quarta-feira, 15 de maio de 2013

CAMILLE, 1915



Ernani Chaves


O filme é seco, marcado pela figura imponente e exemplar composta por Juliette Binoche. O hospício de mulheres em meio à paisagem bela e áspera do interior da França é tão protagonista quanto a desolada ex-amante de Rodin. Chamo atenção para duas cenas.
A primeira, quando “Camille” assiste ao ensaio do “Don Juan”, de Moliére, encenada por loucos do hospício. Trata-se, em princípio, de uma comédia e todos acabam rindo, inclusive Camille, da forma engraçada com que “Don Juan” tenta convencer uma mulher de que tem boas intenções para com ela. A cena é repetida várias vezes, porque aquele que representa “Don Juan” sempre erra o texto. E a cada repetição da cena, o que era engraçado para Camille começa a se parecer demais com sua trágica história de amor, como se “Don Juan” fosse uma espécie de prefiguração de Rodin e ela vê no palco a sua própria história. A passagem da expressão facial de Juliette Binoche a cada vez que a identificação de Camille com a cena se torna mais forte é dolorosamente precisa. Passagem do riso ao choro compulsivo, da comédia à tragédia, ambas facetas do humano, demasiado humano.
A segunda, se trata de um breve diálogo entre o irmão de Camille, o poeta Paul Claudel (que logo depois da visita à irmã relatada no filme, vem para o Brasil como diplomata) e um padre, pouco antes do encontro com Camille. Paul, que havia se convertido em ardoroso católico, assinala a proximidade entre a arte e a loucura. Uma proximidade que a literatura, a partir do século XIX, tematizou bastante. Como se a arte fosse o último reduto da possibilidade de retomarmos uma experiência com a loucura que fosse uma experiência com a verdade e não com uma patologia. A fé de Paul não é suficiente para que ele voltasse atrás e atendesse ao pedido de Camille e do próprio psiquiatra que tratava dela, para que ela voltasse para casa. Ele prefere abandoná-la no hospício, condenando-a, de algum modo, à morte. Camille passou seus últimos trinta anos de vida internada, em geral amarrada e sedada.
Camille Claudel morreu aos 79 anos e deixou uma série de esculturas absolutamente maravilhosas. Dentre elas, gostaria de lembrar “A idade madura”, exposta no Museu d’Orsay, em Paris, criada logo depois de sua separação de Rodin.

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