terça-feira, 14 de outubro de 2014

LIMITE, EM TELA GRANDE

 Cena de "Limite", de Mário Peixoto.
A restauração de “Limite” (1930), a obra (única) de Mário Peixoto, foi submetida a uma série de obstáculos a partir do abandono a que o filme foi legado depois de seu lançamento (assim mesmo restrito). Mas conseguiu ser recuperado nos anos 1960 acompanhando o processo de restauração através da produtora e funcionária do INCE, Myrce Gomes Rocha (a segunda esposa do professor Plinio Sussekind Rocha. Myrce esteve em Belém produzindo o documentário “Waldemar Henrique Canta Belém”, de Miguel Faria Jr. em 1978). Recentemente, o filme foi restaurado pela Cinemateca Brasileira e a nova versão foi apresentada em novembro de 2011 no Auditório Ibirapuera em São Paulo, na ocasião com  uma trilha sonora, composta pelo norueguês Bugge Wesseltoft. Esta cópia deve ser apresentada hoje, 14/10, no cinema Olympia compondo o programa “Cinema e Música” visto ser acompanhado de uma trilha musical tocada ao piano pelo Professor e Superintendente da Fundação Carlos Gomes, Paulo José Campos de Melo.
“Limite” é um filme lendário. O autor (e cabe o titulo, pois tudo é dele) tinha 22 anos e depois de escrever a historia pensou em contratar o cineasta Humberto Mauro para a adaptação, a quem chegou a procurar. O diretor de “O Canto da Saudade” disse que o melhor seria o próprio Mario dirigir. E ele seguiu o conselho. Mesmo porque ninguém teria a coragem de expor uma linguagem surrealista com base na forma dos filmes soviéticos de autores como Eisenstein e Pudovkin.
O trecho a seguir é do site  http://www.mariopeixoto.com/limite.htm:  “As cenas do barco em Limite podem evocar paralelos com Aurora (1927), o primeiro filme americano de Murnau, e também as cenas de gritos revelam algumas similaridades. Os campos e plantas em movimento podem evocar reminiscências a Terra (1930), de Alexander Dovzhenko, e, obviamente, pode-se mencionar uma enorme variação de movimentos e ângulos da câmera como uma exploração do próprio medium filme.”
No filme quase não há uma trama. São duas mulheres e um homem em um barco à deriva, no  oceano. Isso, digamos, é a parte “material” do filme. Na verdade o que interessa é o estado de espírito desses personagens. Logo se vê a mulher acorrentada. Ela exibe os pulsos amarrados para a câmera. E há uma profusão de closes, com expressões de angústia que se pode querer ver como a situação de naufrágio. No caso é, sim, um naufrágio, mas anímico. O titulo não é à toa: chega-se ao limite de cada personagem, o que eles sentem e querem se libertar.
Orson Welles elogiou o filme. Quando o Cine Clube APCC o exibiu no Grêmio Português, nos anos 1970, foi como um enigma para a plateia. Esperava-se um filme mudo na linha tradicional, com uma história a contar e muitos intertitulos explicando o que se passa. Isso não acontece com “Limite”. Quase não há letreiros entre cenas. Surge na brilhante fotografia de Edgar Brasil o esforço de atores como Olga Breno, Tatiana Rey e Raul Shonoor.Suas personagens não tem nomes: apenas Mulher 1, Mulher 2, Homem 1. E a montagem desafia a época na assincronia de sequencias. Longe de Peixoto a linguagem linear, mesmo se pensasse em expor um sonho. O que ele pretendeu foi que a imagem faça sugerir conflitos interiores, um desafio para o cinema que nesse ponto perdia para a literatura onde o leitor empresta as suas emoções ao texto.
Mério Peixoto, à direita, e amigo.
Mario Peixoto ficou com a imagem de excêntrico. Vivia só em uma ilha e quem nos contou alguma coisa sobre ele foi Waldemar Henrique a quem ele havia convocado para elaborar a musica de seu próximo projeto cinematográfico. Waldemar chegou a passar dias na casa de Peixoto compondo de acordo com o argumento apresentado. Mas o diretor não conseguiu financiamento e o filme não foi realizado. Peixoto faleceu aos 82 anos, em 1992. Foi alvo do documentário “Onde a Terra Acaba” (2002), de Sergio Machado e mencionado em “Cinema Falado” (1986) de Cateano Veloso.
Em 2007, a mostra HIGH LINE FESTIVAL exibiu a versão restaurada deLimite”, no Festival de Cannes, momento em que também foram exibidos vários filmes selecionados para a World Cinema Foundation, criada por Martin Scorsese, cujo o objetvo é a preservação, restauração e exibição de produções históricas, sobretudo da África, América Latina, Ásia e Europa Central.
O programa “Cinema e Musica” apresentado mensalmente no Olympia anuncia para novembro o clássico “Nosferatu” de Murnau e para dezembro alguma surpresa. É uma iniciativa da Funbel, ACCPA e Fundação Carlos Gomes na presença de Paulo José Campos de Melo.




Um comentário:

  1. Luzia, muito bom a escolha de Limite, assim mostra a todos nós os primordios da produção cinematografica brasileira, seria bom claro se possivel alguma produção de outro pioneiro o Humberto Mauro

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