domingo, 19 de agosto de 2012

PELA ESTRADA AFORA

João Miguel e Vinícicius Nascimento em "À Beira do Caminho", de Breno Silveira.

Há cineastas, críticos e espectadores que veem com maus olhos (mas veem) o melodrama. No entanto, é bom salientar, que o gênero é latino por excelência. Somos ligados a um sentimentalismo que nos acompanha de berço em diversas formas de representação artística (música, literatura, teatro, cinema). Em minhas pesquisas observei que em um dado tempo, os filmes mexicanos, quase todos melodramáticos, dominavam o mercado exibidor brasileiro e as plateias já sabiam que os boleros que chegavam, no original, ou em versões nacionais, iriam ter o seu drama nas telas. É significativo “Pecadora”(1948), enorme sucesso comercial, seguindo-se “Palavras de Mulher” (1949), “Hipocrita”(1952) etc. Eu já era “cinemeira” e vi melodramas italianos tipo “Filhos de Ninguém”(1951) e, franceses, como “Amar-te é o Meu Destino”(1952). E a veia latina chegou a atingir a própria Hollywood, com roteiros baseados em livros do gênero (“Stella Dallas” e “Imitação da Vida” são bem característicos).

A maioria dos melodramas filmados fez sucesso nas bilheterias. Mas os críticos, de um modo geral, condenaram os filmes por serem assim, não simplesmente por serem mal feitos. Hoje no Brasil a tradição esvai-se na onda das comédias ditas eróticas como antes era nos musicais carnavalescos. Mesmo assim, tivemos o nosso ciclo de melodramas que em pelo menos um caso me emocionou de verdade: “Em Família”(1970), de Paulo Porto, com base numa peça de Helen e Norah Leary adaptada por Oduvaldo Vianna Filho. A peça havia baseado o filme de Leo McCarey, “A Cruz dos Anos” (Make Way for Tomorrox/1936).

“À Beira do Caminho”(Brasil/2012) é um melodrama nacional deste ano. O diretor Breno Silveira, autor de “Os 2 Filhos de Francisco”(2005) e “Era Uma Vez”(2006) , não é de se “envergonhar” em dizer que faz cinema emotivo. E com um roteiro de Patrícia Andrade, a mesma dos dois filmes citados, conta o drama de um caminhoneiro (o excelente João Miguel) que percorre as estradas do nordeste ao sudeste carregando mercadorias diversas. Em um momento, no Ceará, encontra escondido em seu veiculo um garoto (Vinicius Nascimento, extremamente convincente), órfão de mãe, que busca o pai em S. Paulo, jamais o conhecendo, pois, este abandonou a mulher quando grávida. João, o motorista, reluta em dar carona ao menino, Mas o pedido é insistente e leva-o a aceitar a tarefa, primeiro à uma escala, depois, por ver que uma vez em liberdade o garoto se dispunha a seguir a marginalidade necessária para a sua sobrevivência, sendo melhor levá-lo para o destino sugerido.

O “road movie” exime-se de ser turístico. A paisagem captada pela câmera,  na beira da estrada, é apenas um elemento natural do caminho. Interessa a viagem em si, pois ela é a metáfora da vida do principal personagem. Quem vê o filme não sabe o motivo de sua “cara amarrada”, de sua fala silábica, da razão de “flash-backs” que passam rápido pela narrativa, só gradativamente chegados a uma composição dentro do enredo. Sabe que o homem é fã das musicas de Roberto Carlos. E o filme é apoiado numa dessas musicas. Pena é que o cantor & compositor não tenha liberado a canção-tema, ou a que dá titulo ao trabalho de Bruno. Mesmo assim, composições como “A Distancia”, ”o Portão”, “Amigo” e “Você Foi” fazem a vez.

Sentimental a ponto de fugir do realismo (há muitas coincidências no trecho final) “À Beira do Caminho” é um caminho, sim, para o cinema brasileiro de hoje. Já chega do humorismo chulo. Certo que o tipo de comédia dá dinheiro (“E Aí, Comeu ?” passou de um milhão de espectadores). Mas “2 Filhos de Francisco” também fez sucesso. Se  pelos cantores Zezé di Camargo e Luciano, este novo pode se amparar em Roberto Carlos. Afinal, nada mais próprio para alcançar os sentimentos dos espectadores do que a música. E num “filme de estrada” ela é o caminho.

Podem achar que é pieguice, mas emociona.

4 comentários:

  1. Adorei seu comentário. Tenho um certo incômodo com o tom quase obrigatório de uma parte dos filmes brasileiros, em que o chulo é parte dess tom.

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    1. Oi Cristina, na verdade, concordo, dai dar fôlego a divulgação de uma produção tão importante que mostra um lado humano e ocorrente por estes brasis. Beijão e obrigada.

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  2. Concordo, Luzia. Este é um caminho para o cinema brasileiro.Afinal, somos um povo sentimental. As pessoas têm o direito de não aprovar, mas sentimento, amor, amizade nunca sairão "de moda". Para mim, um bom filme, amparado em um ator de primeira.
    Saudações,
    R.Secco

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    1. Oi Ricardo Secco, sempre fiel nas leituras do blog e acompanhando minhas opiniões. Creio que este filme dá um toque de brasilidade aos fatos que constatamos no dia-a-dia. O deslocar para a arte é que nem sempre é possivel converter numa autêntica obra de denúncia ao desamor, o lado que sempre revela a ansiedade das pessoas pelo afeto.

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