quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

SEMPRE AO SEU LADO














Em 1987, Kateto Shindô, diretor japonês responsável por obras-primas como “A Ilha Nua” e “Onibaba”, escreveu a história e elaborou o roteiro do filme “Hachiko Monogatari” dirigido pelo veterano cineasta Seijirô Kôyama. O enredo tratava de um fato real ocorrido na cidade de Shibuya sobre um cão que se postou diante de uma estação ferroviária durante 10 anos esperando o dono que falecera e não mais aparecera para receber o afago do animal, como era de habito, na relação entre os dois. Hachiko, o cão, ficou ali, saindo apenas para pegar algum alimento que lhe davam os feirantes próximos, até envelhecer e morrer. Há uma estátua para esse animal no lugar em apreço. Ao conhecer o fato, o ator Richard Gere pensou em uma nova produção, convidando o sueco Lasse Hallstrom para dirigir o remake, que recebeu, no Brasil, o título “Sempre ao Seu Lado”(Hachiko, A Dog Story/EUA,2009) com a história agora transportada para os EUA.
Gere protagoniza Parker, um professor de música que diariamente faz o trajeto de trem da pequena cidade onde mora para dar aulas numa escola superior, retornando no final do dia. O primeiro encontro dele com o pequeno cão que viera em uma remessa do Japão e se perde, dá-se na ferrovia. Não há quem se responsabilize pelo animal e Parker resolve levá-lo para casa mesmo sabendo que a esposa não tolera cachorros. É o começo de uma amizade. O professor é acompanhado diariamente por Hachiko à estação e sabe, ao chegar, em qualquer horário, que este vai estar ali, esperando-o. O encontro é rotineiro até que certo dia, durante uma aula, o mestre sofre uma hemorragia cerebral, não retornando à sua residência. Mas para o cão a vida continua e ele aguarda o dono amigo.
Em 1985, Hallstrom dirigiu “Minha Vida de Cachorro” (Mitt Liv Som Hund) sobre um menino que se afeiçoa da cadela Laika, a cobaia da viagem ao espaço numa cápsula soviética, afinal o primeiro ser vivo a viajar em órbita da Terra, um pouco antes do vôo de Gagarin. Produção sueca, o filme alcançou criticas elogiosas, recebeu alguns prêmios internacionais e boa receptividade popular. Foi o impulso para o diretor ganhar o caminho de Hollywood, onde, a partir de 1991, dirigiu cerca de 14 filmes, incluindo títulos populares como “What’s Eating Gilbert Grape”, o primeiro grande papel de Leonardo Di Caprio, e “Chocolate”.
Há certo élan no interesse do diretor e do produtor-ator por cães. E isso transfere o envolvimento àqueles espectadores que gostam desses animais e não ficam insensíveis ao drama de Hachiko. Aliás, na história do cinema há estrelas caninas célebres como Rin Tin Tim, na virada da fase muda para a falada; a Lassie, cadela que esteve alicerçando a estréia de Elizabeth Taylor (no filme “A Força do Coração”/Lassie Come Home, 1943). Esses filmes atraíram público de diversas idades e ainda hoje histórias que envolvem cães recebem aplausos de platéias como sabe a Disney (em desenhos animados ou com atores). No caso, há sempre duas formas de apelo: a aventura por conta da coragem do animal herói; e o sentimental, pousado na ligação deste com o seu dono ou dona. Geralmente as opções são colocadas de forma exagerada e “Sempre a Seu Lado” não se furta a isso. Apesar de bem conduzido linearmente, usando vários cães para o papel de Hichicko, o final, a título de exemplo, extrapola a pretensão dramática focalizando detalhes da amizade entre cão e dono na hora em que o animal está se despedindo da vida. O interessante, e que ressalta a idéia de sacar lágrimas, é que durante a narrativa, as cenas que representam a visão do cachorro são gravadas em preto e branco, respeitando o daltonismo do animal. Mas no epílogo tudo ganha cores, não sendo mais a visão canina, mas a do realizador, ávido pelas lágrimas de seus clientes, ou seja, espectadores.
Manipular emoções é sempre um agravante em cinema sério. Mais ainda quando não há necessidade disso. A história do cão fiel basta em si para comover. É preciso ver o que fizeram no original os cineastas japoneses Kaneto Shindo e Seijirô Kôyama para ter uma idéia de como foi construída a narrativa evidenciando o processo de fidelidade que une um cão ao seu dono.
Lasse Hallstrom deu sua versão desse sentimento, mas enfatizou o drama com as cores recorrentes do cinema digerível.

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