sábado, 17 de outubro de 2009

O PREÇO DE UMA VIDA

Pedro Veriano se apossa do titulo que deram no Brasil a um excelente filme de Sir Carol Reed e trata de “Uma Prova de Amor” de Nick Cassavetes, o que de melhor ele acha que viu esta semana. (LMA)





Muitas vezes, ao ler comentários de críticos atuais, pergunto se “é pecado” deixar-se levar por filmes sentimentais. Será que o fato de surgir uma lágrima na sala escura é atestado de fraqueza? Acho que não. As imagens que conseguem passar pela nossa retina, chegar ao cérebro, incitar resposta para as glândulas lacrimais, são, de alguma forma, importantes. Querem uma resposta mais cética? Pensem na introdução de “Um Chien Andaluz”. O homem amola a navalha e depois de um plano da lua sendo encoberta por uma nuvem ele segura as pálpebras de uma mulher e com a mesma navalha corta-lhe um dos olhos no meio. Contando por palavras é uma coisa: vendo é um impacto. Em cursos de cinema eu vi alunos abaixando a cabeça. Daí se valorizar a correspondência emocional Nos 50 os melodramas mexicanos, italianos e os norte-americanos de Douglas Sirk eram violentamente atacados por serem “saca lágrimas”. Hoje Sirk é tido como um gênio. Foi preciso que um cineasta alemão, Werner Fassbiner, promovesse o colega. Mas há um detalhe a considerar: a emoção nasce de uma estrutura cultural. As respostas variam com o cabedal de conhecimento que cada um possui.


Em “Prova de Amor”(My Sister’s Keeper) o diretor e co-roteirista Nick Cassavetes conta o drama de um casal que tem uma filha leucêmica e sem encontrar doador de medula óssea compatível para um tratamento resolve “produzir” uma criança que venha a socorrer a doente. Nasce Anna, e desde a sala de parto passa a ser cobaia da irmã (do cordão umbilical tiram células-tronco, logo que pode extrai medula óssea dos quadris, e assim vai até chegar à possibilidade de doar um rim, pois a mana entra em insuficiência renal como prova de que o tratamento não está dando resultado e a morte é iminente). Nessa altura a garota, então com 11 anos, procura um advogado para processar os pais. Quer “autonomia de corpo”. Justo, mas discutível pela idade da proponente. Fato de que se serve a mãe dela, uma advogada em recesso para tratar da filha, que não concebe uma atitude desse tipo partindo da pessoa que nasceu para dar, não para ter.

O tema é interessante e nada tem de piegas. Mas o roteiro abre espaço a filigranas românticas quando focaliza a doente. E mais: pensa que a atitude da irmã menor é muito cruel e aponta um pacto dela com um irmão mais velho (incompatível para tratar a irmã que lhe seguiu em nascimento) e a própria enferma como causa do comportamento considerado precoce. Mesmo passando uma luva por cima da crueldade do drama o filme não desmerece lágrimas e certo entusiasmo. Hoje a ciência aponta caminhos para doenças até então consideradas incuráveis. Mas o roteiro não quer ser cientifico, embora afirme que tratamentos nem sempre se mostram eficazes para muitos males. Leucemia, por exemplo, não tem uma só forma. São vários tipos. E o transplante de medula óssea só dá resultado em um tipo.

Claro que o filme não se limita a um caso clinico nem quer ser um apanhado introspectivo dos comportamentos de mãe e filhos. É um drama familiar coerente que se trata de forma simples, apenas com alguns “flashes backs” e alguns enquadramentos para os que querem pensar mais um pouco vendo as imagens (o caso da demora de sair de um plano, especialmente quando se focaliza uma porta aberta, recurso de edição que pode dizer da batalha pela vida simbolizada na abertura parcial que se espera de um tratamento).

O triunfo maior chama-se Abigail Breslin e Sofia Vassileva. A primeira, que faz a reclamante, foi vista em “A Pequena Miss Sunshine”. A segunda brilha pela primeira vez. Essas meninas dão um banho de interpretação e ofuscam veteranas como Cameron Diaz (a mãe). Dirigindo-as (e eu sei o que é dirigir criança) Nick Cassavetes prova o quanto sabe de seu oficio.

A meu ver um filme, como diziam os velhos cineclubistas, “rigorosamente bom”. Se faz chorar, paciência. Por mais que mostre que a morte é um natural processo da vida não há quem não sinta a falta de uma pessoa querida ou que tema a sua própria falta. Sensibilizar-se com esse tipo de drama é mostrar-se humano. (Pedro Veriano)



Um comentário:

  1. Grande Pedro Veriano, sou um chorão de primeira, nosso amigo Ronaldo Passarinho está de prova. Até quero dar uma espiada na nova obra do filho do genial Cassavetes,gostei de "Diário de uma Paixão". Mas o que martela na minha cabeça no momento é ver o novo Tarantino. Apenas prioridades.

    Abraços.

    Aerton Martins(Mark)

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