terça-feira, 6 de outubro de 2009

DÉLICE PALOMA






O cinema argelino era até bem pouco tempo absolutamente desconhecido de nosso público. Agora, graças à cinemateca da Embaixada da França, chegam alguns títulos dessa fonte, a maioria alcançada em sistema de co-produção com franceses.
“Delicia Paloma”(Délice Paloma/Argélia França, 2007) tem direção e roteiro de Nadir Moknèche. A cena inicial enfoca a liberação de uma prisioneira. Em poucos planos vê-se a revista pelas guardas, a entrega de pertences que estavam guardados na prisão, e a desolação à saída, com a câmera descobrindo um automóvel e os poucos passageiros, no caso amigos da ex-prisioneira.
Desse entorno, passa-se a aspectos de novas seqüências e surge a identificação da ex-presidiária: trata-se de Madame Adjeria (Biyouna), nome de guerra de Zineb Agha, cafetina muito conhecida em Argel e bastante esperta para não restringir o seu oficio na administração de uma casa de tolerância. Adjeria tem uma “especialidade”: arma escândalos entre casais para extrair flagrantes de infidelidade, a exemplo, o caso de uma mulher que deseja a separação do marido. Na incerteza da infidelidade deste, mas considerando o lance jurídico para apená-lo e extrair bom lucro da separação, o evento é montado a partir de uma jovem interiorana que foge da família em busca de trabalho na cidade. A beleza e a forma de seduzir conseguem institucionalizar a intriga matrimonial.
Para Rachida (Aylin Prandi) o que está na conta não é somente a sedução ao “freguês” mas também ao jovem Daniel, filho de Adjeria e parceiro da mãe no escritório das transações ilícitas. E isso leva à descoberta das artimanhas e à prisão da mulher.
Como “Povoado Numero Um” (exibido semana passada), “Wesh Wesh”, “O Segredo do Grão” e outros lançados no ano passado, “Delicia Paloma” detêm-se no aspecto documental, focalizando a Argélia de hoje, já distante do tempo em que foi possessão francesa. Em “Povoado...” e “Wesh...”, por exemplo, uma mesma personagem faz o liame de ficção e pesquisa antropológica, detendo-se em tipos peculiares, música, costumes e “décor” especifico. Para isso os grandes planos abundam e deixam ver a região árida, as casas de pedra, as feiras livres, a matança de animais, a posição dos argelinos diante da situação dos franceses (ou europeus de um modo geral).
O tipo de cinema não ganha muitas alterações no trabalho de Nadir Moknèche. O que se salienta são alguns tipos. A esperta Adjeria é uma criação muito interessante da atriz Biyouna. O tipo físico nada esbelto é realçado por planos próximos e contrasta com as suas “contratadas”, partindo da secretária mais ativa, Sherazade ou Zouina criação de Nadia Kaci a lembrar a personagem de “As Mil e Uma Noites” e, principalmente, Paloma, uma beleza oriental escolhida como a peça que vai destruir a organização criminosa de encontros forjados.
O roteiro escapa do clichê romântico mesmo com um final em que se coloca um liame poético, mas não poupa a vilã da história, embora se atente para o fato dela ser uma das figuras que luta por um espaço numa sociedade onde se dificultam oportunidades a quem deseja emergir de uma rotina que ainda apresenta resquícios de colônia. Mas é através dessa figura que se delineia uma feição moral da temática, ou seja, apesar da situação de Adjeria, ao sair da prisão, ser lamentável, com os amigos se afastando, ela não parece estimulada a mudar de vida. Só não continuará a armar novas arapucas aos incautos se não tiver chance para isso.
Aos interessados em conhecer uma cinematografia diferente, e através dela informar-se sobre uma cultura pouco divulgada no mundo ocidental, que assistam ao filme-como aos outros da mesma fonte. Os franceses, na divulgação do mundo argelino, procuram redimir um passado e mostrar um cenário que dominaram em um tempo sem conseguir transformá-lo.
Cotação : (***) Bom.




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