quarta-feira, 28 de agosto de 2013

AMOR PROFUNDO & OUTROS

"Amor Profundo", de Terence Davis.
 Muitos filmes que chegam às locadoras e lojas que vendem cópias em DVD não alcançam os nossos cinemas comerciais (e muitas vezes nem as salas extras). Esta semana assisti a um titulo que recebeu muitos prêmios e elogios, mas que eu desconhecia inteiramente: “Amor Profundo”(Deep Blue Sea/UK, 2012), dirigido por Terence Davis de um texto de Terence Rattingan.
O enfoque é de uma mulher de família modesta (Raquel Weisz) casada com um juiz muito influente (Simon Russel) muito mais velho que ela, que mora com o marido e a sogra, em Londres. O recorte temporal é o inicio dos anos 1950. Ao conhecer um ex-combatente da 2ª Guerra (Tom Hiddleston) a jovem esposa inicia um romance com ele, mas confessa ao marido. O divorcio é negado e ela, desesperada, tenta o suicídio. A atitude extrema da jovem e uma carta que escreve ao namorado são tomados como uma afronta e ele se mostra violento. O marido, que havia sido abandonado e muda de ideia com relação ao divorcio, reaparece e tenta a reconciliação. Mas o novo amor, mesmo com a atitude de enamorado, leva a personagem a um drama pontuado pela solidão.
Rachel Weisz, que atuou com o diretor brasileiro Fernando Meirelles em filmes como “O Jardineiro Fiel”(The Constant Gardner/ 2005) ganhando prêmios dos críticos de Nova York e Toronto, com o filme chegando a candidato ao Globo de Ouro, tem um grande desempenho. Com narrativa pausada, o diretor de “Vozes Distantes” (1988) e “Memórias”(1995)  segue de perto o texto do autor de “Nunca Te Amei” e “O Príncipe Encantado”. Mas sempre exibindo cinema, ou seja, sem se deixar escravizar pelo poder da palavra que existe em falas muito substanciosas.  Vale a pena conferir.
"Diaz: Política e Violência". Imperdível!
Nesta época de movimentos populares o lançamento de “Diaz, Política e Violência” (Diaz, Itália, 2010) pode ser considerado oportuno. O filme trata do protesto de estudantes em Gênova quando de uma reunião de cúpula de governantes de muitos países. A polícia reprime com extrema violência matando muita gente. O filme dirigido por Daniele Vicari segue uma linha documental, lembrando, no estilo, o clássico “4 Dias de Rebelião” (Le Quattro Giornate di Napoli, Itália,1962) de Nanni Loy. Ha inclusive sequencias com cenas reais extraídas de cinejornais da época. O filme foi candidato aos Oscar de melhor roteiro e melhor obra estrangeira. Outro exemplar inédito entre nós.
“Uma Historia de Amor e Fúria” (Brasil, 2012) é uma animação de Luiz Bolognesi contando de modo bastante particular a história do Brasil desde a época do descobrimento, passando por rebeliões como a perseguição a escravos que fugiam e se organizavam em quilombos, indo ao fim do império, à ditadura militar de 1964-86, adentrando o futuro com a lua pela água que passa a  ser uma riqueza de difícil acesso. O veiculo dessa viagem no tempo é um índio imortal e a sua companheira Janaina que renasce nas diversas épocas. Experiência interessante que se discute na liberdade tomada com fatos históricos divergindo do que se aprende na escola. Vencedor do Prêmio Annecy.
Dois seriados de TV surgem agora em DVD em compactos: “A Vida de Galileu” (Galileo, UK 1975), de Joseph Losey e “Ressurreição” (Ressureisssione, Italia, 2001) dos irmãos Paolo e Vittorio Taviani. Raridades que o telespectador local não conhece. Os discos guardam todos os episódios produzidos e ainda trazem bônus com detalhes das realizações.
Com essa programação extra que aqui exponho, o cinéfilo se pergunta por que, com tanta produção que pode sanear a exibição comercial, o circuito cinematográfico se prende a somente um estilo de filme e castiga aquele espectador mais interessado em títulos diversos. A exibição pública desse material seria mais um meio pedagógico de formar plateias, mas, ao que consta, ficam os privilegiados a assisti-los porque não há interesse nesse uso do cinema e há proibição de exibição pública de DVDs. No caso, seria então uma atividade para a ACCPA exibir aos seus associados, pois, essa seria uma maneira de os colegas conhecerem na prática certo cinema que não chega ao público. Fica a dica.


