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terça-feira, 10 de agosto de 2010
A ORIGEM
Falar em cinema introspectivo leva à memória os filmes de Michelangelo Antonioni que exploram a incomunicabilidade do ser humano. Também leva a pensa em Ingmar Bergman e seus “gritos e sussurros” ou a exploração das “personas” de suas heroínas. Agora, Christopher Nolan, diretor de “Amnesia”(Memento) e “Insonia”(Insomnia), promovido pela indústria após dirigir “Batman, O Cavaleiro das Trevas”(The Dark Knight), abraça o tema com dedicação. Em “A Origem”(Inception), cartaz nacional, segue de perto o que mostrou nos dois primeiros filmes citados e estréia como roteirista solo. Em linhas gerais, o enredo trata de um tipo configurado como ladrão auxiliado por uma tecnologia avançada, que consegue penetrar nos sonhos das pessoas e, com isso, captar-lhes os segredos. Após várias missões do gênero ele se oferece para fazer o contrário: colocar uma idéia, ou memória, no subconsciente de um jovem herdeiro de um magnata que pode responder pelo destino de uma indústria de interesse múltiplo.
O grande problema do espião de sonhos é que ele guarda detalhes de sua vida pessoal que não consegue esquecer quando em trabalho. Desejoso de ver o casal de filhos, órfãos de mãe, ele quer acabar logo com a missão diferente a que se dedicou e ir ao encontro deles. Por isso, duas crianças invadem sua mente e principalmente a esposa, uma suicida.
A continuidade narrativa mostra que a mulher praticou o ato suicida devido à interferência do marido na sua mente, com isso maculando a sua auto-estima, ou personalidade. A imagem desta pessoa querida que reclama de si a responsabilidade por sua morte mescla-se aqui e ali às invasões oníricas do personagem. Tanto que esse tipo, por suposto, é a vilã da luta pela implantação da idéia na mente do herdeiro cobiçado.
Muita ação chega entre os espasmos de memória. É como se as pessoas(ou o analista) incorporassem as lembranças como peças de um vídeo-game. “Jogando” a vida como num pesadelo, muitos homens armados surgem atirando no objetivo (a pessoa analisada) e para acordar alguém é preciso de um “chute”, ou seja, um susto que interrompa o sonho. Este movimento é objetivado na violência (como quem bate em quem está dormindo para que acorde). Com um detalhe: se o tempo de despertar for retardado, quem morre no sonho pode morrer na realidade. Motivo para um suspense de filme de ação.
Não sei, sinceramente, se a idéia de Nolan é a ideal para se resolver em cinema. As seqüências de lutas são longas, barulhentas, dignas de qualquer blockbuster (daí a fácil comercialização do produto/filme). Não seria mais interessante sugerir esses confrontos ao invés de mostrá-los? Afinal, quem sonha constrói a sua realidade nesse período do sono. Mas Nolan tenta explicar com a presença de uma jovem arquiteta que se põe a “desenhar” o cenário do sonho objetivado. É como se você perdesse a privacidade até dormindo. E quem está sonhando está absorvendo uma violência alheia como o processo de roubo industrial que se verifica.
O filme não é de fácil assimilação embora não seja nenhum “Ano Passado em Mariembad”. Idas e vindas no interior da mente dos sonhadores é uma ousadia maior do que a que foi explorada em “Quero ser John Malkovich” onde a entrada de um intruso no cérebro de um ator era um ato”realista”. Aqui em “A Origem” pululam detalhes que arranham a psicologia. Há por exemplo, uma opção do “ladrão” em buscar um contratante seu antes que ele próprio possa sucumbir afogado numa cena irreal com liame real (demorando no sonho pode vir a morrer de fato). Esse espaço de tempo naturalmente não se mede de forma cronológica. Mas a arquiteta que se salva do afogamento onde vários tipos se arriscam diz, convicta, que o herói vai sobreviver.
Não é premonição, mas uma cronometragem que só ela, no caso, aposta em fazer. Como sabe se o rapaz vai acordar a tempo?
Leonardo di Caprio está muito bem e presente em quase todos os planos. A francesa que mereceu o Oscar por “Piaf”, Marianne Cotillard, é a suicida amada que resiste naturalmente na memória do marido. Mas é nesse viés a maior interrogação do filme: como ele pode esquecê-la desde que pede a ela que se afaste de seus sonhos? Seria bom se dosse possível abandonar idéias malsãs com uma simples ordem às próprias idéias. Esquecer não é tão fácil.
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