Os casais em "pé de guerra" para a maternagem. Chanchada.
O que
difere “Solteiros com Filhos”(Friends with Kids/EUA, 2012) das pornochanchadas
nacionais? É difícil saber. A fórmula é a mesma em termos de construção de um
roteiro, passando pelas falas e chegando ao processo narrativo via de regra
acadêmico. Em termos históricos, esse gênero cinematográfico ocorreu em tempo
datado, no Brasil, quando, nos anos 70, a censura proibia e cortava tudo o que
achasse, segundo os seus próprios dizeres, “atentado à moral e aos bons
costumes”. Com isso, os cineastas eram obrigados a suprimir planos de filmes, a
exemplo, o clássico do nosso cinema-novo “Macunaíma” que recebeu quase 30
cortes. Para ter uma ideia da situação, foi exigido um corte numa cena de uma
personagem que usava uma blusa com o logotipo do programa norte-americano
“Aliança Para o Progresso”. Essa mostração seria, no entender do censor, um
“desrespeito aos nossos amigos estadunidenses”.
Mas voltando à chanchada americana: na comédia
escrita dirigida e interpretada por Jennifer Westfeld (4 vezes premiada,
especialmente por sua atuação em“Beijando Jessica Stein”, 2001, onde ela também funcionava como roteirista), o
humor, com diálogos chulos, vem da incapacidade, ou temor, de homens e mulheres
da classe média americana em constituir família. Preferem morar separados e se
encontrarem periodicamente para o sexo. Nesse programa de vida, a ideia de ter
filhos é uma aventura. E parece divertido, vendo, pelo menos, um amigo que se
“arriscou”a isso, “produzir” um bebê e passar pelas “novidades” de trocar
fraldas, aturar choro, dar de mamar, enfim, tomar conta de uma vida que no
dizer do homem da história “é burra, ainda não sabe das coisas” (numa cena em
que o bebê chora no colo da mãe e se aquieta com o pai).
O filme
seria um enquadramento de vida em uma cidade como Nova York, nos tempos atuais,
como se desenrolava na época do cinema neorealista. Quem conhece a chamada “Big
Aple” deve achar a trama mais engraçada pelas referências a bairros como o
Brooklin (a moradora do centro diz que detesta ir ao Brooklin embora o namorado
reflita que é Manhattam) e/ou a outros aspectos que são referidos. Para os
espectadores de outra cultura, como os brasileiros, evidencia-se o enredo em si
e, especialmente, a falta de jeito em tratar crianças pequenas, além do modo de
encarar o cotidiano com a criança e a rotina que se estrutura num
dimensionamento de afastamento entre os pais.
Mas o
roteiro poderia ser menos verbal (fala-se muito), e menos vulgar. Afinal, ele
deixa um conceito de personagens que se iguala a de outras pretensas comédias
românticas atuais como “Juntos por Acaso”, “Amizade Colorida” e “Sexo sem
Compromisso”. O tom cômico que é pretendido passa por cima do traquejo dos
novos pais e cai na porfia sexual que se discute a todo tempo. Seria esta a
única forma de fazer rir no cinema de Hollywood depois de abolido o Código Hays
e os filmes abrirem espaço para assuntos antes vetados sistematicamente. Aos
que não têm idéia desse código, ele mantinha uma censura tão rígida quanto a
nossa, no período da ditadura, valendo até proibições às imagens de cama de
casal, de mulher grávida, de vaso sanitário, de sangue em qualquer tipo de
ferimento e de palavras que abrigavam até mesmo termos como aborto e fezes.
“Solteiros com Filhos” inaugurou
entre nós o Cine Materna, experiência bem sucedida no sudeste onde as mães
podem ir com seus filhos pequenos quando não têm nenhuma condição de deixá-los
em casa. O que está em jogo, nesse programa, é a socialização continuada da mãe
que durante meses se retrai em casa para cuidar do bebê. Com essa iniciativa,
as condições do lazer da mulher com filho pequeno se processam e ainda alcançam
o pai que passa a se incluir no grupo. Interessante idéia que deve ser
continuada, nos cinemas da Cinépolis, em cada última terça feira do mês.
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