GENTE GRANDE



 Adam Sandler & amigos no filme 2 da série

Um crítico norte-americano classificou o filme (?) “Gente Grande 2”(Grown Ups 2, EUA, 2013) como “perda de tempo”. E nisso englobou realização e exibição (a parte do espectador). Realmente não há nada a acrescentar à ideia do avaliador e nada que se ganhe assistindo o que alguém chamou um dia de “comédia descerebrada”.
Adam Sandler produziu e interpretou anos atrás o “Gente Grande 1”(Grow Up) onde focalizou pessoas da classe média norte-americana em um momento festivo, um campo de férias onde os tipos exibiam suas características que no olhar de alguns eram tidas como “divertidas”. O filme se constituiu, na ocasião, em boa bilheteria talvez pelo efeito mimético (muitos se viram nessas estripulias familiares). E eu, como rotineiramente, escrevi comentário neste espaço, indicando o óbvio: os atores pareciam se divertir mais do que os espectadores assistindo ao filme. O sucesso comercial levou Sandler e o diretor Dennis Dugan à sequencia. E agora os personagens estão mais maduros, com os filhos adolescentes, às voltas com problemas que estes enfrentam na escola, e alguns adotam posturas dignas de figurar em casas de saúde como o caso do motorista do colégio das crianças que foi abandonado pela esposa e passa a se portar de forma delirante.
Francamente não sei como é possível envolver o riso a partir de uma realização tão medíocre. Certamente Dugan pensou em fazer um novo “Hellzapoppin” (Pandemônio, 1941), a célebre comédia com Olsen e Johnson dirigida por H.C.Potter. Mas o riso que vinha de metacinema (havia um momento em que eram trocadas as partes do filme sendo visto uma cavalaria de westerns adentrando numa sala de baile),  passa ao largo das momices que se colam em ambientes domésticos. Esse pessoal acha engraçado, por exemplo, um personagem em um supermercado abrir uma caixa que guarda balsa inflável e de um puxão no fio disponível esta inflar derrubando tudo o que está a frente. A licença para a comédia visual não é aproveitada no tempo certo e o que lembra esse tipo de filme se esgota na gratuidade da amostra, cercada de falas que tentam um quadro real como pais, alunos e professores em suas tarefas de rotina. E sempre tramando algo.
Para qualificar em resumo o besteirol de “Gente Grande 2” basta a sequencia do balé infantil em que a filha de Sandler é protagonista e a barafunda que ocorre por conta de tipos extremamente caricatos que aparecem por lá. Não é para rir é para ter raiva.
Minha suposição para “Gente Grande 2” é de que fosse o menos ruim dos lançamentos da semana nas salas comerciais da cidade. Subestimei “Circulo de Fogo” ( Pacific Rim/2013  ) de Guillermo del Toro. Bem administrado na colagem de fantasias orientais como “Godzilla” (Gojira/1954) e outros monstros filmados por Ishirô Honda, este filme trata da batalha de seres humanos contra criaturas gigantescas (Kaiju) saídas das profundezas dos oceanos. O ano é de 2040 e, contra esses monstros, os seres humanos fabricam robôs gigantescos (Jeagers) guiados por experimentados pilotos que submergem e atacam as criaturas. Mas não é fácil derrubá-las e os primeiros pilotos morrem. No combate final uma oriental (Rinko Kikuchi) será comparsa de um veterano piloto de provas (Charlie Hunnam). Antes de atuarem juntos ela e ele chegam a se enfrentar numa sessão de caratê. Sequencia usada para mostrar a habilidade dos personagens e em especial do que a “heroína” guarda da cultura de sua terra. Claro que no fim pinta um romance, embora de forma discreta.
O filme de Del Toro tem sua maior parte dedicada a efeitos especiais. Mas deve preencher o quadro de lembranças do diretor, que é amante de fantasias cinematográficas como deu prova em seu melhor trabalho até hoje: “O Labirinto do Fauno”(El Labirinto del Fauno, 2006).
Competente como fantasia ligada aos mangás e sci-fi dos anos 50/60, “Circulo de Fogo” deve ser visto em boa projeção. Ruim é saber que por aqui as cópias 3D estão sendo projetadas em salas com lâmpadas fracas e consequente projeção escura. Assim não se sabe determinar personagens com ideias diferentes na historia..


