sexta-feira, 26 de março de 2010

O FANTÁSTICO MR. FOX




As fábulas sempre encerram com um preceito moral. Até porque elas guardam a dicotomia Bem e Mal com a vitória sempre e sempre do Bem. O filme “O Fantástico Sr. Raposo” (The Fantastic Mr Fox/EUA,2009), animação quadro a quadro(stop motion) de Wes Anderson, com base no livro homônimo de Roald Dahl, foge à regra. Não sei se somente no cinema, pois desconheço o livro. Mas em se tratando do diretor de “Os Excêntricos Tenenbaums” isto é possível.
Anderson é um dos diretores modernos adorados pela critica contemporânea. Razões não faltam para isso. O seu cinema prima pelo inconformismo. Os tipos não são moldados nos padrões de herói e heroína. São figuras que o tradutor brasileiro de seu titulo mais conhecido chamou de “excêntricos”. Dessa forma, nada de espantar ver uma raposa jornalista, conhecedora do que é certo e do que é errado (ou o que seja politicamente correto e incorreto), tentar viver numa toca “de luxo”, como bom burguês, e, mesmo assim, continuar caçando galinhas, perus e patos. Vale relembrar a história contada por Orson Welles do escorpião que pediu carona para um sapo ao atravessar um rio. No meio do caminho, apesar de ter prometido se comportar, o escorpião pica o sapo. Este reclama de um contrato feito antes, mas o escorpião diz que não pode ir contra a sua natureza. É assim que o Sr. Raposo (no original a voz de George Clooney), apesar de prometer à companheira que irá deixar em paz a criação dos fazendeiros, reincide na caça às aves. E nessa operação leva os parentes, incluindo um filho único, mudança que Andersen fez no livro original que cita uma ninhada.
Os nomes dos fazendeiros atacados por Raposo são Boque, Bunco e Bino. No original eles geram versinhos cômicos. Todos são vistos como homens e os tipos moldados no arquétipo do patrão despótico (baixo, gordo, mal humorado). Eles engendram diversas armadilhas para as raposas. Mas a esperteza dos animais é desafiadora e nisso resta uma das características primordiais da obra: não há mocinhos perfeitos. O Sr. Raposo é ladrão de galinha. O filho e sobrinho também são ladrões de galinha. Só a senhora Raposo é vista como uma dama bem comportada, preferindo que o marido deixe a vida de caçador em galinheiro e se torne apenas o colunista do jornal dos bichos, além, é óbvio, de um comportado pai de família (no fim do filme ela está esperando outro animalzinho).
A ironia que preside o roteiro do próprio diretor associado à Noah Baumbach, está presente na própria condução muito simples da história, como se o cinema estivesse contando uma fabula. Mas a malicia agarra o interesse e a família Raposo passa a ser alvo da simpatia do espectador que se estivesse na pele dos donos das aves estaria caçando esses bichos.
A animação “stop-motion” é muito antiga, tendo servido à primeira versão de “King Kong” (1933) pela mãos do mestre Willis O’Brien. São bonecos de massa fotografados quadro a quadro. Hoje, quando se faz o gênero digitalmente, é uma ousadia que se prende à criatividade do autor ou autores. E se vê na obra de Wes Anderson que a fauna de figuras “diferentes” persiste num gênero antes afeito apenas ao público infantil. Passar desses tipos para a animação é uma criatividade intelectual ousada. E valeu. O filme é muito interessante a agrada a crianças e adultos, os primeiros deixando-se levar pelas personagens e situações, enquanto os segundos pela originalidade com que eles são apresentados.
Cotação: *** (Bom)

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