Alejandra (Tessa Ia) em uma cena de "bulling"
O cinema mexicano assume um excelente
posto na cinematografia mundial numa boa fase, bem longe dos tempos dos
melodramas calcados em letras de boleros. Acompanhei este período na época em
que o romantismo ainda era um gênero em evidência em todas as artes.
Entretanto, atribuo uma diferença nesse momento em algumas obras da dupla
Emilio Fernandez & Gabriel Figueroa. Destaco também o excelente filme “Macario”(1960), de Roberto Gavaldón (creio que no Brasil intitulou-se “Entrevista com a Morte”), marcante no efeito onírico sobre a
cultura da morte nesse país. Há outros, mas prefiro citar estes. No livro de
Silvia Oróz, “Melodrama : O cinema de lágrimas da América Latina” (FUNARTE, 1999) esta
autora tece comentários sobre o gênero.
Presentemente está sendo exibido
entre nós “Depois de Lúcia”(Despues de Lucia/México 2012) filme
que ganhou prêmio especial em Cannes e recebeu criticas entusiásticas ao redor
do mundo. É o segundo trabalho do diretor Michel Franco, e o seu impacto
promoveu-o a um dos mais rigorosos do cinema ocidental. Quando assisti pela
primeira vez senti a densidade do final e cheguei a me envolver no drama das
duas personagens numa tensão que me levou a desejar mais do que estava sendo
articulado para penalizar culpados pelas violencias sofridas por uma jovem. É
que o espectador ganha o desconforto do drama da jovem seduzida e aviltada.
O enredo do filme de Michel Franco trata
de Alejandra (Tessa Ia) e seu pai Roberto (Hernán Mendoza) que se mudam da
cidade de origem, Puerto Vallarta, para a Cidade do México, após a morte da mãe
da garota (a Lúcia do titulo). Ambos, ainda lidando com esta perda, tentam se
adaptar à nova realidade. Roberto é chef de cozinha e Alejandra uma
estudante que se matricula em uma nova escola secundária da localidade e supõe fazer
novos amigos. Orquestrado por colegas desse grupo, a jovem que vai a uma festa
da turma é vilipendiada e empurrada para uma situação de estupro. Estes filmam a
cena instigando pensar que a indefesa garota deixara-se seduzir. O vídeo é divulgado
pela internet e todo o colégio passa a conhecer o fato, sendo repassado que a
novata era uma garota “fácil”. Por isso
ganha novos assédios chegando ao buyiling de estrema crueldade.
Em “Depois de
Lucia” observa-se
não só um tratamento frio de um fato mórbido. Também se vê, no aspecto formal,
um apego a essa frieza. Deve-se observar desde a primeira sequencia, quando
Roberto recebe seu carro na oficina e depois de um percurso mais ou menos
longo, abandona-o no meio da rua. A câmera que está todo tempo no banco
traseiro do carro não se mexe. O mesmo ângulo explora a atitude do personagem
saindo do carro e resolvendo o que tem para resolver. Essa imobilidade da
câmera vai prosseguindo em muitas cenas como se a própria filmadora preferisse
estar distante do drama, talvez uma alusão ao terror que ele aborda, parecendo
sentir que é melhor ver de longe o que acontece ou como se pode delinear melhor
tipos e situações.
Há muitos enquadramentos engenhosos
durante a narrativa. E quando se vê apenas Alexandra não se tem uma menina
alegre ou uma colegial ganhando novas amizades e confiando nessa vida que passa
a assumir. É uma garota tímida e como não se detalha a sua reação diante do
ataque dos colegas fica a surpresa do final quando ela desaparece e todos
pensam que morreu afogada depois de um banho de mar com a mesma turma que a
obriga a acompanha-los e vara a madrugada na praia.
O diretor poderia terminar seu filme sem
explicações sobre o destino da jovem. Mas deixa um momento em que ela aparece,
em certa sequencia, onde está e o que faz, embora a imagem considere a frieza
de toda a narrativa. Contudo, esse não é o final. “Depois de
Lucia” encerra com uma sequencia longa e aterradora. Um impacto que não deve
ser revelado ao futuro espectador. E que desde já se insere entre os mais
contundentes do cinema moderno.
Exibição:
de 29/05 (quarta) a 01/06 (sábado) às
19h, e 02/06 (dom. às 17 h) no Cine Líbero Luxardo.
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