segunda-feira, 19 de agosto de 2013

MARATONA DA MORTE

 Jane Fonda e Michael Sarrazin em "A Noite dos Desesperados"(1969)
  
Emprestei o titulo da coluna de hoje de um filme dirigido por John Schlesinger em 1976 (no original “Maraton Man”) para tratar de “A noite dos Desesperados”(They Kill Horsesm D’Ont They?/EUA 1969) dirigido por Sidney Pollack de um roteiro de James Poe e Robert Thompson, baseado em um livro de Horace McCoy. Nele se vê um concurso de dança na época da grande depressão (1929/30) quando se oferecia US$1.500 a quem conseguisse se manter de pé, dançando, por horas e horas até seus concorrentes cansarem.
Dos tipos focalizados chamam a atenção a jovem Gloria (Jane Fonda), disposta a ganhar pelo dinheiro oferecido, a atriz emergente Alice (Susanah York), um marinheiro aposentado (Red Buttons) e um fazendeiro que havia chegado do rancho onde morava com a família, Robert (Michael Sarrazin). Dirige a porfia Rocky (Gig Young). E entre os poucos intervalos a dança corre por horas e horas desafiando físicos que já sentiam a falta de uma boa alimentação na época.
A sequencia inicial é emblemática: o garoto Robert vê matarem um cavalo doente. No correr da narrativa há espaços para ele depondo em juízo. Não se sabe o que fez. E acompanha-se o seu relacionamento com Gloria e também com Alice, esta depois de ter sido roubada pelo próprio organizador da maratona que não achava “comercial” ela se apresentar com vestidos usados no cinema “como se estivesse em um hotel de luxo”(a ideia era justamente apresentar pessoas sofridas com a depressão).
A morte do cavalo rima com a de outra personagem. A frase-título do livro e filme no original é o argumento que um dos tipos dá a um policial que investiga um crime cometido nos bastidores da porfia. O enredo não deve ser desfiado em todos os seus aspectos, mas deve ser econhecido que a realização de Sidney Pollack mostra sua força a cada sequencia, ajudada por uma excelente montagem.
O filme ganhou o Oscar para a categoria de ator coadjuvante dado a Gig Young e o Bafta (Prêmio inglês) para Susanah York. Foi sucesso na sua estreia e se mantém pouco envelhecido visto hoje. Foi copiado agora em DVD e está circulando no Brasil.
“ Barbara”(Alemanha 2012) é o mais novo filme de Christian Petzold, o diretor de “Yella” e “Segurança Interna”, exibidos recentemente no cine Olympia de Belém. Trata de uma jovem médica que sai da prisão em caráter condicional e vai clinicar num hospital ligado ao sistema penitenciário ajudando um colega. Os problemas da personagem-título não são esclarecidos logo para o espectador. Acompanha-se a trajetoria de Barbara entre os casos de doenças e suas resoluções. A linguagem é pausada e com economia de palavras, procurando sempre tirar proveito da capacidade de expressão da atriz Nina Hoss vencedora de vários prêmios europeus. O resultado pode não contentar a todos, evidenciando-se, em outra escala, a análise psicológica e o enfoque de uma situação dramática. Mas não resta duvida de que é mais um título que promove o diretor a um posto expressivo dentro do cinema alemão de hoje.
Quem assistiu aos westerns de Sergio Leone(1929-1989) em seu tempo de estreia aprendeu a separar o chamado “faroeste espaguete” de obras mais densas dentro do gênero. Leone era um perfeccionista, e seus enquadramentos são espantosos. Uma trilogia de seus trabalhos foi agora lançada no mercado brasileiro de DVD: “Por um Punhado de Dólares”(Per um Pugno di Dollari, 1963), “Por Uns Dolares a Mais”( Per Qualche Dolari in Piu, 1965) e “3 Homens em Conflito” (l Buono, Il Brutto i Il Cattivo, 1966). Todos interpretados por Clint Eastwood. Bons exemplos de plasticidade num gênero que se via como  norte-americano por excelência. Os estudiosos cinéfilos deveriam assistir e avaliar essa narrativa que tem um domínio de linguagem na introspecção do protagonista. Gestual e ausencia de diálogos dá o tom do cinema em que a imagem predomina.

