segunda-feira, 2 de abril de 2012

DRIVE

Ryan Goslin, num bom desempenho em "Drive"


Premio de direção em Cannes, o filme “Drive”(EUA, 2011), do dinamarquês Nicolas Winding Refn chega à Belém para sessões noturnas em uma sala de um dos circuitos exibidores. Merecia mais, embora a falta de vez dos filmes premiados numa cidade como Belém seja comum. Basta consultar os candidatos ao Oscar para se ter ciência disso.

A trama é simples: um mecânico, dublê de atores em cenas perigosas de filmes americanos, serve também de motorista de ladrões quando solicitado. Este “ramo profissional” leva-o a se afeiçoar de uma vizinha, mãe de um garoto e esposa de um presidiário. Quando este sai da cadeia tem sob sua guarda uma vultosa soma em dinheiro, produto do ultimo roubo e motivo de cobrança de outros parceiros criminosos. O “driver” (motorista) resolve ajudar a mulher e o filho desta. E se mete numa aventura em que a violência é um elemento natural de se achar solução.

A narrativa não se embrenha em voltas no tempo ou momentos de reflexão de algum figurante. O estilo é bem “noir” embora a iluminação não siga o gênero que teve o seu auge na Hollywood dos anos 40. Nesse tom, cabe um grande esforço de interpretação para Ryan Goslin. Ele impõe a máscara de um homem calmo, monossilábico, jamais sorridente ou capaz de demonstrar postura romântica. Mesmo sentido grande afeto por Irene (Carey Mulligan), não a leva a cenas idílicas que possam traduzir-se em momentos de paixão. Sabe-se das ocorrências com o mecânico por suas atitudes. Porque a câmera segue-o o tempo todo sem necessidade de diálogos para identificar posturas. É interessante o diretor colocar uma espécie de robô na trama que envolve muito sentimento (de amor, de vingança, de cobiça).

São emblemáticos os closes de Goslin. E nunca se sabe o nome dele. Não é bem o“estranho sem nome” como o caubói vivido por Clint Eastwood num western que exigia esse tipo de interpretação. Trata-se de um solitário que se vê nas máquinas que conserta e maneja. E afinal um dirigente de seu próprio destino, não à toa dando o nome de sua história ao trabalho de um condutor. Ele dirige carros que se despedaçam nas cenas de filmes, e em sua rotina é como se fosse um desses aparelhos que se podem despedaçar dependendo de como será conduzido.

A narrativa fluente sustenta um equilíbrio que se alimenta da violência explicita. Há cenas de crânios esfacelados, de carros batendo entre si com quedas em abismos, de esfaqueamento, emfim, do que possa gerar um clima angustiante. É interessante ressaltar que a violência mostrada não parece à toa. Quem já assistiu aos filmes de gangster da época de um James Cagney ou Humphrey Bogart (décadas de 40 ou 50) sabe que os tipos das tramas são necessariamente violentos. Numa fase de censura rígida, o chamado Código Hayes, onde eram cortados planos até mesmo de exposição da cama de casal e de mulher grávida, as balas não produziam feridas sangrentas, mas não deixavam de mutilar personagens. Cagney desafiou essa postura em obras como “Fúria Sanguinária” (White Heat/1949) de Raoul Walsh. Mas a plateia de hoje sentiria falta de mais grafia na ação. Uma facada no ventre de um figurante ganha plano próximo com direito a muito “ketchup”. E Nicolas Refn prova que esse enfoque não é à toa. O herói, ou vilão já que a postura não torna um tipo imaculado ou sádico, sai dirigindo o seu carro com a mão no ventre cortado por um antagonista. Não exprime dor nem fala qualquer queixa. Como nos filmes em que atua sem deixar nome nos créditos ele, simplesmente, dirige. Se vai ser hospitalizado, se vai morrer, não é possivel saber. O que se sabe é que nenhum plano dá certo (e para ninguém). È como se o driver fugisse de sua mão. E o filme, com isso, foge do clichê e se instala no melhor de um gênero marcado pelo uso excessivo. É a aura de um personagem que instiga a ver um tratamento diferenciado naquele mundo que não parece caótico porque, pela suposição do espectador, a defesa da honestidade profissional interpela os tipos que marcam a personalidade do “driver”.

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