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quarta-feira, 28 de julho de 2010
O BEM AMADO
Telenovela da Rede Globo em 1973, série exibida entre 1980-1984, peça de teatro, “O Bem Amado”, de Dias Gomes, ganhou acolhimento de uma platéia que respirava fundo pela redemocratização do país e procurava pelas brechas na censura ditatorial. Aliás, muitos se perguntam como a novela conseguiu ser transmitida quando ainda vigorava o governo militar. Talvez porque Sucupira, a cidade-símbolo da corrupção em território nacional, fosse mostrada num passado democrata. De qualquer forma, era divertido ver a caricatura cultural mexendo com o modelo do “Brasil-Grande” vendido nos anos 1970.
Hoje, “O Bem Amado” (Brasil, 2010, 107 min.) ganha um filme de longa-metragem com direção de Guel Arraes (filho do conhecido político e ex-governador de Pernambuco Miguel Arraes, banido pela ditadura), cuja filmografia registra títulos premiados como “O Auto da Compadecida”(2000) adaptado da peça de Ariano Suassuna (da mesma forma vindo de um sucesso na TV e nos palcos), “Lisbela e o Prisioneiro (2003), entre outros. É também conhecido diretor de televisão, de grande sucesso.
A adaptação para o cinema de 2010 fez muitas mudanças. Basta lembrar as personagens que formam o grupo das Irmãs Cajazeiras. Antes três beatas reforçando o fator religioso presente na cultura e nos “bons costumes”, surgem como três “dondocas” extremamente caricatas. Também aposta num romance proibido para conseguir a simpatia de uma platéia jovem que certamente nem era nascida quando a história surgiu na telinha. Há um Romeu na pele de Caio Blat, o jornalista Neco Pedreira do órgão opositor ao governo da cidade de Sucupira, o jornal “A Trombeta”, que namora uma Julieta, ou seja, a Violeta ( Maria Flor), filha do prefeito Odorico Paraguaçu.
As inclusões na adaptação contemporânea do fato político que a peça e a telenovela queriam criticar, do contexto original, prejudicam o filme. Os bons atores em cena, especialmente Marco Nanini, que protagonizou Odorico Paragaçu no teatro, estão envolvidos na opção de Arraes que passou pela sátira política e enveredou firme pela chanchada típica. Esse gênero tem raízes nacionais profundas e manteve um mínimo de cinema industrial no país em passado distante. Mas não seria o caso de usar esse método na roupa nova da trama nem seria o reforço para fazer de “O Bem Amado” um programa igualmente amado pelos mais jovens (os mais velhos simplesmente perdem a paciência com a “re-novação”).
Muito falado (ou gritado), a raiz teatral ganha força, pois as seqüências de ação são mínimas. E constrangedoras. No momento em que se filmam protestos populares observa-se o cuidado em esconder os extras que parecem brincar adiante das câmeras, alguns não conseguindo deixar de rir da situação que lhes é pedida como reivindicatória, ou potencialmente zangada. Mas não é por aí que escorrega o filme. Nem pela inevitável comparação com o que se fez no passado. A idéia de extrapolar as atitudes, de gritar como no palco, de usar de recursos cênicos para fazer comédia, isso no cinema gera aversão de quem espera outro tratamento ao trabalho de Dias Gomes. Todos, na verdade, esperam por uma crítica à corrupção eleitoral que inclusive suscitou a criação da lei do “ficha limpa”. Mas o filme joga toda a política brasileira num “saco de gatos”.
E o pior: o epílogo gera um estranho final. Fazendo um contraponto com a História, intercalando cenas de documentários mostrando o governo João Goulart e depois a fase dos militares, Arraes encerra depois do movimento “Diretas Já!”, vale dizer, da redemocratização e, distanciando a câmera deixa ver o globo terrestre e o Brasil com o nome de Sucupira. Entende-se com isso que as trapalhadas de Paraguaçu, a autoridade municipal que tinha como meta de governo, primordialmente, a construção de um cemitério & o uso dos recursos públicos de forma corrupta, é coisa do regime democrático. No tempo dos militares não tinha disso. Dias Gomes não gostaria de saber dessa interpretação.
Um tropeço grande. A produção espera que seja um sucesso de bilheteria a seguir “Chico Xavier” e “Se Eu Fosse Você 2”. Pelo visto na sessão em que estive, vi pessoas saindo antes do final. O filme deve estar sendo mal amado. Infelizmente.
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