quinta-feira, 15 de agosto de 2013

CONCURSO PARA O PIOR


"O Concurso": tempo perdido 

A ideia que deu origem ao roteiro do filme “O Concurso”(Brasil, 2013) não é ruim. Este roteiro foi escrito pelo diretor Pedro Vasconcelos e por L.G. Tubaldini Jr. e, ainda, Leo Lewis. No enredo, quatro rapazes de diferentes estados candidatam-se a uma vaga de juiz federal, com o exame a ser efetuado no Rio de Janeiro. Há um carioca (Danton Mello), um paulista (Rodrigo Pandolfo), um gaucho (Fabio Porchat), e um cearense (Anderson di Rizzi) se esforçando para a classificação ao cargo. O carioca é que parece ter mais chance de aprovação por ser advogado militante no fórum do Rio, conhece pessoas, e sabe usar de lábia para obter favores que impulsionem sua carreira. Mas há um tropeço e ele é obrigado a ajudar os colegas. Pensam, entre outras estratégias, comprar os gabaritos da prova. E onde encontrar esses gabaritos? Não é em alguma gráfica ou na casa de algum professor, mas, por incrível que pareça numa favela onde um anão traficante não só vende as questões ambicionadas como deixa que os candidatos entrem num esquema de farra com direito a mulheres e drogas.
É notória a lembrança da série norte-americana “Se Beber Não Case”(2009). Mas o exagero de passagens hilárias, embora não exista nada de novo nisso, é fórmula de pornochanchada tradicional, dessas que eram realizadas na época da ditadura para driblar censores e chamar um publico que não se sentia à vontade com o cerebralismo do movimento “cinema novo” dos anos 50-60.
Chega a ser curiosa esta marcha à ré da cinematografia nacional em  tempo de governo democrático, onde é possível ir à rua, gritar contra o que acha que não está correto (ou simplesmente fazer coro sem ter a noção do que venha a estimular um movimento de reivindicações). O que acontece é simplesmente um processo industrial & comercial resolvido às pressas. Hoje um filme nasce com os custos já resolvidos. São muitos os subsídios de empresas que com isso descontam no imposto de renda. Os produtores que não conseguem quitar uma realização cinematográfica estão sujeitos ao prejuízo que a má distribuição e exibição oferecem na eterna luta contra o produto estrangeiro. Por esse motivo, fazem-se muitas comédias sabendo-se que é o que o público gosta, pois, não perde o gênero na televisão.
“O Concurso” é o pior exemplo da nova vertente de um tipo de filme “caça níquel”. Todos os personagens repousam em estereótipos. O carioca, como maior exemplo, é visto por duas vezes numa praia, olhando as garotas e tomando sorvete ou bebendo cerveja. O cearense tem a máscara do ingênuo que se mete em trapalhadas. Enfim, cada tipo é moldado de forma e gerar o riso antes mesmo que se meta em aventuras, por sinal, previsíveis.
Não creio que as pessoas com um mínimo de bom gosto ou que estejam numa sala de cinema dispostas a se divertir apreciem o que poderia se ver como uma paráfrase da matriz norte-americana dizendo que não adianta beber nem casar para saber de um concurso antes de ele ser realizado. E se os autores da historia não fossem tão preocupados com a gaiatice dos seus personagens podiam adentrar pela critica sociopolítica chegando à violação do conhecimento às questões da prova passando ao conhecimento de candidatos de uma elite, ou pelos (des)caminhos de pessoas ilustres (há uma caricatura delas no papel de Pedro Paulo Rangel) que favorecem seus “afilhados”.
Para o bem do cinema nacional que ainda contra essa maré de desacertos deixa bons exemplos como “Xingu” (2012), “Corações Sujos”(2011), “À Beira do Caminho” (2012) o melhor é esquecer este “Concurso”. Que classifica um besteirol de baixissima qualidade.


