”(Million Dolars Baby/2004) de ClintEastwood. Sabia certamente que seu tipo estava imbuído no ridículo total da historia. Fica a ação a cargo de Eckhart e Butler. O primeiro é convertido em principal torturado dentre seus auxiliares e convidados que com ele estavam no momento do sequestro e o segundo parece vacinado contra balas e bombas e tem “a honra” de carregar o presidente ferido para uma ambulância que chega quando tudo já está resolvido, ou seja, o vilão e sua gangue já foram eliminados.
Os filmes que ilustram perda de tempo de quem costuma pensar em cinema são cada vez mais frequentes. É de supor que a indústria convenceu-se de que o público se contenta com a ação modulada por CGI e tramas óbvias, do tipo que ao mostrar a primeira cena já dá indicativo de como vai ser a última. No cardápio de mesmice o melhor mesmo é fugir para as sessões extras ou então para o DVD, na comodidade de ser ver cinema em casa. Nesse ponto, a oferta é variada e se há coisas descartáveis, algumas enganosas como muitas rotuladas de clássico, há títulos pouco reconhecidos, do tipo que as limitações comerciais da distribuição praticamente isola em poucas cópias (ou nenhuma).
“Invasão à Casa Branca” é muito ruim. Melhor foi a invasão turbulenta dos ETs gaiatos na extravagância de Tim Burton (“Marte Ataca!”). Ali a comédia era franca. No caso do filme atual, a coisa é mais séria porque explora a “desinteligência” das agencias do tipo FBI, mostrando desconhecimento de quem é quem na equipe do diplomata asiático que visita o Presidente, daí gerando o sequestro, e ainda coloca a deriva as forças militares e de defesa que deveriam proteger a nação. O filme é uma “aula” de como “desproteger” o mandatário do país e, principalmente, deixar ao sabor da guerra, os cidadãos. Suspense patriótico.

terça-feira, 9 de abril de 2013

CINEMA COM MUSICA



Carlitos em "O Circo" (1928). Hoje, no Olympia, no programa Música & Cinema.

Pela segunda vez na programação do centenário Olympia, orgulho dos paraenses em ser a casa de exibições cinematográficas mais antiga do país, um filme mudo será acompanhado por um pianista a lembrar o que se fazia nas primeiras épocas dessa arte. É assim que o clássico “O Circo”(The Circus/EUA,1928) de Charles Chaplin poderá ser visto logo mais, às 18h30, com a presença do pianista Paulo José Campos de Melo em promoção da ACCPA, Funbel e Fundação Carlos Gomes.
“O Circo” deu a Chaplin seu único Oscar. Seria o de ator, mas a Academia reconsiderou e deu ao artista um premio especial. Chaplin só voltaria a ganhar a estatueta dourada em 1973 quando recebeu um troféu pela música de “Luzes da Ribalta”(Limelight), filme de 1952, mas só lançado nos cinemas norte-americanos dez anos depois. Este prêmio, na verdade, representou um pedido de perdão do cinema norte-americano ao ator&roteirista&produtor e diretor, além de compositor, que se impôs, através de suas criações, como símbolo do próprio cinema, depois de praticamente expulso dos EUA por acusações diversas que encobriam a perseguição “macarthista” de ser ele um simpático das esquerdas. Charles Chaplin havia sido candidato a Oscar na categoria de ator e de roteirista em “O Grande Ditador”(1941) e pelo roteiro de “Monsieur Verdoux”(uma ideia de Orson Welles) em 1947.
Em “The Circus” Carlitos, o vagabundo, acha um circo e inadvertidamente usa de suas habilidades ganhando um número no picadeiro. Na verdade, ele está apaixonado pela filha do dono do circo, amargurada pela dificuldade que encontra em firmar seu romance com um colega trapezista. Não chega a haver um confronto de personagens em torno desse romance, mas “O Circo” é um dos filmes que se enquadram bem na fórmula chapliniana de fazer rir e chorar. O final, com o desmonte da lona e os artistas se despedindo do lugar onde estavam por algum tempo resta Carlitos no vazio deixado pelo palco dos espetáculos. Este processo foi levado ao seu ponto mais alto no trabalho seguinte de Chaplin como diretor: “Luzes da Cidade”(Citylights/1932), o seu primeiro filme editado na era do som, mesmo assim só deixando na pista sonora ruídos e música.
Como em seus filmes mudos e mesmo sonoros, Chaplin compôs a música incidental ou mesmo canções que marcariam personagens. Não sei se é esta musica que vai ser tocada pelo pianista paraense, mas o modo como vai ser efetuar a sessão dá a esta reprise de “O Circo” um caráter todo especial, o prazer de se estar vivendo a época em que o filme foi lançado.
O tipo de programa vai prosseguir. Para o próximo dia 14, quando o Cine Olympia fará aniversário (101 anos) deverá haver outra exibição do gênero. É um modo de se saudar uma casa que nasceu na época em que o cinema precisava de músicos abaixo da tela para acompanhar as imagens projetadas e com isso levar ao público a emoção desejada pelos cineastas realizadores.
A sessão com “O Circo” acaba sendo o melhor programa do dia.
         O que também merece projeção é o arranjo desse programa em torno da temática “cinema e música”. Assim, esse evento não deve ser visto apenas pelo fato saudosista de uma época em que o cinema mudo povoava a casa centenária e criava o “frisson”, com os maestros “por trás da cena”. Este tema já foi um dos motivos de enfoque de Panorama, em tenpos pretéritos, e quem escrevia sobre a relação dessas duas artes era o amigo maestro Silvério Maia (hoje residindo em João Pessoa). A discussão em torno do cinema e música leva a uma série de enfoques. Por exemplo, no final de semana fui assitir a “Mama” filme que tem Guillermo Del Toro como produtor e o que se vê é o estereótipo do gênero onde a trilha sonora se curva aos momentos de encravar as cenas de terror. Uma tristeza. Por outro lado, no filme de Werner Herzog, “Além do Azul Selvagem” (The Wild Blue Yonder/EUA, Alemanha, França, 2005) o destino musical é apoteótico. Numa cadencia entre a imagem e o som, a gradação dá o toque de um repertório plástico irretocável. Amei o filme por essa excelência também e pelo modo de este cineasta tratar da vida pela própria vida. O grande enigma que ainda não se resolveu.
         Bem, “cinema e música”, hoje, é a pedida. Vamos lá.