quarta-feira, 13 de novembro de 2013

ASSALTO EM ALTO MAR


Tom Hanks em "Capitão Phillips". 

De um roteiro escrito por Billy Ray baseado no livro, "A Captain's Duty: Somali Pirates, Navy SEALs, and Dangerous Days at Sea”, de Richard Phillips e Stephan Talty, o director Paul Greengrass realizou “Capitão Phillips”(Capitain Phillips, EUA, 2013). O filme foi lançado no Festival de Cinema de Nova York este ano. Um dos autores é o proprio personagem que em 8 de abril de 2009, comandando um navio carregado de contêineres, o Maersk Alabama, foi assaltado por piratas somalis e posto refém quando estes procuraram sair do navio com segurança exigindo dinheiro de resgate.
O comandante Phillips sentiu a morte de perto. E o roteiro do filme espelhou isso, mas naturalmente, precisava de apoio técnico para dar ao público a emoção da historia que o livro relatou em minucias. Para isso a Sony (companhia produtora) contratou o diretor inglês Paul Greengrass, conhecido pelo ritmo dado a filmes como “Supremacia Bourne”(2004), “Ultimato Burne”(2007) e, especialmente, “Vôo United 93”(2006) este com base no trajeto do terceiro avião sequestrado em 11/09/2001 e derrubado por ação dos próprios passageiros.
Na competência que já marcou outros textos, o diretor Grass imprimiu o seu estilo em duas horas e meia de projeção a ponto de o espectador manter-se concentrado durante esse tempo. E o filme tem várias vantagens na área do “thirller”: não evoca um sentido patriótico fatalmente xenófobo, não coloca o personagem como herói de quadrinhos lutando com os adversários, nem endeusa os marinheiros norte-americanos seja pela presteza de atendimento ao sequestro (o público se inquieta com o retardo desse atendimento), seja pelo papel diante dos piratas, sem a pintura simplória de bandidos sanguinários, embora esta marca se revele desde o começo quando os jovens somalis são atraídos pelos chefes em sua cidade.
Se o filme não procura se tornar panfletário, fica estabelecido, entretanto, um parâmetro entre a dimensão do império capitalista norte-americano onde a correção e a normatização de tudo é avaliada pelo Capitão Phillips (cf desde a despedida da esposa, a conversa com ela sobre os filhos e a sua chegada e inspeção ao navio) e o recrutamento dos jovens somalis para “ir em busca de dinheiro no mar”, por chefes armados do submundo do país, mostrando a miséria em que vivem, a estrutura física de cada um, o sentimento de presteza ao serviço. Creio que é essa contrariedade que não deixa o filme cair na lógica da propaganda xenófoba sempre ou quase sempre presente em filmes norte-americanos dessa natureza, mesmo com base no fato real.
O filme ganhou muito com os interpretes. Tom Hanks está em seus melhores dias e possivelmente um candidato e, quem sabe, vencedor de Oscar, a sua terceira estatueta. Mas expressivos são os somalianos Barkhad Abdi (como Abduwali Muse, o lider do grupo) ,Barkhad Abdirahman (Bilai), Faysal Ahmed (Nakeel) e Mahat Ali (Elmi). Esses jovens são atores amadores e foram contratados mediante seleção prévia na própria Somalia. Suas máscaras impressionam. Um close de Barkhad Abdi suado, confrontando Hanks, não só compara a desproporção física entre os dois, mas define um tipo de tortura empregada contra Phillips.
Os detalhes da vida das personagens, como referi acima, tem a ver com a desproporção entre os dois “times em campo”. Da assepsia familiar do Capitão Phillips cujo diálogo com a esposa reflete desânimo na educação de um dos filhos à varredura na área Somália onde garotos esperam algo olhando o mar, comendo capim, miseráveis, à espera de um “trabalho” que vem logo em seguida ao grito de outro capitão, armado, seguro do que quer: dinheiro. Tudo o que é focalizado prende-se à viagem pelo mar africano e o ataque em alto mar. Sabe-se também que os marinheiros, como o comandante, não portam armas. Ficam a mercê dos atacantes que falam arrastamente o inglês.
A limitação do campo de ação lembra o que Cuaròn aplicou em “Gravidade”. Nada além do que se encontra numa situação desesperadora. E Greengrass pinta de forma exemplar esta situação usando com propriedade a câmera manual e os closes. Além da fina crítica ao mundo capitalista. Um filme que prende a atenção e ganha elogios espontâneos. Imperdível.



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