ELENA


"Elena", de Petra Costa. Imperdível

Nós que fazemos filmes/vídeos em casa, com membros de nossa família, sentimos o carinho com que Petra Costa realizou o seu “Elena” (Brasil, 2012) filme-homenagem à sua irmã que desejava ser atriz, desejava dançar diante das câmeras e não se contentou brilhando no cenário nacional, onde ganhou páginas de jornais e revistas, ppreferindo tomar o rumo dos “States” onde achava que ali teria a chance de se tornar uma estrela (mas ela já era uma, diga-se).
Em um momento das lembranças de Petra há uma frase de Elena que nas imagens ganha uma singela animação e que refere uma dança com/ ou na lua. Vai ter significado ao assistirmos o filme pelas evidencias de que a jovem brasileira não resistiu a tanta ansiedade de frequentar aquele mundo tão competitivo para onde seguiu em busca de sucesso. E o céu que ganha não é o das estrelas de Hollywood. Na linguagem poética da irmã que era uma criancinha quando a mana já ensaiava seus passos de dança e seus pendores de atriz, as duas se confundem. No correr da narrativa, se é que se pode chamar de narrativa, pois o filme todo é poesia livre, elas se enleiam. Há cenas em que não se sabe se é Petra ou Elena que estão andando ou simplesmente olhando em frente. Compreende-se a ideia da irmã em não só seguir os passos da mais velha no país que esta escolheu para morar como transportar imagens de velhos filmes caseiros em elementos de versos, ou divagações amarradas a doces lembranças.
Também é focalizada a mãe de Elena e Petra. Dos vários closes, também tirados dos velhos filmes, o rosto reflete amargura. O destino da primogênita não seria o desejo materno. Isso não precisa ser dito em palavras. Aliás, o filme não usa muito falas. A cineasta prefere sempre o apoio da imagem. São recortes do passado, alguns enfoques do presente, tudo montado de uma forma aparentemente anárquica, como a dizer que os sentimentos fraternos não se prendem a convenções sejam literárias sejam cinematográficas no sentido tradicional.
“Elena” é um filme corajoso como foi montado para chegar ao grande público. Para absorvê-lo bem é preciso que o espectador saiba do valor que tem os registros de imagens familiares que já existiam no tempo das películas em 16mm ou Super 8mm e hoje são comuns no traquejo dos vídeos (antes do VHS hoje do DVD).
Um trabalho desse porte evoca o valor da câmera como o olho da vida, a testemunha de acontecimentos que não tem opinião propria como no cinema de ficção ou “pousado”, mas simplesmente registra detalhes que se apegam a emoções. É só pensar nos vídeos de festas intimas como aniversários. Anos depois do fato acontecido, vê-se o que foi gravado como testemunha de momentos alegres, de união de pessoas queridas, o que não quer dizer que se registrem também fatos amargos, partidas de alguém seja para outro lugar, seja da própria vida. Esse modo de fazer cinema, aparentemente anárquico porque não segue um processo narrativo ligado a uma determinada história, é pura emoção. Claro que diz respeito, primeiramente, a quem o fez. Mas não se furta a oferecer um efeito mimético. Daí se dizer que “Elena” é um filme de amor entre irmãs que transborda para as plateias.
Na coluna de terça feira, neste espaço, mencionei filmes brasileiros bons em meio às pornochanchadas lucrativas. Coloquem o trabalho de Petra Costa, “Elena”, nesse rol.



