quinta-feira, 2 de junho de 2011

O PODER E A LEI












O livro de Michael Connelly que deu origem ao filme “O Poder e a Lei” (EUA, 2011, 118 min.), “The Lincoln Lawyer”, já foi lançado no Brasil e recebeu o título de “Advogado de Porta de Cadeia” (publicado pela Editora Record). A direção é de Brad Furman, com roteiro de Johnny Romano, que deram um tratamento de “thriller” ao chamado “filme de tribunal”. Esmiuçam a atividade do advogado de “porta de prisão”, Mick Haller (Matthew McConaughey), cujo escritório é dentro de seu carro, um Lincoln (daí o nome original), a procura de clientes, especialmente os que possam pagar bem, mesmo que o dinheiro venha de gangues ligadas ao tráfico de drogas.
A rotina pouco elogiosa de Mick muda quando ele lhe indicam e aceita defender um “mauricinho”, Louis Roulet (Ryan Phillippe), de familia rica, detido por espancar uma prostituta. É desse caso que se desenrola toda a construção do perfil do tipo, advogado com poucos principios éticos, usando as artimanhas dos bastidores do sistema judiciário do qual é um dos membros. E se o esperto causidico vai conseguir livrar da cadeia seu cliente, usando das incoerências desse sistema, percebe a fragilidade da promotoria ao evidenciar a identificação das provas contra a vítima, contudo, vai enfrentar denúncias substantivas sobre delitos cometidos pelo seu proprio cliente. Daí porque sofre na pele o assassinato de seu ajudante, o detetive Frank Levin (William C. Macy), descobridor dessas provas que atestam mais de um crime cometido pelo réu.


Se o principio da confidencialidade entre advogado e cliente serve ao silêncio no momento da defesa sobre os fatos que parecem incriminar o réu, os arranjos para levar a procedimentos ardilosos após o julgamento subscrevem a nova faceta que o advogado vai planejar para sair da trama que o levou a arbitrar, seguindo sua própria consciência, uma defesa incontestável ao cliente. O paradoxo entre estar sendo ludibriado e as questões morais que o desviaram para o outro lado da linha de defesa embora pouco comum entre certos profissionais do Direito se tornam, na verdade, o eixo de argumentação para as novas diretrizes de Mick .


Na narrativa, observa-se a preocupação do diretor em usar “closes” em profusão num enquadramento panorâmico. A idéia é de perseguir dimensionando a índole de seus personagens, especialmente de Mick. Há detalhes de rugas e de olhos, denunciando opções que os tipos tomarão na luta surda que se trava antes e durante o júri popular (e no caso também depois).


O filme possui uma linguagem dinâmica. A parceria entre o advogado com o amigo condutor do seu carro-escritório é demonstrativo de que este se envolve no caso, ou nos casos em andamento. Um exemplo é a frase do motorista ao amigo-patrão: “-Eu arranjei o que o senhor pediu” (e entrega-lhe um revolver). O espectador supõe que a arma vai servir para matar o cliente assassino. Não será bem assim. O filme não fecha suas tramas e com isso não furta o espectador de raciocinar em torno dos fatos. Há sempre uma surpresa. Mesmo para quem está acostumado com os subgêneros (filme de tribunal e policial) essas surpresas não parecem tão enfáticas.


Matthew McConaughey há muito não ganhava uma chance de mostrar seu talento. Compõe muito bem o tipo do advogado ambicioso, mas astuto a ponto de saber quem mente para ele e quem está livrando das grades quando merecia estar por trás delas. Aliás, todos os atores se comportam dentro do esquema traçado pelo roteirista. Chamo a atenção para William H.Macy. Outra vez interpretando um tipo “estranho” a partir da maquilagem, como o que protagoniza em no teleplay “De Porta em Porta”(Door to Door, 2002, 90min.), onde interpreta um tipo que nasce desfigurado e se torna um exímio vendedor graças à sabedoria em vencer os entraves físicos.
No meio de tantos programas de rotina, sem inventiva, “The Lincoln Lawyer” surpreende. De baixo custo teve uma audiência considerável no fim de semana na sua área doméstica.


“O Poder e a Lei” apresenta nuances temáticas que devem ser debatidas. Por exemplo, a situação do “heroi” norte-americano médio e a questão da prostituta entre provas e contraprovas no tribunal. Isso merece uma abordagem específica.

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