terça-feira, 4 de fevereiro de 2014

NINFOMANÍACA – PARTE 1




A estrutura narrativa de “Ninfomaníaca 1ª Parte”(Ninfomanic I, Dinamarca, 2012) dá-se a partir de uma conversa de um homem solitário e percebido como intelectual, Seligman (Stelllan Skarsgard), com Joe (Charlotte Gaisnbourg) mulher que ele encontrou na rua, seriamente espancada. Ele se parece a um psicólogo, ouvindo e opinando sobre o que ela fala. E passa-se a acompanhar a odisseia de uma menina que desde cedo “descobriu o seu órgão sexual” e que aos 15 anos já praticava sexo, a principio por desejar acabar com a virgindade, depois, apostando com uma amiga de que consegue fazer sexo com o maior numero de homens numa viagem de trem. O premio é um saquinho de chocolate.
Joe se define uma ninfomaníaca. O seu ouvinte passa a comparar suas proezas com coisas que parecem distante. Primeiro é com uma pescaria usando de isca uma mosca. Mas, de todas as comparações, a que salta para o terreno da poesia é uma composição de Bach. O ritmo da música entra na porfia sexual de Joe e praticamente a define.
Ninfomania é um termo derivado das palavras gregas (nymphe/moça)  e (mania) "loucura". Na mitologia grega as ninfas e sátiros eram espíritos da natureza de sexualidade exacerbada. Na area médica é considerado um vicio, ou um transtorno sexual que se caracteriza pelo elevado nível de desejo e atividade sexual chegando a causar prejuízos na vida pessoal.
O filme do cineasta dinamarquês Lars Von Trier (de “Melancolia”) não é, como a publicidade faz ver, um desfile de coitos. Além de cenas realmente de sexo, aparentemente explicito, há um quadro de solidão que sistematiza a psicopatologia alertada pela própria “doente”.
Joe não teve uma boa infância, não teve quem a ajudasse na adolescência e a quem realmente amasse. O sexo passou a ser uma ginástica sem prazer. Poucas vezes ela afirmou que sentiu orgasmo. Na maior parte dos relacionamentos é uma porfia que participa como um desafio orgânico.
Certa vez ela recebe o afeto de um homem casado e este afirma que pretende deixar a esposa para viver a seu lado. Logo ele surge afirmando que fez isso. E surge a esposa com 3 filhos dando margem à sequencia marcante em que a mulher (Uma Thurman  excelente) empurra os filhos para diante do pai e depois os retira bruscamente. Não adianta Joe dizer que não ama o personagem. E certamente não vai ficar com ele. Mas a mulher sai do quarto com os meninos sem dar atenção.
O drama de Joe passa por um jogo e eu lembro a frase de Alfred de Musset “on ne badine pás avec l’amour”(nao se deve brincar com o amor). O filme define bem a diferença entre amor e sexo. Joe quer sempre ser amada, mas não encontra essa correspondência nos homens com quem se deita. A comparação com a música de Bach é um momento alto em termos de criatividade. Prova de que Von Trier não quis (só) escandalizar. Há conteúdo no desfile de posições de relacionamento físico.
Como feminista, não é possivel considerar que esse tipo narrativo do diretor dinamarques não tenha seu acúmulo cultural em situações que sistematicamente concentraram na mulher as linhas do “despudor” por comportamentos que a retiram do quadro aceito socialmente de que é “des-sexualizada”. Se o cinema já tratou tanto desse “estado doentio” da mulher, de “sentir prazer no sexo”, não conheço filme que trate do outro gênero sendo acusado de compulsão masculina doentia, a satiríase. Mas, o que emerge quando esse gênero traduz a sua sexualidade exacerbada é que ele é “macho”, a virilidade esperada do homem. Não se pode deixar de dizer que Trier assume no filme um estereótipo sobre as mulheres.
Trier é um cineasta irrequieto (para dizer o mínimo). Depois de um ótimo filme de linguagem acadêmica como “Europa” enredou por experiências formais que chamou de “Dogma”. Consistia em filmar sem cuidados técnicos, inclusive com montagem direta. A câmera era geralmente manual e a direção de arte chegou a escrever no chão (“Dogville”) as casas e ruas por onde se passa a historia.
Para o diretor, cinema deve ser diferente do usual. Longe das “novas ondas” fazia a sua própria “maré” desimportando-se das plateias. Isso se exauriu depois de trabalhos que também chegaram a colegas. Agora faz cinema formalmente tradicional. Mas só na forma. “Ninfomanica” foi realizado para incomodar e tem uma segunda parte a sair mês próximo por nossos cinemas.

Um comentário:

  1. O filme é excelente,, como bem disse um amigo meu, vai ale´m das já famosas cenas de sexo, percebi na personagem Joe, um certo complexo de Electra, ou seja ela nutri pelo pai um certa paixão desde de criança é sua relação com a mãe é conflituosa, dai pode ter surgido a compulsão sexual dela que da titulo ao filme, por não poder ou não querer realiza essa paixão que sente pelo pai, , procure em outros homens essa realização, e de certo modo encontra no Jerome. Outra coisa me chamou atençao a sessão quase lotada para o horário do filme 22;10 e para uma segunda-feira, percebi que muitos ali estavam mais interessados nas tão faladas cenas de sexo, mas isso por lado é bom pois atrai um publico não muito acostumado aos filmes do Lars von Trier e de outros cineastas tidos como diretores de filmes de arte.

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