segunda-feira, 12 de agosto de 2013

COLEÇÕES DE CLÁSSICOS EM DVD


Juliette Binoche em "A Liberdade é Azul". Trilogia das Cores - Kieslowski

Está sendo relançada no Brasil a chamada Trilogia das Cores, filmes que o polonês Khristoff Kieslowski fez em homenagem às cores da bandeira francesa. Em cópias remasterizadas, com ótimas imagens, vê-se “A Liberdade é Azul” (Blue, 1993), “A Igualdade é Branca”(Blanc, 1994) e “A Fraternidade é Vermelha”(Rouge, 1994) No primeiro filme Juliette Binoche é a esposa de um musico que escapa de um acidente onde morrem ele e a filha de 6 anos. Apaixonada, ela cultua a memória do marido até saber que ele era amante de uma advogada e que está espera um filho dele. A reação que em principio é de ódio vai mudando para uma certa tolerância e a noção de que ela deve cultuar, agora a sua liberdade e viver sua vida. Em “A Igualdade...” o polonês Karol (Zbigniew Kamachiwski) é casado com a francesa Dominique (Julie Delpy), mas ela pede divorcio alegando a não consumação do casamento. Voltando a Varsóvia, o polonês amarga dificuldades de se manter até que acha um compatriota e, juntos, descubram meio de vida e ele inicie uma inusitada vingança contra a ex-esposa.
E “Fraternidade...”tem Iréne Jacob como a modelo que atropela um cachorro e acha o dono do animal que é um juiz aposentado (Jean Louis Trintgnant) dedicado a ouvir conversas telefônicas de seus vizinhos. Trata-se de um filme mais denso da série e no final homenageia os outros títulos.
O diretor disse, em uma das muitas entrevistas disponíveis nos DVDs que mal sabia falar francês. Usou intérpretes. E detalhou cenas como os segundos que levam em “Blue” para a heroína molhar no café um torrão de açúcar.
Também chegou ao DVD uma coleção dedicada a filmes que se basearam em romances de Graciliano Ramos: “Vidas Secas” (1963), “S. Bernardo”(1961) e “Memórias do Cárcere”(1984). Três clássicos do cinema brasileiros dirigidos por Nelson Pereira dos Santos (“Vidas...” e “Memórias...”) e Leon Hirszman (“S. Bernardo”).  Impossível fazer uma revisão do cinema nacional sem citar esses títulos. Há muitos eles vinham sendo solicitados pelos cinéfilos e agora chegam em ótimas condições técnicas .
E ainda, na parte de coleções, chega “Além da Imaginação” (Twilight Zone/EUA) toda a primeira série produzida por Rod Serling muitos episódios escritos por Richard Matheson. Quem acompanhou o programa por aqui através da TV Marajoara vai exaltar. E com a vantagem de poder assistir em trilhas legendadas (som original). Um punhado de filmes curtos que realmente, como diz o titulo em português, desafiavam as ideias dos telespectadores com tramas criativas como a dos cirurgiões que fazem uma operação plástica em uma paciente e se julgam derrotados quando na verdade se vê que são ETs e a operada uma linda mulher.
Ainda no rol das coleções, os 3 westerns básicos de Sergio Leone: “Por um Punhado de Dólares” (1964), “Por Uns Dólares a Mais”(1965) e “Três Homens em Conflito”(1966). O trio representou da melhor forma a vertente do gênero realizada na Europa. A linguagem onde se exploram todos os recursos plásticos impressiona e ganha ajuda na música de Ennio Morricone.
As distribuidoras de vídeo estão agora se preocupando com coleções. E nelas levam ao público peças indispensáveis numa coleção de filmes que marcaram a história do cinema. Assim, aquele/a que é um estudioso/a de cinema vai estar atento/a para assistir a esses filmes que, de certa forma, têm contribuições que podem estar afinadas com as ideias dos cinéfilos. E os/as atuais alunos/as do curso de cinema da UFPA também têm obrigação, em termos de aula prática, de assistir a esses programas para contar com uma base da história e da técnica cinematográfica.



APOSENTADOS SEM CAUSA

Os "ossos do ofício" de Bruce Willis em RED 2. Bad.

