quarta-feira, 25 de maio de 2011

UM LUGAR QUALQUER
















A sequência inicial do novo filme de Sofia Coppola “Um Lugar Qualquer”(Somewhere/EUA,2010) é de um grande plano fixo, tomado de uma estrada, acompanhando repetidas vezes a passagem de uma Ferrari preta fazendo círculos em velocidade cortando um deserto. O som é apenas do motor do carro. Esse plano é de grande duração com um significado que será delineado ao longo do filme. Segue-se num quarto de hotel uma sessão de dança de duas jovens ou o que se queira ver como “bailado sexy” (pole dance) amparadas numa barra de alumínio. As jovens atendem a um cliente ilustre: o ator de cinema Johnny Marco (Stephen Dorff), que vive num apartamento do Chateau Marmont, um dos mais luxuosos de Hollywood. O roteiro da própria diretora visa retratá-lo em sua solidão. Longe da esposa, Layla (Lala Sloatman), passa o tempo todo no ócio patrocinado pelo dinheiro do estúdio que o contrata e nos encontros profissionais que vão de entrevistas coletivas a viagens promocionais onde seu novo filme estréia.

A convivência imprevista com a filha de 11 anos, Cleo (Elle Faning), que o procura e passa a morar com ele, quebra a rotina vazia a qual Marco já se acostumara, seguindo-a nas sessões de balet no gelo. No inicio, um tédio para ele, mas ao fim, se transforma numa surpresa, encantando-se com a leveza da filha, sendo isso novidade para ele. Leva-a consigo aos quatro cantos por onde é obrigado a ir, mas numa sincronia com as qualidade que ela mostra naturalmente, cuidando do pai, impondo uma nova vida a ele. O tom pausado da câmera traduz-se numa versão emblemática de um jovem ator que é endeusado e “paparicado” pela mídia, mas que pela fisionomia parece ser obrigado a viver dessa forma. Não há clichês mesmo apresentando certas sequencias que traduzem uma violação à inocência da filha (chafé da manhã com a amante), mas pelas expressões dos três personagens destaca-se em momentos discretos e como se fossem um lugar comum para Cléo.

Retratar vazios depressivos é sempre um desafio do cinema. Antonioni foi um mestre nisso. Suas personagens solitárias caminhavam pelas ruas com a câmera perseguindo-lhes os passos. Nisso estampava o que na literatura consumia laudas e laudas de definições quase clinicas (ou respostas filosóficas). Num filme, seguindo a noção de que “uma imagem vale mais do que mil palavras”, um close de um personagem basta para dizer o que ele está sentindo. Claro que isso pede muito de um ator e mais ainda de quem o dirige. Além do fato de outros recursos para dimensionar o vazio que cerca um tipo, sejam os planos demorados como faz Sofia Coppola, seja a amplitude desses planos (o close é geralmente “inimigo” disso pois quer dizer “aproximação” e, no caso, a aproximação invalida a amostragem de um todo, da gênese de uma expressão triste).

“Um Lugar Qualquer” ganhou o Leão de Ouro do Festival de Veneza e foi muito discutido desde então. Obviamente não fez sucesso de bilheteria. É o que se chamava de “filme de arte”, com o único propósito de agradar quem pensa cinema mais do que uma simples diversão. No caso, lembra o que está nas telas da cidade, “Minha Versão do Amor”(Barbney’s Version) onde Paul Giamatti protagoniza um solitário explorando de todas as formas o que possa definir o que sente.

Sofia andou desagradando os críticos com o seu “Maria Antonieta” que a meu ver é muito criativo ao mostrar uma imagem jovem da rainha condenada pela Revolução Francesa. Neste novo filme, ela retorna ao tema de seu ”Encontros e Desencontros”(Lost in Translation/2003), até pelo fato de tratar de gente de cinema. Sentindo-se a vontade, mesmo por ser filha do famoso Francis Ford Coppola, a diretora trata do que sabe, de seu meio, de sua classe, de problemas íntimos que se não sente deve conhecer quem sinta. E parece sincera na sua exposição. Seqüências extensas, planos demorados, pouquíssimos movimentos de câmera, economia de diálogos são artifícios para explorar os sentimentos de seu personagem.

O filme é lento, a linha da história é o que ela mostra em imagens. Mas cinema de criação é sempre desafio. E Sofia volta a desafiar. Melhor saber que ela se interessa mesmo pela criatividade


















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