Em 2010, Hollywood concebeu dois filmes com a mesma fórmula: unir antigos intérpretes de aventuras com muita ação. Sylvester Stallone produziu, dirigiu e atuou em “Os Mercenários”(The Expendables) e Robert Schwentke dirigiu “Red-Aposentados e Perigosos”(Red) segundo roteiro de Jon e Erich Hoeber, com base nos quadrinhos de Warren Ellis e Cully Hamner para a DC Comics. Neste último caso figuraram Bruce Willis, Mary-Louise Parker, Morgan Freeman, Chris Owens, Lawrence Turner, Ernst Borgnine, John Malkovich, Helen Mirren, Richard Dreyfuss e Robert Morse. A maioria dos intérpretes, nos dois filmes, soma mais de 50 anos. E muitos estavam um pouco distantes do mercado cinematográfico embora alguns aparecessem em obras adultas e independentes dessas que fazem carreira a partir de festivais.
Os enredos dos dois exemplos repousam na ideia de que os “heróis não estão cansados” como disse um filme francês de 1955, dirigido por Yves Ciampi, com Yves Montand. Para atletas como Stallone e contumazes de peripécias absurdas com teor cômico à maneira de Willis, na série “Duro de Matar”, o público de idade correspondente se deleita com a ideia de que o tempo não interfere no ímpeto dos antes chamados “mocinhos”.
“Red 2, Aposentados Ainda Mais Perigosos”(Red 2, EUA, 2013) é a consequência natural do sucesso financeiro desses filmes. Afinal, a meta da indústria cinematográfica é pontuada por uma cifra que passa de US$ 1 milhão nas bilheterias domesticas. Se o filme lucrar essa média faz-se uma sequencia. Enfim, segundo os comerciantes do ramo, é melhor apostar no “déja vu” do que arriscar na novidade que se interroga.
O roteiro do novo “Red”, escrito pelos mesmos Hoeber e vindo da mesma fonte de gibi, é o mais absurdo da espécie. Frank Moses (Bruce Willis) vai ao funeral de Marvin (John Malkovich), mas sabe que é uma farsa. O amigo não morrera apenas se escondera de sua própria agencia empregadora que pretendia eliminar não só a ele, mas o seu amigo. E Frank sofre atentado junto com a esposa Sarah (Mary-Louise). A plateia pergunta por que a CIA ou o FBI querem eliminar seus antigos funcionários. Há uma bomba que faz o efeito de uma nuclear, mas é isenta de radiação. Quem a inventou e a guarda é o cientista Bailey (Anthony Hopkins) confinado em um manicômio. É claro que a trinca (Sarah, agora, é parte ativa no grupo) vai atrás do cientista e com eles segue Victoria (Helen Mirren), Katja, uma agente russa (Catherine Zeta-Jones) e um coreano que em principio queria a cabeça de Frank: Han Cho Bai(Byung-hun Lee).
O filme inteiro é um corre-corre atrás da bomba ou “Projeto Nightshade”. E nesse ritmo acontece o que é sempre anunciado nos blockbusters: desastres de carros, explosões, tiroteios, saltos de grandes alturas, tudo o que seja auxiliado com CGI (Computer Graphic Imagery), ou seja, efeitos digitais de firmas especializadas como a de George Lucas - LucasFilm Ltd.
Mas, na verdade, o filme apresenta uma overdose de peripécias e, mesmo com um toque de comédia que parece imprescindível para que se assista o besteirol até o final, acaba cansando. Pessoas em pulos gigantescos, rajadas de balas inofensivas, deslocamento de personagens sem que possam estar em processo de bilocação & tudo o que você assiste nos seriados do tipo nas tevês fechadas (e mesmo abertas) está nas tomadas que parecem não acabar nunca de tão monótonas. E olhem que eu até que gosto desse tipo de aventura ...
Nos EUA, “Red 2” já saiu do mapa dos grandes sucessos da temporada de verão. Por aqui, na estreia, estive em uma sessão de apenas 8 espectadores. E vi gente saindo no meio. É muito abacaxi para ser descascado mesmo por plateia que só vê cinema como passatempo. Não sei se outras salas exibidoras algures alimentarão essa produção por mais semanas em cartaz. Mas que é perda de tempo não se tenha duvida. É pesado pagar um ingresso caro por nenhuma contrapartida. E haja Bruce Willis inventando dribles. Tristeza mesmo é ver Helen Mirren metida nesse “imbróglio”. Mas o dinheiro certo do contrato é sedutor, daí...


quinta-feira, 1 de agosto de 2013

MALVADO HERÓICO



Gru, o personagem que não é malvado 

O interessante das novas animações é a maneira como diluem a maldade dos vilões. “Megamente” e “Meu Malvado Favorito” exemplificam essa tendência. Para as crianças é muito mais salutar levar ao riso tipos que antes eram moldados para amedrontar (um exemplo clássico que levou ao pesadelo muitos meninos e meninas foi a bruxa da Branca de Neve) do que seguir os pais no medo de “bichos papões”. E não vamos longe: um dos personagens da garotada de hoje é o ogro Shrek. E ogro, na cultura anglo-saxã, é o correspondente do nosso bicho papão.
“Meu Malvado Favorito 2”(Despicable me 2, EUA, 2012) segue a fórmula de refazer o que fez sucesso comercial. O enredo trata do malvado que mostrou ter coração bondoso ao adotar crianças e que acabou se transformando em um dos campeões de bilheteria há dois anos. O retorno do personagem deu certo comercialmente, e não é preciso apostar numa terceira aventura de Gru. O feioso alto e desastrado tipo-vilão, ganha a direção dos mesmos Chris Renaud e Pierre Coffin da primeira versão.
O roteiro dessa nova animação (de Ken Daurio e Chris Renaud,os mesmos de “Meu Malvado Favorito 1”) não implica em novidades. Gru é contratado pela Liga Anti-Vilões (AVL) para lutar contra um gênio do mal ao lado de uma agente, Lucy. Quem está sofrendo com esse bandido conhecido como El Macho é, em primeira instancia, o grupo dos Minions, espécie de pequenas máquinas amarelas que perseguem o bom humor mesmo quando ameaçadas. E logo na primeira sequencia do filme dois Minion são içados por uma grua na perseguição a quem tenta sequestrar o amigo Gru. Bem, não adiante contar a historia do filme porque ela é extremamente tênue a ponto de se resumir em poucas linhas. A aventura está na trama em assegurar à AVL que tudo seguirá dentro do previsto pela companhia impedindo que um composto químico caia em mãos erradas. Mas registra-se um fato raro que deve dar a chave para a terceira aventura cinematográfica de Gru: o personagem casa-se. E a festa de casamento fecha a trama com todos os requisitos de um grande momento.
Gru no Brasil é dublado por Leandro Assum e nas cópias originais norte-americanas por Steve Carrel. Lucy é ouvida aqui através de Maria Clara Gueiros, humorista, que substitui Kristen Wiig. E a nata dos bandidos fica com as vozes de Sidney Magal (antes, por Benjamin Bratt) como El Macho, e Luís Carlos Persy (em EUA, Russel Brandt) como Dr. Nefrario.
A técnica de animação desde que investiu inovações no uso da informática mudou muito. Talvez à época dos desenhos bidimensionais a aceleração de sequências não fosse possível da forma como hoje é apresentada. Por mais que os tipos distem de figuras humanas, os objetos possuem um apego realista e fica engraçado como personagens bons e maus (chamadas heróis e vilões) transitam entre espaços conhecidos. Imagino como uma técnica contemporânea fascinaria o pioneiro Walt Disney que dirigia equipes gigantescas por meses em esboços desenhados no papel para que estes passassem a um departamento que criava de um tipo de desenho para cada plano, o sequenciamento que levaria à ilusão de movimento seguindo o fenômeno que se chama “persistência retiniana” e que, afinal, é a base do cinema (isto quer dizer que o olho humano não pode discernir determinado número de imagens que circulem apressadamente diante dele e daí só seja captada uma que parece se movimentar devido a velocidade com que supera as demais).
“Meu Malvado Favorito 2” só é malvado no nome. Como cinema talvez faça um pouco de “malvadeza” com quem espera mais substancia do enredo e linguagem. Mas como o objetivo é divertir, e, em especial, a garotada em férias, não se pode dizer que não tenha tido êxito.